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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

estes dias que passam 817

d'oliveira, 27.07.23

STOP! Parem com as tolices!

mcr, 26-7-23

 

 

 

Nos finais do século passado um vento de ânsia e de ganância  assolou o Porto. Subitamente começaram a surdir centros comerciais em todo o lado. De pouco intressava se a implantaçãoo era boa, se tinha possibilidades de atrair clientes. 

Também não importava se essas novas pirotecnias comerciais dispunham de lojas âncora, de estacionamento próximo  (ou próprio) A ideia era que o público portuense, a exemplo do que acontecera com o primeiro shopping (Brasília), iria irromper em todos esses novos espaços, mal pensados, mal planeados, sem lojas âncora atrativas e tornari os seus promotores e lojistas ricos de um dia para o outro.

Era apenas uma miragem tanto mais que fora da cidade abriam grandes espaços com estacionamento gratuito, fartura de lojas âncora e melhores muito melhores instalações. 

E assim começou o rápido declínio de vários “centros comerciais” que não tinham nada (ou muito pouco a oferecer e menos ainda a seduzir os passantes)

Foi assim que apareceu e, de certo modo , desapareceu o STOP

 Como shopping oStop é um desastre arquitectónico e oum desastre financeiro. Também está em mau estado no que concerne a segurança. 

Está em agonia desde há uma boa dúzia de anos. As lojas foram ficando vazias e entrar ali mais parecia que se entrava num edifício fantasma.

Até que um músico chegou, viu que podia alugar um espaço  para ensaiar a preço moderado e o exemplo frutificou. Uma boa centena de senhorios desesperados preferiu receber bem menos do que tinham pensado mas, de qualquer modo receber um aluguer. Em boa verdade esse dinheiro que entrava ia todo para a coluna dos lucros porque nunca mais ninguém se deu ao trabalho de custear a mantençao dos espaços nem de tratar das necessárias condições de habitabilidade.  

A Câmara Municipal também deixou as coisas correr mansamente. Se o prédio estava degradado, degradado continuou. Ou quase: pequenos remendos, aqui e ali, limpeza sumária, e todos muito contentes.

Por alguma razão que me escapa  as coisas começaram a tornar evidente a soma de problemas do prédio e a CMP lá foi exigindo a renovação das licenças sem grande êxito, melhor dizendo sem qualquer ªêxito. Os donos das lojas não se chegavam à frente, os inquilinos ainda menos e esta doce inércia, este torpor foi crescendo. 

Até à semana passada. Num dia, a polícia municipal chegou e terá selado mais de uma centena de lojas convertidas e estúdios. Um escândalo!

Subitamente, 500(?) músicos ficaram sem local para ensaiar, para trabalhar, para preparar digressões, gravações, sei lá que mais.

A comunicação social comoveu-se. E descobriu um vilão: A Câmara Municipal . 

E começou o habitual relambório. Que era ali, no STOP que a verdadeira Casa da Música habitava, criava, brilhava. A outra era apenas uma sala de espectáculos onde boa parte dos músicos despejados nunca tocou e, provavelmente, não tocará. 

Convenhamos que, para uma cidade que já não atinge os 250000 habitantes, 500 músicos é surpreendente. É um músico por 500 almas portuenses Ou por 2000 se considerarmos o grande Porto. 

Pelos vistos mesmo nesta quantidade, os artistas lá se vão aguentando, pagando os arrendamentos e barrando o seu pão com alguma manteiga. 

Claro que imediatamente surgiram ideias surpreendentes. Que se devia esquecer as licenças, mesmo se há uma lei expressa. Que a CMP devia tomar posse administrativa do centro comercial degradado. E, já agora, gastar uma boa dezena de milhões na reabilitação do local. 

(ao que se sabe as obras mais urgentes  andariam pelos 6 milhões. Pelos vistos a Administração já avisou que não tem sequer um centésimo dessa importância. Os condóminos acham que já perderam o suficiente com a o desastre que desde há muito  assola o prédio. Os músicos afirmam que já pagam os alugueres o que não deixa de ser verdade mesmo se um espaço idêntico noutro sítio os preços triplicassem ou quadruplicassem. 

Claro que a CMP já avisou que não quer o STOP nem oferecido. E põe algumas condições para permitir a reabertura dos espaços selados. A começar pelas licenças e pela obrigatoriedade de ter um piquete de bombeiros permanentemente. De facto há também uma história de pequenos incêndios ocorridos. 

Em alternativa a CMP aventou a hipótese de ceder as instalações abandonadas de uma escola secundaria encerrada. Com um problema: necessita de obras demoradas. E caras. 

Em abono da verdade, há que registar que os músicos despejados além das concentrações que levaram a cabo tem tido uma certa calma nos seus protestos. Alguns, bastantes, perceberam que aquela situação miraculosa não era mais do que uma absurda excepção e, de certo modo, um claro aproveitamento, mesmo se barato, de uma massa de senhorios enterrados num edifício moribundo.

Nisto tudo, conviria recorrer a algum sangue frio e não embandeirar numa certa histeria que esquece que se aqui há vilões esses não são os poderes públicos, a polícia municipal que é obrigada a aplicar a lei,  Por junto o caso remete para uma aventura de especulação imobiliária  que inçou o Porto de centros comerciais (e nem se fala do mais famoso, o “Dallas”, encerrado há muitos anos e sem solução à vista) que obviamente saturaram este ramo de negocio. Há outros locais também em clara agonia e à beira da falência. 

O habitual expediente de tentar atirar para o Estado a responsabilidade pelos problemas que órgãos culturais privados e incapazes de gerar entre o público receitas mínimas, logo, e em alta grita, o  culpam. Quando digo Estado, digo igualmente a autarquia que, ainda por cima, tem uma polícia municipal. 

Claro que o aproveitamento político logo se mostrou em toda a sua radiante espertalhice. As boas almas do costume uivaram que a cultura estava em perigo de morte, que o Stop era alvo de conspirativas tentativas imobiliárias, enfim o costume. 

Parece que tudo isto não passa de ficção mesmo se se possa conceber que mais cedo ou mais tarde um espaço deste género venha a cair na mão de um investidor inteligente que esteja disposto a aguardar pela desistência de umas dezenas de lojistas fartos de perder ou, pelo menos, de não ganhar dinheiro. 

Todavia, a realidade sempre feia é esta: o Stop é uma ruína anunciada, os preços baratos das lojas significam que ninguém está disposto a reabilitar aquilo pelo que vai gerindo o local à espera de um milagre. 

A Câmara não está disposta a apanhar com mais um elefante branco em cima. Os músicos garantem que já pagam bastante, os vizinhos juram que tudo está bem, tanto mais que aquilo animou algum escasso mas mesmo assim desejável pequeno comércio de proximidade. De resto, nos últimos dias deixou de se ouvir falar do assunto, os protestos, se os há, estão amortecidos, é provável que uma solução sempre provisória e de recurso seja encontrada. Contudo sem a tomada de soluções caras o futuro dos 500  (alegados) músicos começa a deixar de passar por ali. A menos que algum alucinado político resolva começar a prometer tudo e mais alguma coisa (que depois não cumprirá)  o Stop será exactamente o que o seu nome indica: um fim de caminho, um “alto e para o baile”. 

E a música..,