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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 788

d'oliveira, 03.04.23

Disto & daquilo

Mcr, 3-4-23

 

“Senhorio não ´profissão”, lia-se num cartaz da manifestação de Lisboa. De facto, não é exactamente uma profissão mesmo se, atendo-nos aos números conhecidos e descontando a propriedade imobiliária dos “fundos”, a grande maioria das casas que se alugam pertençam  senhorios singulares que ou as herdaram ou nelas investiram os seus dinheiros a maior parte das vezes fruto de poupanças. 

Deslegitimar estas pessoas que, de boa fé, investiram o que tinham num prédio ou num apartamento para garantir uma velhice segura e tranquila  é uma canalhada, uma mentira e um tiro no próprio pé. 

Este mercado, ora em sério risco de se reduzir fortemente, é. apesar de tudo, a salvação de dezenas ou centenas de milhares de pessoas que não acedem à propriedade urbana.

Já se divisam as consequências da fanfarronice governamental com a ameaça do arrendamento coercivo. Mais despejos, menos investimento (uma queda brutal e ainda só vamos nas primeiras semanas), menos reabilitação e a retirada de investidores estrangeiros sobretudo do mercado do arrendamento local. 

A crise habitacional, num país que tem 700.000 imóveis devoluto, tem origens antigas e deve-se a factores vários, entre os quais avulto o da desertificação de dois terços do território. Só áí estarão quase meio milhão de casas num estado ruinoso, abandonado ou simplesmente em más condições. Pertencem a proprietários que se viram forçados a “litorizar-se”pelas razões que todos conhecem. 

Junte-se-lhe as heranças indivisas, a incapacidade de custear a reabilitação do imóvel sem grandes perspectivas de benefício para o proprietário e começaremos a perceber o desenho de uma catástrofe anunciada desde há muito. A isto, e antes de mais, dever-se-á acrescentar o tremendo afluxo ao litoral de centenas de milhares de pessoas vindas justamente desse interior abandonado ou da imigração económica. 

Tentar mascarar esta realidade visível com a “invasão” de estrangeiros  que escolheram o nosso país para viver ou apenas para investir é tapar o sol com uma peneira esburacada. 

Em primeiro lugar, a compra de imóveis por estrangeiros “ricos” se é significativa pelos preços alcançados pela venda, abrange fundamentalmente apartamentos luxuosos e em zonas mais que limitadas. Serão na melhor das hipóteses 7 a 10% dos imóveis transaccionados. No capítulo do arrendamento a estrangeiros a percentagem é ainda menor e igualmente limitada a zonas específicas de poucas cidades. 

O arrendamento local foi durante muitos anos algo que se dirigiu a zonas envelhecidas mas centrais de cidades turísticas e fundamentalmente renovou centenas ou milhares de prédios que se encontravam abandonados ou quase despovoados. 

Sirva de exemplo o prédio que um jovem militante e médio dirigente do BE comprou e transformou num conjunto de onze T 1 obviamente destinados ao “AL”. A esperteza custou-lhe o lugar de vereador  e destapou a hipocrisia generalizada de muita gente que da boquinha para fora era só justiça e revolução mas que dentro da barriguinha ia criando o feto da especulação imobiliária.

(por acaso esses onze T1 estarão no mercado do arrendamento acessível para jovens ou velhinhos solitários?)

Nos últimos trinta ou quarenta anos, Portugal terá sido o país da UE que menos investiu na edificação de  habitação “social” seja a que preço for. 

Nem sequer os grandiosos e falsos anúncios de mais construção foram levados a cabo pelos sucessivos Governos que, num ímpeto de extremo carinho pelos pobrezinhos e pelas  classes médias, os anunciaram. Em termos de habitação o país está igual ao que se passou com as faraónicas promessas da ferrovia. 

