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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 766

d'oliveira, 06.01.23

Deixem a ética em paz

mcr, 6-1-23

 

De vários lados, mas quase sempre do PS. a  chamada “ética republicana” é chamada à liça. 

Nos meus tempos, a ética era uma só e traduzia-se em meia dúzia de princípios de decência e convivência que se resumiam a tratar os outros como gostaríamos que nos  tratassem, a servir o Estado servindo todos, não privilegiando ninguém, muito menos nós próprios, familiares e amigos, a respeitar a lei  e a palavra dada. 

Agora, por dá cá aquela palha, eis que um salvador do mundo vem à boca de cena uivando pela ética republicana (que só é dos seus) em oposição a qualquer gesto ou atitude vindo de adversários políticos. 

A política era levada a cabo como uma missão temporária e o bom nome nela obtido era prémio suficiente. Claro que havia nepotismo, desvio de poder, amiguismo mas esses entorses às boas práticas eram feitos pela calada e a sua exposição pública envergonhava violentamente quem os praticava e, muitas vezes, a família, os amigos e próximos. 

Tudo isto para comentar estes tristes casos que começam a ser frequentes, demasiado frequentes e por isso mesmo vão embotando consciências e desgostando muitos, cada vez mais, da política. 

E de cada vez que um escândalo rebenta, logo, de todas as partes, um burburinho se levanta a favor e contra d criatura apanhada em contramão.  

Chovem as desculpas, multiplicam-se as acusações, mas em pouco tempo, tudo desaparece porque as novidades de um dia são engolidas pelas do dia seguinte.

Convenhamos que, mesmo se isto não começou com a famosa frase do dr. Costa (“habituem-se”) deve ser por aí que a análise deve começar. O à vontade do primeiro ministro traduzido num coloquialismo excessivo veio permitir a muitos perscrutar mais de perto a acção governamental. E, para vergonha nacional, os “casos e casinhos” começaram a surdir numa enxurrada, como águas malsãs das cheias que uma chuva mais forte produz. 

É bom sublinhar que casos e casinhos é já de si uma tolice porquanto a famosa ética “republicana” não os permite. Nem precisa de ser republicana porque não circulam por aí várias éticas a la carte mas uma só  como um só devia ser o pudor de quem se propões exercer funções em nome e para a comunidade nacional. 

Há uns anos começou a falar-se (e mal,  pelo menos semanticamente) de “justicialiização” (alguém terá querido traduzir o mal afamado “justicialismo” peronista, um fascismo falso de falsa base operária  - mas também o partido nazi se intitulava partido nacional socialista dos trabalhadores alemães...-  por algo bem diferente e usá-lo como arma de arremesso sempre que a justiça mete o nariz nos negócios (e sobretudo nas negociatas) políticos. 

Por outro lado, num país de recente e defeituosa conversão à democracia, foi-se entendendo que à classe política em funções importantes bastaria uma preparação de um par de anos nas “jotas” de onde o transito seria imediato e rápido para postos de responsabilidade. Tudo isto sem passagem pela sociedade civil, pela vida de todos os dias, pelo conhecimento nem sempre fácil da vida da maioria dos cidadãos. 

O resultado está á vista e desde há vários anos. Uma total impreparação, uma ignorância a todos os níveis, a tomada de decisões sobre o joelho com as consequências que vão sendo, mais e mais, visíveis. Na melhor das hipóteses acabada a licenciatura há quem faça um mestrado ou mas pequena especialização notoriamente académica e, pimba!, governação com a inocente criatura. 

A segunda entorse, tão grave quanto a primeira, é a ocupação do aparelho de estado pelas  clientelas partidárias. Ou por gente vinda da nebulosa simpatizante. 

Esta história da senhora que saltou da TP para uma empresa estatal com características não muito distantes é paradigmática. 

Eu não faço parte dos que pedem salários tipo pc para os gestores públicos, bem pelo contrário. Só não entendo é a atribuição de salários altíssimos numa empresa em natural má situação que cortou salários a 25% e despediu gente em barda que depois veio a tentar mobilizar. De resto, espanta-me o recurso a gestores vindos de fora sem que se lhes conheçam atributos excepcionais. 

Finalmente também não compreendo estas portas giratórias rápidas de bom lugar em melhor lugar, sem que as qualidades da criatura promovida se tenham evidenciado.

Pior, ninguém, muito menos eu, percebe, como é que as escolhas são feitas sem uma cuidados triagem dos escolhidos para evitar situações embaraçosas como as últimas que se verificaram. Não sei se isto e deve a ingenuidade culposa e burra de quem escolhe, se  a arreigado arrivismo desvergonhado de quem se candidata e aceita sem perceber os telhados de vidro, se de vidro chegam a ser, que carrega. A história da Secretária de Estado por 25 horas mais do que escandalosa é um sinal de bananização da república que envergonha o mais pintado. 

A ministra da agricultura, neste momento, já devia estar demitida pelo 1º ministro. Sem apelo nem agravo. Não só fez uma burrice mas deu origem a um escândalo medonho. E ridículo! 

No meio disto tudo, ninguém se salva. 

O Sr. Presidente da República deveria ter tido o cuidado e o bom senso de chamar o Sr, 1º Ministro para uma conversa privadíssima sem se pôr em bicos de pés como um professor que chama um aluno ao quadro. Ninguém ganha com a desautorização do Governo mas foi exactamente isso que sucedeu. Populismo puro e gratuito que nem sequer dignifica a mais alta magistratura do Estado. 

Eu não sei se estes “casos e casinhos” são conhecidos lá fora nem que comentários suscitam no caso de o serem. Todavia, envergonho-me como cidadão português como noutros tempos, mesmo lutando contra a Situação, me via em dificuldades para poder descrever o país de onde vinha. 

É por estas, e por outras, que ao ouvir a gritaria pela ética “republicana” me dá uma imensa vontade de avisar os falsos profetas dos resultados das suas cavilações. Nem vale a pena preveni-los de que conviria antes de falar, olhar para o lado, para o seu lado...