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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

Au bonhheur des dames 618

mcr, 05.09.24

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"Trabalhos do olhar"

mcr, 4.9.24

 

Os leitores repararão que o título vem entre comas, útil precaução  porque subitamente lembrei-me que alguma vez lera algo com título idêntico.  E depois de um par de minutos, veio-me o nome do livro em causa bem como o do seu autor. Trata-se de Al Berto um poeta  que descobri em 77, na finada livraria Opinião (Lisboa) local de obrigatória peregrinação onde fiz vários amigos e descobri um largo par de autores. Ora justamente nesse ano glorioso  numa tardinha dei por mim lá com o Fernando Assis Pacheco  no que era o lançamento de um livrinho "À procura do vento num jardim de Agosto" que, suponho ter sido a a segunda modesta obra do Al Berto. Com o  lançamento do livro havia também a vernissage de uma exposição de alguém que se chamaria Dodô e que titulava a mostra com o nome de  "Lápis de amor e outras fantasias"  (Oh memória absurda de repente tão solícita!...).

Recordo que o Assis me confidenciou que não perdia a apresentação de uma primeira obra fosse quem fosse o autor pois acreditava que no meio de muita juvenília poderia aparecer um autor. E foi o caso. AL Berto viveu pouco tempo mas deixou alguns livros memoráveis de grnde qualidade .

Todavia não é de literatura que venho falar mas tão só de mais uma tentativa de enganar a cegueira que espreita e que combato com injecções nos olhos (só para travar o progresso da maleita...).

Para além de ver mal sobretudo a curta distância,as minhas capacidades de leitura só são combatidas graças a uma verdadeira colecção de lupas electrónicas , cinco ao todo, para todas as ocasiões e para todo o tipo de livros.

No caso em concreto, tenho andado a colocar etiquetas nas estantes dos cds. Como de costume, e a tarefa foi para já reduzida  ao jazz, resolvi rearrumar os discos e, fundamentalmente, sinalizar claramente os autores de modo a poder ler de longe, enfim a meio metro, o nome do músico.

Claro que, e por isso falei em costume, também tive de fazer o mesmo em quatro gavetas onde jazem mais três centenas de peças, sem falar noutra estante essa de livros onde estacionam os discos que se agrupam em caixas grandes quase sempre colecções antológicas que normalmente trazem cem discos por caixa. Se essas são rfáceis de localizar, outras há onde agrupei por ordem alfabética  outros discos também arrumados por autor. enfim um trabalho  que já me permitiu descobrir discos repetidos ou um largo número de peças nunca ouvidas, por desleixo, por esquecimento ou apenas porque na altura entendi guardar a audição para melhor altura. 

Este trabalho beneditino está prestes a chegar ao fim pois num quarto e último lugar  juntei a quase totalidade das cozes femininas. E digo vozes porque à excepção de meia dúzia  de pianistas (todas de qualidade!...) a imensa maioria são cantoras de Bessie Smith a Sara Vaughan, de Billie Holiday a Dinah Washington ou de Ella Fitzgerald a Nina Simone. 

Paralelamente vou continuar uma outra tarefa que é a de meter muitos destes músicos em várias  pens  o que me permite sem mais trabalho fazer longas viagens sem nunca repetir peças ou autores. 

E se não cmecei já foi porque, agarrei num disco, Empty bed blues só para ouvir um trecho mas agora sinto que tenho de o ouvir até a fim.

E não se pode fazer duas coisas, sobretudo quando é Bessie que canta. Fica o folhetim por aqui que há mais 14 faixas para ouvir ...

 

au bonheur des dames 484

d'oliveira, 10.04.22

O inimigo 

mcr, 10-4-22

 

A Bielorrússia publicou nos últimos dias uma lista de países inimigos. A lista abrange todos os países ocidentais pelo que o honroso lugar que Portugal lá ocupa perde importância e significado: somos apenas um entre tantos.

De todo o modo o pequeno lugar que detemos nessa lista significa muito para muita gente.

É que ser considerado inimigo pela Bielorrússia é um atestado de decência, de honradez política, de democracia e de respeito pelos Direitos Humanos.

Sou uma pessoa razoavelmente afável, careço de inimigos mesmo se ao longo de uma vida já bastante longa, me recorde de ter cortado relações com quatro criaturas. Duas já foram chamadas à presença do Senhor, uma dizem-me que doente e da outra nada sei.

E não sei nada pela razão simples que nunca foi por mim posta na especial e meritória categoria de inimigo mas apenas numa outra menos vistosa: a de criatura a “desconhecer doravante”. 

Já não recordo qual o autor que punha certas espécies de humanos na categoria de “non persons”,mas suponho que terá sido Alfous Huxley no seu distópico “Brave new world”

O mesmo faço eu, aquela gentinha deixa de existir a meus olhos. São transparentes não se distinguem do ambiente geral onde se arrastam. 

Que me lembre, três desses quatro ectoplasmas nem sequer se aperceberam do momento em que deixei de os ver, de os considerar como gente. Alguém me veio dizer que as criaturas não percebiam a razão pela qual eu teria deixado de as cumprimentar. Achei qye essa incapacidade era a prova provada de que agira bem e não me incomodei sequer a replicar. No meu pobre entendimento, eles estavam para além do mínimo ético de compreensão que me serve de medida de humanidade.

