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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 600

d'oliveira, 28.10.21

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A primeira vez

mcr, 28-10-21

 

 

Fiquem descansados os leitores (e as leitoras) mais pudicos. Não vou falar da minha biografia amorosa e sexual como eventualmente se deduziria do título do folhetim.

Aliás, mesmo se aceito que o tema poderia ter o seu quê de picante e mais ainda de confessional, ponho muitas reservas a este género de exercícios de auto-contemplação  exacerbada. Mais, acredito pouco neles tanto a fantasia se impõe à verdade nua e crua dos factos.

Isto de “primeiras vezes” não é assim tão romântico nem tão absoluto como, depois da memória estar convenientemente enevoada pela distância e pelos narizes de cera, as pessoas tendem a acreditar que “a terra tremeu”, que houve uma chuva intensa de estrelas, que um rio de prazer transbordou das suas margens.

Ora, se a coisa ocorre, quando se é adolescente, a inexperiência dos verdes anos, a pressa, a clandestinidade quase normal, retiram muito da carga ao acontecimento. Sobretudo os machos, propensos ao egoísmo e ainda não habituados ao doce exercício da paciência, costumam levar a coisa a cabo sem se preocuparem com a parceira que muitas vezes em vez de fogo de artifício, fica apenas a ver navios.

Portanto, dada a explicação passemos ao acontecimento que motiva esta “primeira vez”.

Trivialmente, trata-se tão só do chumbo do Orçamento, da quase certa dissolução da Assembleia, da convocação de eleições.

É a minha primeira experiência do género Mesmo com esta quantidade de anos em cima do canastro. Na verdade, no antigo regime, não era possível a Assembleia chumbar o Orçamento pela simples razão de que os senhores deputados só ali estavam a fazer o papel de figurantes, melhor dizendo de paus mandados. Eu nem sei se nas aulas de Constitucional tal tema era aflorado. E para quê, se o cavalheiro de santa Comba dava as duas instrucções e o resto era só um concordante acenar de cabeças? Talvez em finanças, cadeira regida Por Reixeira Ribeiro, opositor do regime mas mantido naquela escola pela sólida fama internacional que tinha e por não haver perigo de nessa cadeira se instilar o bolchevismo. Teixeira Ribeiro não frequentava essas capelas profanas e, de resto, pouco eficientes. Portanto, se nesse tempo eu não me debrucei nem, muito menos, me deparei com o chumbo do Orçamento, o mesmo aconteceu durante os quase 47 anos de Democracia. É verdade que houve um (Guterres) que se chamou do queijo Limiano por um deputado do CDS se atravessar em troca de umas benesses para Ponte do Lima mas regra geral, mesmo aos trancos e barrancos, o  OE lá ia singrando. Depois, já com este Governo, é bom lembrar, o Ministro das Finanças fazia-lhe a barbe e o cabelo com cativações e o milagre surdia.  Desta feita, não!

Pelos vistos, os partidos (à Esquerda– de quê?-) ainda sonhavam com a apresentação de um novo documento, com uma espécie de governo por duodécimos at. é ao dia de S Nunca, enfim, patacoadas e ignorância culposa da constituição.

Venham pois as eleições, mesmo estas que se adivinham idênticas ao costume, abstenção forte, escolha de deputados à molhada, acusações tremendas (algumas aliás justas).

Quem é que rompeu com quê?

A verdade tem de ser dita e repetida: a Direita para isto nem sequer foi ouvida. A discussão foi toda entre os da Geringonça que jamais teve um nome tão certo e justo. Pelos vistos, o BE (muito) e o PC (o suficiente) à falta de barricadas nas ruas, “Internacional “ a plenos pulmões, muita “Grândola” que há muito (para os seus mais desafinados e ardentes cantores) deixou de ser “morena” para ser avermelhada, e multidões de proletários de punho erguido, viris e acompanhados de ceifeiras de peitos robustos e olhos em alvo, pensaram em fazer a revolução no sossego dos gabinetes, como quem cozinha um comunicado ao país e ao mundo.

As revoluções, tirando o Sudão ou a paródica Venezuela (e, vá lá, a Nicarágua onde um casal presidencial vai prendendo ou inabilitando politicamente os seus opositores)  estão fora de moda e ficam caríssimas. E não atraem gente, nesta europa repolhuda farta de ser apontada como racista, colonizadora, egoísta, velha, sexista (!!!), avarenta e não sei quantas mais coisas. As revoluções já nem nos discos. E mesmo nesses passaram de 78 a 45 e depois a 33 rotações, para finalmente acabarem em CD ou em streaming...

Essas esquerdas desunidas que passaram anos a uivar contra a Direitona malvada que aí vinha, esqueceram-se do que já por cá anda e que esfrega as mãos de contente.

O PS, como Baçus, pastora de camelas e mulher de Ali (adivinhem o poema e o autor, vá, um esforço...) jura vingança. O discurso de Costa, no Parlamento, para lá do retórico, era uma clara declaração de guerra disfarçada em apelo que ele sabia recusado.

Os olhos, e ouvidos, da opinião pública, o PS apresenta-se como vítima de uma conspiração indigna e imerecida. Podem PC e BE vir jurar que toda a política do PS desde que a pandemia começou ia no sentido de criar as condições para a obtenção de uma maioria absoluta que despacharia estes dois parceiros menores, ruidosos sem especial apoio social para o galinheiro do teatro com a função de bater palmas caso quisessem fingir que continuavam influentes.

No discurso de Costa, houve porém um momento onde boa parte do seu argumentrio mostrou a sua irredutível fragilidade ideológica e política. Foi quando referiu os seus antecedentes familiares de Esquerda. Eu não vou cair na esparrela de o contradizer com o famoso distinguo gramsciano (origem, situação e posição de classe) que foi chão que já deu uvas. Quando oiço alguém falar da família para se justificar politicamente, lembro-me sempre de Coimbra e da Faculdade de Medicina. De facto, naqueles tempos, filho de professor dessa escola tinha sempre notas mais altas e, se possível sucederia ao papá na regência da cadeira ou pelo menos no corpo docente da faculdade. A restante rapaziada justamente ressabiada contra este escandaloso nepotismo, falava de catedráticos (ou de lentes) por via urinária.

Conviria recordar a Costa que Esquerda por esta via não existe nem tão pouco é recomendação. Costa nasceu na burguesia lisboeta, mesmo se os seus pais tivessem simpatias de esquerda. Nada o predestinava a seguir o mesmo caminho. Nem sequer, algo que recorda sempre (sabe-se lá por que razões...) que é o de, com catorze aninhos, se ter ido inscrever no PS Não sei como foi recebido, se com condescendência, divertimento ou seriamente mas com essa tenra idade e o buço a despontar não há um claro conhecimento do mundo e das coisas para alguém se precipitar num qualquer partido. Aceito que seja desse tempo a sua paixão pelo Benfica mas no confuso período do 25 A e do PREC que se lhe seguiu, deu provas de muita juventude mas não de especial discernimento.

De todo o modo, os dados estão lançados. Às urnas cidadãos. E não à urna para onde o país parece querer encaminhar-se com especial determinação.