estes dias que passam 597
De regresso a casa
(meditação na auto-estrada)
mcr, 24.10.21
Não faço parte da imensa maioria que gosta de guiar. Eu guio pelas mesmas razões por que telefono. Absoluta necessidade!
Um dos mais tresloucados sonhos que me persegue desde os meus trinta e poucos anos é o de ter um chauffeur. Chauffeur, notem bem. Motorista é bom para quem conduz autocarros e camiões de longo curso. Chauffeur, a la franciú, como dantes se usava. Jamais xófer, que pelintrice!
Chauffeur como aquele célebre romance de que apenas sei o nome, “John chauffeur russo” de um certo Max du veuzit de quem também nunca me terei aproximado e que foi um sucesso de entre as duas guerras. E até hoje pois fui de propósito à internet, onde vi que, pelos vistos, ainda se publica e vende.
E, por favor, nada de “Ambrósio” para cá Senhora (má tradução!) para lá. Um chauffeur a quem eu trataria por senhor fulano (nunca o nome próprio mas o apelido, acrescente-se para não cair na ridícula moda actual de tratar um quiddam por sr. João, sr Amílcar, sr. Bartolomeu.). Eu que sempre tive horror às doutorices, bastou-me Coimbra e a estudantada a ser tratada por futricas servis por doutor, não apregoo a minha pobre e esquecida licenciatura. Resultado: apanho, na esplanada com sr m. Ao quando ao lado uns advogados de fresca data são brindados com dr.! Ora toma lá, que é para saberes!....
Um amigo meu, juiz conselheiro do STJ, pessoa prestabilíssima nunca negava um conselho aos vizinhos, gente humilde mas grata que o procuravam. Certo dia, confidenciou-nos que havia um desses “clientes” pro bono que o irritava. O homem, farto de nos ouvir tratar o nosso amigo por Manuelzinho, quando o via, desbarretava-se e desfazia-se em cumprimentos, sr. Manuelzinho para aqui, sr. Manuelzinho para acolá... claro que a partir desse momento de fraqueza do ilustre pilar do Supremo Tribunal, um grupo de amigos galhofeiros só o referem por senhor Manuelzinho....
Voltemos, porém, ao chauffeur.
Eu tive um quando, nuns gloriosos sete anos de pastor, cuidei de uma instituição pública onde aliás me senti bem e, penso, onde deixei amigos e saudades. Era o sr Pinho. Um profissional notável, com humor, da minha idade, conhecedor de tudo o que era restaurante bom, de todas as doçarias regionais (para eu levar às minhas queridas e devotadas - e gulosas!!! – secretárias) discreto, discretíssimo, enfim uma pérola rara.
E o chauffeur com que a partir daí eu sonho é um segundo – se possível – sr. Pinho que aliás, continua a ser um amigo.
Infelizmente, os maravedis de que disponho não dão para tal estravagancia, pelo que sou o chauffeur de mim mesmo e da CG que, uma vez pilhado um marido para todo o serviço deixou praticamente de guiar. Todavia, quando viaja a meu lado, Jesus, Maria, José!. É conselhos, admoestações, avisos, remoques um horror!
Desta feita, lá fomos de longada a Lisboa visitar as respectivas mães. À uma nunca consigo partir à hora que quero pois a “patroa” tem uma noção assaz elástica das horas. Depois, entende tentar que eu veja algo que ela, sentadinha no seu canto pode ver e que, a mim, ocupado em conduzir não só não quero ver mas receio distrair-me. E acha que eu sou um péssimo companheiro de viagem. Também não me deixa pôr uma 2pen” de música porque isso lhe contende com os aparelhos que usa nos ouvidos (a CG está mais surda que um portão de quinta!), Resultado a estrada parece-me ainda mais longa e mais chata do que é costume...
De nossa casa à casa da minha Mãe são, contas feitas, 330 qilometros. Três horas se não houver chatices com duas paragens para dois café rápidos e mijinha para rebater Eu poderia evitar este plebeísmo e usar o “verter águas” tão do agrado dos camponeses de Niza, mas escrevi a coisa e já era tarde para emendar.
Outra das razões que tenho para usar o carro é que , gosto da minha independência, de não depender de outrem e de não dar cabo do juízo de outrem que, por gentileza me pretende conduzir, para me poupar canseiras e dinheiro para gasolina. E ainda por cima, enjoo! (Nunca com o sr. Pinho, anjo milagreiro das estradas e auto estradas!)
Desta vez deu-me para contar os automobilistas que, impantes e domingueiros, entendem usar a via central quando há três vias. Entre a CREL e o Porto pelas auto-estradas A 8, A 17, A 25 e –suponho- a A 29, contei 32. Nada os obrigava a ir na via central. Nada excepto a burrice, o desconhecimento do código da estrada e a empáfia!
Eu não sou um cumpridor estricto do Código mas aprendi a usar normalmente a via da direita. Ora quando nos aparece um palerma, repimpado, a 70/80 à hora pelo meio, há que dobrar de precauçãoo na ultrapassagem desta espécie tola de reis da estrada. Apetece, aliás ultrapassá-los pela nossa esquerda mas arriscamo-nos a que o palonço dê uma guinada ou que a polícia nos apanhe em flagrante. Claro que a coisa também permite dois ou três minutos de insultos dos antigos, dos de Buarcos, dos rebuscados que além da mãe metem mais familiares e hábitos infames. E isso alivia, mesmo se o cretino a quem se dirigem não os ouve. A CG aconselha uns toques irados de cláxon mas eu só me lembro disso depois que é quando ela, solícita começa “devia ter feito isto...“
Outra reflexão de auto-estrada é que me faz sempre perguntar porque é que não temos um regime de estações de serviço como em Espanha. Eu de há muito a esta parte limito as minhas incursões automobilisticas pelo estrangeiro apenas à Galiza pelo que pode ocorrer que a referencia a todo o território seja errada. De todo o modo, nas auto-estradas galegas (autovias incluídas) as estações de serviço tem apenas uma unidade a que se acede dps dois sentidos do percurso. Isso permite um serviço eventualmente mais barato, ou melhor e clara economia para quem o gere. E muito menos espaço a usar. O custo estra de um pequeno viaduto seguramente que é compensado pelo resto. Neste percurso de hoje, deparei-me com duas ou três cafetarias fechadas e outras tantas praticamente desertas. Além de uma estação totalmente desactivada, na CREL! Ora este serviço é de uma enorme utilidade para quem viaja pelo que deveria ser protegido e até melhorado. Mas quem é que suporta custos duplos com pessoal e conservação de instalações? Obviamente quem usa a estrada pois os fornecedores de combustível seguramente não são parvos nem mecenas russos.
Mas o país tem auto-estradas a mais e automóveis, para as encher e pagar, a menos!
* na vinheta: a Via appia. Ou de como as auto-estradas são bem mais antigas do que o sr. Sócrates pensava