Com os países pode ocorrer o mesmo. Não tem substância suficiente para que os consideremos dignos de qualquer espécie de atenção.

A Bielorrússia é um perfeito exemplo disso. Como a Transnistria, a Abkásia ou a Ossétia do sul (ou do norte, sei lá eu bem...).

São invenções que mais cedo ou mais tarde desaparecem que é o que vai acontecer àquela imensidão nos confins da Rússia, da Polónia e da Ucrânia. Governada por um títere de Moscovo perigoso apenas pelos apoios que tem, repudiado por gigantescas massas do seu próprio povo que ele encarcera, espanca, expulsa ou mata, a actual Bielorrússia é ainda menos do que foi durante o período soviético, altura em que por truque de Stalin e fraqueza dos ocidentais chegou a ter (e ainda tem!...) um lugar captivo na ONU.

Foi pelas suas terras que ima boa parte dos invasores russos entraram na Ucrânia, sem que sequer houvesse algum motivo para permitir este trânsito de tropas agressoras. Ou melhor, havia: aquilo é um satélite pessoal de Putin e só existe porque, por enquanto isso interessa ao Kremlin. 

Portanto ser  considerado inimigo desta indigência nacional  não aquece nem arrefece. Nem sequer diverte!

Desconheço se Portugal tem alguma representação diplomática nessa extravagancia geo-política mas espero que não: seria dinheiro e recursos humanos atirados para o lixo, sem préstimo nem futuro enquanto o actual de estado de coisas bielorrusso durar. Mais vale, se é que vale, ter uma representação diplomática mesmo pequena como é o caso, na metrópole dessa colónia que se finge de independente.

Aqui para nós: a Bielorrússia só aqui aparece por mera preguiça. É domingo, está algum sol mas temo o frio da beira mar. À falta de tema, isto da bielo qualquer coisa, permite-me preencher o blog e partir para tarefas menos maçadoras. 

au bonheur des dames 482

d'oliveira, 05.04.22

 

 

 

 

 

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A democracia distorcida

mcr, 5-4-22

 

Usando de todas as cautelas e caldos de galinha que o tema impõe, volto à questão  da representação dos 3º e 4º partidos mais votados para o Parlamento.

E se uso de tanta precaução é porque sei que , ao mínimo descuido ou falta de prevenção,  me saltam ao caminho os habituais filisteus, os guardiães da fé e da revolução (os pasdaram lusitanos, que os há e muitos mesmo que sem provas dadas em qualquer momento difícil)  e me tentam lapidar com acusações de cumplicidade com a negregada  “Direita”.

Um cavalheiro passou boa parte da sua vida a  apanhar com o ferrete de “comunista” ou similar e agora, ao fim de quarenta anos  aparecem os cândidos indignados do costume com novas veleidades de cruzados inquisitoriais. 

Feito o aviso, eis que descubro que para além dos dois lugares sonegados à Mesa da Assembleia da República, os partidos do bloco central entendem dividir os lugares elegíveis pela AR para o conselho de Estado entre eles. No meio disto tudo há um demónio a esconjuraar, o “chega” e uma vítima colateral, a Iniciativa Liberal que ainda por cima é o quarto da lista mais votada em eleições legislativas.

Eu, lamento muito, mas não dou para este peditório alseado. Mal ou bem umas centenas de milhares de cidadãos entenderam levar o “Chega” ao parlamento. Outros cidadãos, em menor número descalçaram o chinelo do CDS e elevaram a IL ao estatuto que ela agora tem.

Em boa verdade, estes cidadãos, tão portugueses quanto os do PS e do PSD, entenderam dever fazer chegar ao parlamento vozes diferentes e discordantes (enfim, discordantes q.b. ...) do habitual relambório que vozeia na AR. Pelos vistos, a anterior partilha que abrangia o PC e o CDS nos lugares ora em questão, acabou por falta de comparência dos interessados. O CDS foi afundado pela juventude irrequieta do Xicaãozinho e o PC pela senectude avançada e moribunda da sua velha guarda que inclui todos os presumidamente novos e novas.

Eu inda não entendi porque carga de água a IL paga as favas disto tudo, tanto mais que se há formula fundadora da Democracia representativa é o liberalismo. Dir-me-ão que o fechar portas e janelas à IL tem apenas por motivo não as abrir ao “Chega”. Fraco argumento que até pode criar alguma empatia entre os dois excluídos que se distinguem como a água do vinho.

Mas há mais: o eventual  representante do Chega na Mesa  da AR poderia, de algum modo, subverter a ordem republicana? Traria consigo algum micróbio, bactéria, vírus mortífero para a Democracia?

E porque razão a IL há de ser associada a algo que claramente nada tem a ver com ela?

Acaso, o chumbo do primeiro obriga a chumbar a segunda? Ou trata-se apenas, na melhor da hipóteses de cobardia intelectual e, na pior, de um “arranjinho” entre os do bloco central para melhor e mais facilmente desvirtuarem a democracia e a vontade popular? E os habituais críticos, que ululam à mais simples e vaga suspeita de entendimento no dito bloco, estão agora mais calados que a rataria no navio que se arrisca a naufragar?