Nos últimos dias, esporeado pela crítica da rua (a rua proprietária que não se manifesta mas tem voz, poder e pode ameaçar alguns, muitos interesses) pela comunicação social e pelo Presidente da República, o Governo reduziu o tom e o conteúdo das suas ameaças confiscativas a pouco mais de 10.000 habitações em Lisboa e baixou as ameaças fiscais dobre o AL. Neste último caso, nem precisava de o fazer. As Câmaras Municipais, mesmo as politicamente próximas, bateram o pé e amaçaram incumprir as toleimas governamentais. Tal como estava a situaçãoo da habitaçãoo nas grandes cidades deste país que, insiste-se, é notoriamente pobre, pouco desenvolvido, habituado à pedinchice, incapaz de se regenerar e, sobretudo de ter uma ideia clara sobre que futuro pretende.E com o mau, péssimo, hábito político de arriscar fugas para a frente(que se transformam sempre em lugares cada vez mais atrás entre os restantes parceiros europeus)

Por outro lado, mesmo com o aumento gigantesco de hotéis,  AL é uma fonte tremenda de dinheiros turísticos. Sem essas dezenas de milhares de camas o turista menos abonado, desejoso de sol e mar, deserta para outras paragens. 

Bem pode a pobre criatura que se esganiça na Habitação (onde é que a foram descobrir?) bramir contra os adversários capitalistas, egoístas e perniciosos que escondem apartamentos ou os transformam em AL numa tremenda conspiração para obrigar os jovens mal pagos a permanecer em casa dos pais. 

A tonitruante política esbarrou numa coisa chamada “confiança”. Abalroou senhorios e investidores. O mercado corre o sério risco de se rarefazer. A promessa de litigância em tribunais perfila-se, a galinha dos ovos de oiro ameaça uma greve fatal na operação poedeira do bed & breakfast que ameaça Câmaras (as famosas taxas e taxinhas altamente lucrativas), o negócios dos comes e bebes, e toda a fileira do pequeno mas frutuoso turismo.

É evidente que o problema da habitação existe. Que tem de ser enfrentado. Que há que mobilizar o imobiliário existente sobretudo o gigantesco parque de propriedades do Estado devolutas e que mereceriam um plano de recoperação rápido. Por outro lado, no que respeita ao parque privado devoluto haveria que pensar na melhor forma de mobilizar recursos para a reabilitação através de contratos programa com senhorios garantindo ajudas contra a promessa de estabelecimento de rendas acessíveis uma vez realizadas as obras. 

Eu desconfio que o Estado nem sequer sabe (e menos ainda os vociferantes adeptos do confisco) quanto curta reabilitar um apartamento. 

No caso que me toca enquanto involuntário senhorio, posso informar que transformar um apartamento subitamente vazio (por morte ou saída do inquilino) depois de longos anos de arrendamento, anda pelos 40.000 euros (chão, canalização, cozinha e casas de banho, pintura geral, electricidade e janelas posso fornecer facturas recentes!) Este exemplo refere-se a um T 2/3,  na Avenida dos Estados Unidos na zona mais alta! E costuma salientar-se que uma reabilitação deste tipo deva ser paga em ano e meio de rendas, ou  algo como 2.200€ mês. Como nunca nos atrevemos a pedir sequer 1500, veja-se como a coisa é “especulativa”!!! 

A latere, se pretendêssemos vender o apartamento tal como está, sem qualquer obra, poderíamos obter no mínimo 500.000 euros E seguramente não demoraríamos mais de dois, três, meses a negocia-lo Porém um dos três coproprietários só acredita na “pedra” pelo que continuaremos a ser donos de um negócio medíocre senão mau). 

 

Convém, todavia, sublinhar que o “falar grosso” do Governo é apenas “para indígena” ver. Como as casas que de há vários anos a esta parte foram prometidas e ainda não saíram, as que saíram, dos caboucos. A única certeza de obras estruturais em Portugal é que elas se vão atrasar, atrasar e atrasar. Os manifestantes de sábado, pelo menos aqueles que não tem casa podem esperar continuar a manifestar-se na companhia de filhos pequenos que tenham...  Ou que venham a ter...