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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

homem ao mar 7

d'oliveira, 20.04.21

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Liberdade condicional 15

Ai Jesus! Vem aí o dinheiro da bola

mcr, 20 de Abril

 

Quinze clubes de futebol, com tendência para aumentar até vinte, querem criar uma supertaça europeia onde, em princípio só eles jogarão.

Uma série de criaturas que deve viver num outro mundo , esganiçou-se em protestos a que se seguiram ameaças políticas nacionais ou internacionais (União Europeia, UEFA, FIFA).

Subitamente, descobriram-se todas as virtudes do Desporto, a sã competição, a democracia, a igualdade de oportunidades, num mundo sonhado por uma vaga caricatura de Rousseau do século XXI.

Permitam que um escriba que não gosta especialmente de futebol, que ignora as subtilezas da vida clubística, seja ela do Manchester, do Juventus, do Real Madrid ou, mais modestamente do FC Porto (pelos vistos abordado, segundo o sr Pinto da Costa que, aliás, não me parece uma testemunha demasiadamente fiável), que há muito eixou de se escandalizar com as somas inacreditáveis pagas aos jogadores mais dotados (e o caso do herói nacional Cristiano Ronaldo é paradigmático...) aos treinadores (o sr. Mourinho foi corrido do Tottenham embolsando uns largos milhões por quebra do contrato) e aos agentes, diga duas palavrinhas sobe este magno problema que, pelo volume de queixas estará a ameaçar a paz mundial.

O desporto, dito rei, há muito que navega entre dezenas, centenas ou milhares de milhões de euros que, numa percentagem gigantesca acabam numa algibeira  partilhado por uma, duas dúzias de clubes.

Os rios correm para o mar mas este, no caso em apreço não comunica com os oceanos livremente mas apenas gota a gota. Até em Portugal onde, desde que me lembro há dois, três, episodicamente quatro clubes que distribuem entre si todos s troféus. De quando em quando lá aparece um cometa, melhor dizendo uma estrela cadente que ganha uma taça ou até, escândalo dos escândalos, um campeonato. Todavia, isso, essa irrelevante entrada fortuita no recreio dos grandes, é apenas, e tão só, a excepção que confirma a regra.

O dinheiro, o grande capital, os fundos, algum príncipe árabe, um par de multimilionários russos, governam esta constelação e vão, com toda a probabilidade, continuar a mandar nesse restrito território vedado aos restantes.

Parece que algumas instituições ameaçam os clubes em questão de expulsão das ligas nacionais, de não autorizar os seus jogadores, pagos a peso de ouro, de entrarem nas seleções nacionais, entre outras coisas medonhas e tremendas.

À uma, parece que tais ameaças poderão não ter claro suporte legal (cfr.  o Publico de hoje). Depois será que alguém, por exemplo do Benfica ou do Porto, se incomodará muito se não puder ver a sua equipa jogar contra o Nacional da Madeira ou o Tondela? Claro que, seguramente, aparecerão alguns leitores e leitoras sinceramente interessados na beleza do jogo, na justiça desportiva, ou até na bondade do futebol como grande educador da classe operária, para me infirmarem esta vaga convicção vinda e alguém que pela última e não chorada vez entrou num estádio de futebol em 1969, numa final de Taça entre a Académica e o Benfica. Tinha eu vinte e tal anos e fui com um cartaz escondido para me manifestar caso o Presidente Tomaz aparecesse. Claro que não apareceu, escaldado que estava com os acontecimentos de Coimbra onde fora inaugurar uma faculdade. Triste com a falha do “mira carpetes” saí descoroçoado do Jamor e voltei para Cimbra no mesmo autocarro que me trouxera. “Um dia perdido, terei pensado mesmo se a manifestação se fizera, se os benfiquistas tivessem sido simpáticos (tanto mais que tinham ganho o jogo!...) e se a polícia não se tivesse dado ao trabalho de nos espancar como em Coimbra.