Em França, e para não ir mais longe, houve durante dezenas de anos a ideia de criar à volta da família Le Pen um cordão sanitário. O resultado está à vista. É provável que a sr.ª Le Pen apareça de novo a defrontar não um campeão da Esquerda desaparecia em combate mas dos liberal e da Direita conservadora.

Eu não irei ao ponto de dizer que o aumento das vozes de Direita esteja directamente ligado ao desaparecimento, emudecimento, das vozes de Esquerda mesmo que se verifique, como se veirifica que é nos antigos territórios do PC que a Direita pura e dura aparece e se reforça. Na Alemanha, aliás, a AfD prospera nos antigos Länder da falecida e nunca assaz chorada DDR .

Em Itália, os netos e bisnetos de Mussolini prosperam em regiões que foram comunistas e socialistas.  Na Rússia, putinesca, a herança da soviética divide-se entre ex polícias e novos corruptos nacionalistas e fautores de guerra (com o aplauso de umas dúzias de angélicos lusitanos, órfãos de mão forte e ideias importadas).

As mesmas criaturas que acham que a BBC é idêntica ao Russia today, que agressor criminoso de guerra e agredido que se defende, se medem pela mesma bitola, unem-se no mesmo piedoso silêncio perante esta nova versão da divisão do poder dito democrático.

No caso em apreço a questão nem sequer é de poder. A Mesa da AR ou o Conselho de Estado por muito engraçados que possam parecer,são meras flores de pôr na lapela, nada mais. E, se minoritárias, ainda menos!

Será que voltámos a jogar ao jogo dos quatro cantinhos,   desta feita  só dois?

E quando for só de um?

au bonheur des dames 467

d'oliveira, 12.02.22

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Coitado do Trump , Não o deixam brincar

Ou “flutuat nec mergitur”

mcr, 12-92-22

 

Os jornais e as televisões anunciaram em parangonas enormes que Trump destruía documentos na casa de banho.

Daí passaram a acusações mais graves, desde conspiração a atentado contra a segurança do Estado.  Um horror!

Ora, apesar de escatológica, há uma explicação fácil, plausível de orig4em quase garantida (mas não a revelarei por questões que se prendem com a protecção das fontes informativas) que sirvo aos meus escassos mas leais leitores.

Toda a gente sabe  que o nosso saudoso Donald (não confundir com o pato!) detestava  o protocolo, a severidade, o conservadorismo bon chic bon genre da Casa Branca. Por isso escapulia-se para um tal mar a logo (ou coisa parecida) sempre que havia um fim de semana. Aí, comia, bebia, jogava golfe, ao berlinde, aos quatro cantinhos, enfim, vivia e divertia-se.

Na Casa Branca, obrigado a usar uma horrenda gravata vermelha, comprida e mal amanhada, tinha desseguir protocolos rígidos. Só tinha alguns momentos de escape quando se refugiava na casa de banho. Aí, com a ajuda de uns papéis surripiados na secretaria da sala oval, jogava sozinho à batalha naval, construindo barquinhos  de papel e aviões do mesmo material.

Os primeiros eram postos a flutuar na sanita e os segundos eram atirados contra eles como os antigos kamikaze. Se o avião acertava no alvo este afundava-se e Trump marcava um ponto. Se não, nova tentativa.

Quando faltavam aviões, lá tinha de os retirar do elemento líquido, que não era propriamente o velho “mar cor de vinho” mas apenas uma pálida imitação do famoso Mar Amarelo, o tal que banha as costas do grande rival oriental (ou ocidental consoante o ângulo de observação).

Daí, juntamente com a mania de pentear –se com as mãos, aquele tom extraordinário da sua cabeleira.

Portanto, caros/as leitores/as,  não há nesta actividade eminentemente lúdica sinal algum de tentativa de prejudicar os EUA, de esconder segredos de Estado, de destruir provas seja do que seja. Apenas o jogo possível e solitário de alguém que, fechado em Washington não podia ir jogar golf. 

au bonheur des dames 415

d'oliveira, 30.12.20

Vacinas, 2

mcr, 30 de Dezembro

Ontem, referia eu uma notícia sobre a ideia, aberrante do ponto de vista democrático, de vacinar no grupo mais prioritário, algumas (ou todas) das principais autoridades políticas.

Aquilo, de tão bizarro que era, pareceu-me uma fake new encomendada por alguém que pretendia vestir-se com a capa da humildade republicana recusando qualquer privilégio na ordem de vacinação.

Afinal, a minha suposição estavaerrada. A srª Directora Geral de Saúde, veio, com  candura que a caracteriza, afirmar que essa ideia peregrina fora um conselho da DGS que “os políticos aceitariam ou não” (sic)

. Não e a primeira vez que a dr.ª Graça Freitas entende meter-se nos embaraçosos caminhos da política. Ainda estarão lembrados das considerações que ela teceu sobre a falta de patriotismo de alguns maldosos críticos. Na altura ouviram-se fortes críticas que, pelos vistos, caíram em saco roto.

