Diário político 213
É a economía, pá!
d'Oliveira fecit 16.11.18
No “Publico” de hoje, sexta, 16, o sempre excelente Luís Afonso no seu diário “Bartoon” compara o eventual futuro IVA das touradas (proposto para 6%) com o da electricidade (23%). E pergunta-se se neste último caso estamos perante uma questão de gosto ou de civilização?
Claro que LA sabe bem a resposta mas convirá oferecê-la para algum(a) leitor(a) desprevenido/a: a continha da luz cai em cima de todos quantos dormem debaixo de um teto mesmo se este for pobre e frágil. Logo arrecada-se assim uma receita que, aos olhos gulosos do dr. Centeno, será, no mínimo, voluptuosa. Das touradas a 6 ou a 23% pouco “escorre”. São poucas, sazonais e mesmo que as praças encham, aquilo só dá para trocos.
Este é o segredo da taxa de 6% para os produtos ditos culturais. Livros, discos espectáculos de teatro ou de música pouco rendem se é que o rendimento cobre as despesas com os custos da tributação.
Outro exemplo interessante será o dos computadores ou dos telemóveis. Aqui, sim, há “carne da perna”. Primeiro, o preço médio destas aparelhagens é sempre avultado. No caso dos telemóveis nota-se até uma tendência para escoar com maior rapidez os mais caros. Aliás há muita gente que gosta de ter mais do que um telemóvel. Só uma fiscalidade descerebrada cairia na asneira de, em nome do acesso à informação (e da comunicação instantânea), baixar um imposto que rende milhões. Os combustíveis, os automóveis e outras já correntes necessidades básicas permitem arrecadar fortes somas. Querer que sobre este tipo de artigos haja uma baixa de IVA é um desejo pueril, para não usar outro adjectivo mais contundente.
Alguém, porventura, me saltará ao caminho, apontando as propostas de baixa de impostos (na electricidade, por exemplo ou no gasóleo para a agricultura) vindas de grupos políticos que normalmente se consideram de esquerda. Mesmo aí há que reparar que se estabelecem, para eventuais beneficiários, limites de rendimentos globais bastante baixos. E fantasia-se com aparentes números muito expressivos que, depois das contas feitas, são sempre inferiores aos enunciados pelos generosos defensores do “povo”.
É o género de medidas tipo baixa de IRS para emigrantes que regressem. A coisa, em abstracto, parece maravilhosa. Na prática, ver-se-á, que serão poucos os que regressem confiados nesse privilégio. No rendimento global de um trabalhador, uma baixa da taxa de IRS, assume valores residuais, sobretudo num país em que os ordenados não são famosos. Por outro lado, alguém acredita que, súbita e patrioticamente, afluam à pátria madrasta dezenas de milhares de emigrantes já estabelecidos no país onde vivem e trabalham e onde, normalmente, tem melhores salários, melhores cuidados de saúde, melhores condições de habitação e de ensino para os filhos?
Todavia, a medida, apareceu. E porquê?, perguntará alguma azougada leitora, convencida que um Governo quando anuncia uma benesse é porque acredita que ela tem valor. Pois, simplesmente, porque assim se passa uma mensagem imediata de que se está muito “mrppemente” a “servir o povo”. Só quando a poeira assenta é que se tem a possibilidade de desmontar a maquinaria propagandística e se verifica que “depois de abertas as portas com fragor só resta silêncio e escuridão e nada mais” se é que me é permitido citar Antero de Quental que sobre a pátria sabia muito. Tanto que se suicidou sentado num banco que tinha escrita a palavra “esperança”.
(em guisa de final s ainda sobre a temível palavra – que não conceito – “civilização” – relembremos à Sr.ª Ministra que a arremessou no hemiciclo, o título do conto homónimo de Eça de Queiroz onde uma certa civilização “apanha para tabaco”. E boa leitura...)
(a alusão ao slogan “servir o povo” convirá dizer que não foi o MRPP o seu inventor. Mao Tse Tung (ou Mao Zedong, se quiserem) já enunciava o princípio que, aliás, vinha da velha civilização chinesa. A tradição m-l e a a comunista no geral usava e abusava de frases e títulos (sobretudo nos jornais) que corriam naquele fechado e pouco imaginativo universo. Assim o jornal das ”juventudes” do MRPP seguia o título de um jornal originalmente porta-voz da UJCm-l grupo que mais tarde dará origem à “Gauche Proletarienne” (1969-1973). Tal título serviu a mais de uma dúzia de organizações de vários países e continentes. Como se vê, a originalidade, campeava.)