 

Tudo o que é meio de comunicação social anda num reboliço, sempre andaram, com o tal “oligopólio do futebol” imaginado por um jornalista (sempre do Público) que introduziu na palavra alguma duvidosa variante de sentido. Ou melhor se há oligopólio, ou seja mercado dominado absolutamente por alguns, poucos, agentes, ele existe há décadas, foi-se lentamente construindo com a cumplicidade de muitos, a benevolência de outros tantos, e a admiração basbaque de multidões eufóricas que se podem queixar de tudo, incluindo a carestia da vida, mas jamais das somas que os seus ídolos recebem. Somas que ajudam a realizar, comprando toda a espécie de bugigangas vendidas pelos clubes a começar por camisolas horrendas, com as cores do clube e o número e o nome do ídolo do momento.

Os meios de comunicação , e nisso as televisões são exemplares, gastam rios de tinta ou horas de emissão, com comentários, discussões, mesas redondas, noticiários solenes sobre os jogos, os jogadores, os responsáveis dos clubes (uma classe que mesmo à distância cheira a esturro, a corrupção, a conspiração, a lobying político (e sobre isso até cá temos as jantaradas parlamentares de adeptos clubísticos, as recepções dos dirigentes na AR ou nas Câmaras, os convites a políticos para integrarem listas societárias, de apoio ou mesmo órgãos sociais secundários do planeta futebolístico).

Este passo dos clubes europeus, copiado aliás da estrutura desportiva americana, era previsível, lógico e, diga o sr Macron o que disser (e não dirá muito porque em França o poder dos clubes não tem semelhança com o que se passa em Espanha, Itália ou Reino Unido).

Há ainda um pormenor que , de tão grande parece ter escapado aos adeptos da “pureza” do futebol hoje praticado. Será que um clube médio, ou um grande português,  alguma vez poderá sonhar em contratar Cristiano Ronaldo ou Messi como se as leis do mercado nõ existissem, como se os jogadores de grande talento se descobrissem milagrosamente  um dom para beneméritos dos pobres, dos remediados ou dos apenas ricos?

Alguém sairá à estacada para me dizer que tudo isto é fruto do capitalismo, selvagem ou civilizado, tanto dá. Lembrarei que, em tempos idos, quer na URSS, quer nos países socialistas (ou de leste, ou satélites, é só escolher) havia o mesmo clubismo, o mesmo fanatismo e a mesma negociata. E os mesmos privilégios de jogadores, treinadores e restante máquina desportiva.

Aliás nesses países, e nomeadamente na Alemanha “democrática” havia até para o desporto olímpico meios de treino e preparação que se revelaram para além da fraude e da manipulação dos corpos. Valia tudo excepto tirar olhos e o escândalo foi imenso como, provavelmente, os mesmos puristas já terão convenientemente esquecido.  

É claro que poderão retorquir-me  que aquilo, naquelas sombrias paisagens, não era socialismo mas apenas uma corruptela vil e cruel desse modelo. Não direi que não mas, caricatura ou verdade, milhões de pessoas no mundo e até por cá, acreditaram piamente no “sol da terra” e na restante parafernália ideológica. Digamos que o capitalismo apenas torna mais profissional, mais competitivo, mais atraente, o panorama dos grandes do futebol. Só.

E, já agora, as competições actuais europeias de há muito que fazem rolar milhões (sempre, ou quase para os mesmos). Mais uma competição apenas atiçaria o mercado das apostas e a sofreguidão dos adeptos. Quanto ao acesso universal de todos ao desporto, à sua fruição como atleta ou como espectador, esse permanecerá exactamente como até agora. Com mercado onde este se mostre viável ou com algum entusiasmo nos desportos ditos pobres.

Era disso que vivia o modesto clube que eu vagamente, muito vagamente, apoiava, a Associação Naval 1º de Maio, campeã, in illo tempore, de remo. Agora nem sequer isso. O futebol, e a gentinha que gravita à sua volta, incluindo um empreiteiro ganancioso, atiraram o clube para os confins exteriores da galáxia futebolística. O incêndio da sede e o desaparecimento de um honroso espólio, acabou praticamente com o resto. Nem o retrato do meu Pai, médico do clube e presidente durante anos, escapou...   

DE todo o modo isto vai dar uns dias, talvez semanas de discussão. Preparem-se para as mesas redondas futebolísticas diárias e longas. E chatas! E grosseiras...

É fartar vilanagem!...

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