Depois de uma salutar quinzena por via do covid, a mimosa senhora reapareceu, angelical e radiosa e ontem, no noticiário da noite lá estava, a reivindicar a maternidade da notícia que eu considerara uma inventona.

A sr. ª Directora Geral veio tentar o amparo da sua proposta com o exemplo de alguns países. Eu, já ontem, referira alguns casos em que dirigentes de um reduzido grupo de países (Israel ou EUA) se tinham feito vacinar para fortalecer internamente as correntes pró-vacina demasiado expostas à alucinada negação de grupos extremistas.

Se a dr.ª Graça tivesse parado para pensar e informar-se veria que, na Europa, não é esse o princípio geral. Eu bem sei que Portugal é diferente mas mesmo assim. Veja-se a rainha Isabel que dentro dos parâmetros definidos no Reino Unido estaria incluída não por ser monarca mas apenas por ter uns resistentes noventa e muitos anos; ou  outros dirigentes (Merkel, por exemplo) esperam a sua vez estoicamente. Que a questão nem sequer se põe como importante na maioria da União Europeia (com a excepção da Grécia por motivos que desconheço e que espero não sejam devidos ao privilégio e mais algum Estado que neste momento não posso identificar).

Claro que isto era apenas "uma sugestão", como afirma a senhora. O meu problema não é apenas pensar que uma sugestão deste teor peca por tola mas sobretudo por temer que alguma vez venha a ser governado por uma cabecinha pensadora deste tipo!... Felizmente já estou demasiadamente adiantado em idade para poder esperar morrer descansadamente antes de um cataclismo destes afundar de vez a nau lusitana.

Eu nada sei do percurso profissional da srª dr.ª Graça Freitas, nem isso é de especial interesse para o caso em apreço. Acontece a muita gente esta desagradável situação de atingir uma espécie de point de non retour. É o chamado principio de Peter: num sistema hierárquico todo o funcionário tende a ser promovido até ao seu patamar da incompetência!

2 O sr. Presidente da República fez algumas revelações sobre o seu envolvimento ou não com o actual Governo. Não são novidades que permitam aquilatar das hipóteses de S.ª Ex.ª-ª renovar o mandato e pouco adiantariam não fora dar-se o caso de ele afirmar que teria divergido do Governo no que toca à prioridade que mais idosos deveriam ter tido no acesso à primeira fase das vacinas. Presumo que o sr. Presidente se inclinaria para o que regra geral (mas não absoluta) se passa com a maioria dos países europeus: aviar quanto antes os velhos venham de onde vierem, de lares ou da sua casa, por se considerar que com mais ou menos doença, são uma população mais frágil que está a ser duramente dizimada por todo esse vasto mundo.

Deverá ser por isso que, como primeira reacção ao resultado, dito preliminar, da comissão do sr. Ramos, ele ter afirmado que aquilo “era uma tontice”. Claro que era, e isso só foi parcialmente emendado, transferindo todos os maiores de 65 anos para o 2º grupo, excepção feita dos internados em “lares” .

Tenho uma série de familiares (pelo menos sete entre os mais chegados, mãe e tios) que ou já andam nos noventa, anos ou chegarão lá este ano que entra. A ver vamos se são vacinados antes de morrer pois todos, com mais achaque menos achaque, vão vivendo com alguma qualidade de vida.

E finalmente, uma boa notícia: o Reino Unido já aprovou a terceira vacina, a da universidade de Oxford e da farmacêutica Astra Zeneka. Mesmo sabendo que a UE tem o seu organismo próprio para o efeito, é de esperar que até fins de Janeiro, meados de Fevereiro o mesmo se passe na “nossa” Europa.

Nunca é demais ter uma farta panóplia de medicamentos à nossa disposição.

 

Não sei se os que aí estão desse lado metafórico do ecrã já deram conta que estão a ser publicadas as obras completas do António Ramos Rosa. Já estão no mercado dois volumes. Este excelente poeta (e crítico) escreveu que se desunhou. Era impossível seguir-lhe a pista com segurança. Quando ganhou o “Pessoa” escrevi algures que não encontrava em nenhuma livraria mais do que meia dúzia de títulos seus quando, na altura já tinha quarenta livros publicados. Aliás, nem eu, leitor atento e, na época, peregrino insaciável por livrarias e afins, conseguira mais de trinta e poucos. Perdi a conta aos livros que publicou e isso mesmo lhe disse, na única vez em que o encontrei e pude conversar um par de horas com ele. Era um poeta de corpo inteiro, um homem de coragem (estivera no MUD Juvenil), um conhecedor atento da poesia contemporânea e um péssimo gestor da sua imagem e da sua obra. Agora, finalmente será possível ler ARR com calma e tempo (muito tempo, é verdade, mas tempo de prazer, apropriado ao ano que vai começar com a sua luz pequenina de esperança). Até o Círculo de Leitores o promove. Pelo preço de meia noitada de fim de ano, enriquecem a vossa biblioteca e aquecem a alma.

au bonheur des dames 413

d'oliveira, 27.12.20

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Arre que faz frio ...

mcr, 27 de Dezembro, 2020-12-21

 

 

O doutor José Joaquim Teixeira Ribeiro, catedrático de Finanças em Coimbra era um dos poucos mestres que lá fora se conheciam. Além disso, que não era pouco, era um professor democrata, um dos da “oposicrática” tradicional coimbrã, ligado aos velhos círculos remanescentes do antigo Partido Socialista Português.

Os alunos achavam-no ligeiramente caturra mas respeitavam-lhe a sabedoria e perdoavam-lhe a exigência feroz com que ele defendia certos termos das suas lições. De resto, a “sebenta” era da sua autoria e, de certo modo, um modelo de clareza.

Quando começavam as aulas, o velho senhor perorava uns instantes para dar as boas vindas aos novos alunos. Já não me lembro dos termos exactos (eu, aconselhado pelo Pedro Mendes de Abreu, amigo quase irmão, oferecia ao ajudante do bedel duas garrafas de whisky por ano. Uma logo no começo do ano lectivo e outra lá para a primavera. Com isso garantia uma persistente miopia do funcionário que nunca dava conta da minha falta.) poe rarear ao máximo as minhas aparições nos sinistros Gerais.

De todo o modo aquilo começava por um olhar melancólico pela janela, uma observação sobre o Outono e o fim da abundancia, do sol e do calor mas terminava sempre por afirmar que “no coração do velho mestre” irrompia aa destempo a primavera com a chegada dos novos alunos.

 

Ora hoje, quando me levantei pelas oito da matina, verifiquei que o telemóvel marcava 3 graus! Três miseráveis graus, santíssima mãe! Arrium porrium catanorum cumque! Esta frialdade invernosa, recorda os dias frios de Coimbra que em frios invernais e calores tropicais no Verão não pedia meças a ninguém.

Entretanto, depois de me ter aventurado cem metros para beber a primeira bica e comprar o jornal (nenhum dia decente começa sem essa amável antiquíssima rotina), li o correio e dei-me de caras com uma leitor anónimo que dizia ser leitor constante e que eu teria uma imensa erudição (sic). Despi logo metade da roupa pois o calor irradiou do coração para o cérebro daí para outras vísceras menores e aqueceu o pobre e velho corpinho que ostento. Devo, em meu abono, dizer que me tocou mais a constância do leitor do que o elogio gentil mas demasiado à erudição.

O que o leitor amabilíssimo não sabe é que eu sou do tempo dos afonsinos. Em bom rigor, já deveria ter deixado estas paragens terrenais que quando nasci nada me prometia mais do que sessenta, sessenta e poucos. Mesmo a geração seguinte não atingia estes 79 feitos e perfeitos (é um modo de dizer!...) ou melhor esta dificultosa navegação já pelos oitentinhas.

Tudo para esclarecer o amável que isto, esta revoada de conhecimentos, não demasiado firmes mas atrevidos, é fruto do tempo em que fui lendo, ouvindo (e eu ouvi tudo o que podia, isso sim uma virtude) . Ainda por cima, o futebol não era a minha praia (se bem que só na praia o joguei, mal e porcamente, valendo-me dos encontrões mais do que das fintas). Recordo, a esse propósito que nos jogos diários, eram os dois irmãos Xico e Luís Neves, os amigos mais velhos que escolhiam as equipas. Eu fazia sempre parte da equipa do Luís, que escolhia em 2º lugar e era sempre, ou quase, o último a ser recrutado. E só era porque naquele grupo de miúdos todos jogavam!

De modo que o meu refúgio era a leitura. Ainda por cima sou mais curioso do que um gato. Neste capítulo só não tenho apetência pelo mexerico. Nada, raspas de nada. Não sou fuxiqueiro e se alguma escândalo me chega logo o esqueço. Entra a cem e sai a duzentos...

Com os anos, a leitura já era mais um vício do que necessidade de saber. Ainda me lembro, e já aqui o contei, que durante uma longa doença consumi todo o material impresso da casa de meus avós, incluindo-se no lote umas centenas de livros de amor de colecções populares que se chamavam pérola, madrepérolas e tolices do mesmo. Foi aí que encontrei a srª dª Trini de Figueroa e a grande sacerdotisa do livro de amor Corín Tellado. Mas já antes tinha conhecido o inolvidável “John, chauffeur russo” do celebérrimo Max du Veuzit.

Quando, comecei o primeiro namoro a sério com uma belíssima rapariga que me tornou alvo de inveja e de estupefacção “como é que aquele caramelo maljeitoso engatou aquela miúda?”, passei horas à espera dela que, é azar meu que perdura, pois, depois do almoço chegava sempre com uma boa meia hora académica de atraso. Para essa eventualidade descobri que a colecção “Que sais-je?” (que felizmente, ainda mexe) era ideal. Livros formato bolso, 150 páginas em média, textos claros, precisos, bem ordenados, uma bibliografia excelente para quem quisesse explorar mais a fundo aquele assunto e um preço razoável. Naquele tempo andavam pelos 15 escudos, talvez menos. Nem imaginam o que aprendi. Aliás, quando oiço falar de alguma coisa de que nada sei, o primeiro passo a dar é ir ver se há algum “qsj” dobre o tema. Normalmente há e isso é uma ajuda extraordinária.

O segundo truque passa pelas revistas. Hoje há poucas revistas generalistas mas decentemente culturais. Naquele tempo produziam-se às carradas. Para não ir mais longe, no meu tempo de faculdade, nunca perdi um número da “Seara Nova”, da “Vértice” e, depois, de “O Tempo e o Modo”.

Isto para não referiras publicações que vinham de França desde “Le Monde”que tinha uma selecção semanal magnífica, à “Europe” que ainda se editava há poucos anos. Foi o Joaquim Namorado, grande e saudoso amigo, quem me orientou para as revistas, afirmando que para se saber qualquer coisa e estar ao corrente das novidades, artísticas, políticas, literárias ou científicas, nada melhor que as revistas. Com o tempo chegaram-me as espanholas as italianas e uma que outra anglo-saxónica desde que tratasse de poesia.

E, obviamente os jornais. Eu não passo sem o Público, o LE Monde, o El País, o La Reppublica. Mesmo que, em muitos casos, só leia uma ou duas edições, mormente de fim de semana. E só há muito pouco tempo, suspendi a compra de uma boa dúzia de revistas de história.... agora só compro um que outro número que me chame irremediavelmente a atenção.

Portanto, leitor amigo, esta alegada erudição é fruto de uma série de circunstâncias acidentais, da curiosidade e, vamos lá de uma memória que vai começando a dar sinais de si.

Finalmente, escrever mesmo que seja apenas o folhetim quase diário no blog obriga-me a pensar algumas coisas, a relacioná-las e a tentar transmitir o que penso se possível com clareza, algum humor (quando cabe) e a tentar conversar com os desconhecidos desse lado do ecrã.

E, claro, mesmo neste dia frio (e os velhos sentem o frio com uma acutilância tremenda!...) as suas palavras amáveis aqueceram-me mais do que pode pensar.

na vinheta: estante das explorações portuguesas. Como curiosidade, do lado esquerdo, no alto, a escuro, está todo o José de Almada, operoso investigador da documentação diplomatica portuguesa em Africa e abaixo, em tom claro, todo o extraorfinário Henrique de Carvalho, autor da "Expedição Portuguesa ao Muatiânvua", oito belíssimos volumes excelentemente ilustrados e sem dúvida um dos melhores livroa mundiais sobre exploraçoes africanas. Saloente-se que a obra de Almada está completa com dois gordos dossiers de mapas (a vermelho à esquerda dos outros volumes) que descobi num loja de velharias e comprei por 20 euros! 

au bonheur des dames 412

d'oliveira, 26.12.20

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“stille Nacht, heilige Nacht”

Variações natalícias

mcr, 26 de Dezembro

 

São as crianças que salvam o Natal. Sem elas a coisa, decorre com alguma melancolia que à mesa faltam cada vez mais dos nossos. Por muito que se queira, ao olhar em volta surge, repentinamente, um fantasma familiar, a recordação de outros natais com ele e os risos já só são ternos e vagos sorrisos que a saudade aperta e o futuro, sempre ele!, ameaça. Há de chegar o dia em que os faltosos somos nós e, eventualmente, alguém verá ao fundo da mesa, uma fugidia passagem, nós reclamando pão verdadeiro para o queijo da Serra e um vinho tinto decente para acompanhar.

Há um restaurantinho francês com comida francesa, sem turistas que se notem, mesas corridas, menu escrito a giz num quadro. Eu cheguei lá graças a um dos primeiros guias do routard. E cheguei porque falavam em serviço decente, barato e genuíno. A rua da Cerisaire na esquina da rue du Musc (que em tempos foi, oh maldita correcção política e moral, rue Pute et Muse) tem esses restaurante. Quando lá levei a CG pela primeira vez ficamos sentados em frente a um operário da construção civil. Na altura do queijo já parecíamos conhecidos antigos que o homem era simpático e parisiense de todos os costados. Veio o queijo e eu pedi mais pão dizendo ao franciú “O queijo quer pão”. E ele, placidamente acrescentou e vinho. Vinho tinto de preferência!” E fomo-nos ao queijinho como Santiago aos sarracenos.

Mas eu estava a discorrer sovre o natal. Graças ao Nuno Maria, que estava excitadíssimo com s prendas e que era o moço de entrega das que não se lhe destinavam, o natal fluiu.

Éramos meia dúzia de adultos, um dos quais saído de um covid modesto, chato, mas sem complicações.

E subitamente, vieram-.me à memória as palavras do maus famoso hino de natal vindo da Alemanha profunda e da pobreza de uma igreja cujo órgão se estragara.

Foi no meu 6º ano do liceu, em Coimbra, no “D João III” que aprendi a letra da canção. Ainda hoje a sei toda mas não me atrevo sequer a cantar as duas primeiras palavras. Sou um desafinante crónico, irredutível condenado ao silêncio quanto mais não seja por vergonha. Torno-me útil por saber as palavras todas mas ai de mim se tento gargantear seja o que for.

E já que me lembro do liceu D João III, ainda hoje me arrepia a imbecilidade de quem o rebaptizou com o nome praticamente esquecido de um deputado republicano que ninguém lembra nem associa a qualquer coisa de grandioso. O rei D João III fez por Coimbra mais que quase todos os outros. Engrandeceu a Universidade, mandou construir os colégios maiores da Rª da Sofia, trouxe professores estrangeiros alguns dos quais, aliás, foram alvo da inquisição. A cidade, sob o impulso régio cresceu e daí o nome do liceu. Depois, na confusão atribulada do 25 de Abril, um punhado de ignorantes mudou o nome pensando que com isso exaltava a democracia.

Isto é como o nome das ruas, mesmo o mais modesto. Assim a rua do único grande santo português foi no Porto substituída por 31 de Janeiro (e por duas vezes!). O 31 de Janeiro não é exactamente um momento glorioso como alguns dos seus intervenientes (por todos João Chagas) fizeram notar. Aquilo foi a soma da impreparação, do aventureirismo e do atirar para a frente os do costume que foram os que caíram sob as balas da Guarda entrincheirada no alto da rua.

Que alguém, possuído por um republicanismo incandescente quisesse perpetuar o nome da revolta, percebe-se, respeita-se. E havia sempre ruas para o fazer. Mas, que diabo, o Santo António é o nosso mais universal santo, o único que emparelha com o Apóstolo e o Baptista, na mitologia e louvação populares. É bem verdade que o Porto é todo sãojoanino mas o doutor da Igreja e o mais rápido santo canonizado mão deveria ser assim apeado de uma rua com uma longa, longuíssima história. Bem dizem os de Pádua que o Santo é deles.

O natal já foi, o Ano Novo vai ser comfinadíssimo. A ver vamos se não nos arrependemos de tra dado uma folga nestes dias. Fazer coincidir uma eventual terceira vaga com a chegada das vacinas seria um fiasco.

De todo o modo, e mesmo que volte a estas páginas, desde já vos desejo um Bom Ano de 2021. E nenhuma sequela do Natal que festejaram.

 

au bonheur des dames 410

d'oliveira, 06.09.19

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Sólido, líquido e gasoso

mcr 6/9/19

 

A dr.ª Catarina Martins é, ao que sei, licenciada em Letras e Línguas Modernas e terá sido actriz. Actualmente, aliás desde há vários, bastantes, anos, é política a tempo inteiro o que, provavelmente não lhe dará tempo para grandes e diferentes estudos especialmente os que dizem respeito à Pluviosidade nacional e ao regime meteorológico português mormente no “interior” do país.

Parece que, numa discussão sobre barragens, a líder do BE terá afirmado que nas barragens se perde muita água por evaporação. Até aqui nada de novo. No Verão qualquer superfície líquida perde água por evaporação.

Todavia, esta perda de água motivaria uma ojeriza às barragens e represas que na óptica de Martins seriam mais ou menos inúteis. Ou não justificariam os gastos na sua edificação e manutenção. Numa palavra haveria “barragens a mais”

Convenhamos que a tese é ousada mas não passa disso. Pessoalmente conhecendo-se o regime de chuvas neste país talvez valesse a pena ter ainda mais barragens que conseguissem reter mais água das chuvas abundantes no Inverno para a falta dela durante a longa estiagem.

Evaporar-se-ia mais água? É evidente. Mas haveria mais água para a agricultura, para beber, para combater os fogos.

Suponha-se que não há barragens. Qual o benefício que daí decorreria? Nenhum! A água das chuvas e dos rios correria mais livre para o mar sempre perto e perder-se-ia sem vantagem alguma para quem quer que fosse.

Eu sei, ou julgo saber, que a dr.ª Catarina Martins é do Porto, cidade que tem uma frente de mar e outra de rio que, durante séculos registou cheias catastróficas nas zonas da Ribeira e de Miragaia. Perderam-se bens inumeráveis, morreu gente e ainda são isíveis em certos locais ribeirinhos as marcas das cheias mais violentas.

Contudo, as barragens no Douro e afluentes e outro género de represamento permitiram regularizar o curso do rio, evitar quase todas as cheias e sobretudo as catástrofes a elas anunciadas para já não falar na melhor navegabilidade do Douro. E a água que a região bebe vem obviamente de captações no sistema fluvial. O mesmo sucedeu noutros rios, Mondego incluído. E há notícias de projectos para a bacia hidrográfica do Tejo. Nem se fala nos ganhos enormes registados com o Alqueva e nos ainda futuros na mesma zona.

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(ia este texto neste ponto quando, li na edição do “Público de hoje, quinta feira uma excelente coluna de reparos judiciosos às declarações tonitruantes da dr.ª Martins. Em substância dizem o que acima fui escrevendo e acrescentam dois pontos fundamentais. A água que se evapora num determinado ponto há de gerar nuvens que se desfarão em chuva noutro. O que chove em Portugal provem, ou pode provir, de evaporação de massas de água em Espanha, na Suíça ou noutro sítio qualquer. O que evapora voltará ao estado líquido sob a forma de chuva ou sólido sob a de neve que na Primavera há de transformar-se em regatos, ribeiras e rios. A água do mar também se evapora e, perdendo o sal, nessa operação também se precipitará em algum local do planeta. O texto aliás indica a exacta percentagem de evaporação por metro cúbico de água.

O nosso país tem uma orografia difícil. O Norte é montanhoso mas rico em chuvas. Estas se bem aproveitadas poderiam formar grandes reservas de água não apenas para criação de barragens hidroeléctricas mas mesmo de reservas de água que poderiam ser canalizadas para o centro sul e para o sul onde a falta de água é habitual. Há, aliás, projectos para isso embora o investimento inicial tenha até à data assustado os nossos decisores que nunca pensam no longo prazo. Países mais secos e desfavorecidos que o nosso já mostraram que isso pode (e deve) ser feito e os resultados estão à vista.

Todavia, pelos vistos, a dr.ª Martins com a candura do desconhecimento destas realidades entende o contrário. Vistas curtas e vagamente literárias sobre o país que habita e que é bem maior do que o Porto ou, actualmente, Lisboa, lugares onde, com água canalizada, este problema não se põe. Para já!  

 

 

 

 

Au bonheur des dames 486

d'oliveira, 04.06.19

erico_verissimo_todos_nos_somos_um_misterio_para_o

Ah, se isto fosse um romance policial...

mcr 4.06.19

 

Mas não é. É apenas Portugal, minhoto, bisonho e metido nas negociatas. Vejo no jornal (eu faço parte da minoria que lê e compra jornais. Vários e de papel. Para ver se não desaparecem de vez!) que o senhor Joaquim Couto já não fica em prisão preventiva como se anunciava e, com toda a probabilidade, se previa.

E não vai porquê?

Não vai porque o o juiz entendeu que ao renunciar a todos os cargos públicos e partidários a prisão não se justificava. De todo o modo o acusado terá de pagar uma caução de quarenta mil euros o que sempre é um dinheirinho respeitável.

A renúncia fora anunciada domingo e, à cautela, os documentos comprovativos foram entregues ao Tribunal mesmo que isso não fosse exigido. Na altura, um dos advogados do ex-autarca veio dizer que “a renúncia não significava uma confissão” mas apenas se destinava a salvaguardar o prestígio da Câmara e do Partido Socialista fortemente beliscado pelo que consta da acusação.

Na altura ninguém percebeu tão pronta e (para uma minoria) louvável actuação. Agora percebe-se. O sr. Couto não bate com os costados na cadeia o que seria, mais do que um desconforto, um aborrecimento em véspera de férias de Verão.

Criaturas perversas e de má índole tentaram já afirmar que isto cheira a negociata. Duvido, não tanto ao nível das intenções do demissionário mas antes da análise do Tribunal e do Juiz de Instrução. Este acautela-se com a caução e com as restantes medidas já tomadas ao mesmo tempo que aceita parte das explicações da defesa (custos de uma viajem pela Austrália no seguimento de uma ida oficial a Timor. O que é que Santo Tirso tem a ver com Timor é outro mistério digno de Agatha Christie mas já se viram coincidências mais surpreendentes.

Aliás, neste imbroglio nortenho tudo sucede. O director do IPO pediu a reforma. Também escapa às grades. Mais notícias deste folhetim só para semana.

 

O 2º mistério desta trilogia é a resposta do sr Carlos César ao sr Marques Mendes. Este deixou no ar a ideia de que o primeiro gostaria de ser Presidente da Assembleia da República mesmo que isso fosse ofensivo para Ferro Rodrigues. Eu pessoalmente só acho extraordinário o facto de César ter chegado onde chegou e de uma forte maioria de cidadãos açorianos o ter eleito várias vezes para Presidente da Região. Desde a sua primeira aparição fiquei esclarecido quanto às suas capacidades oratórias (exíguas) e à sua argumentação política (medíocre).

Entretanto o sr César mesmo chamando “comerciante político” ao sr Mendes não exclui a sua candidatura. Apenas diz que o futuro só ao futuro pertence. Está-se mesmo a ver que se está a pôr a jeito para o que der e vier. Por pouco que se aprecie a actual estrutura do Parlamento convenhamos que César na presidência dele não ajuda em nada o prestígio daquela assembleia onde deputados eleitos à molhada e na generalidade desconhecidos dos desgraçados eleitores sentam o dito cujo ou levantam-no à ordem dos respectivos cabos eleitorais. Volta Júlio Dinis e traz contigo o Joãozinho das perdizes. Por onde andas, Eça e as tuas magníficas descrições das sessões parlamentares?

O Sr. Presidente da República, travestido de 2professor Marcelo, comentador político, entendeu anunciar uma “crise da Direita”. O principal visado, dr. Rui Rio não o nega mas prefere o termo “crise do regime”. O dr. Centeno acha que não e dispara uma resposta ao lado que não aquenta nem arrefenta. (o dr Centeno é mais para números do que para análise política e gosta de baralhar o jogo. É contra a austeridade em abstacto e usa-a – e de que maneira!- na prática).

Este modesto folhetinista acha que a crise vem de longe e que, sem reformas drásticas, as coisas não melhorarão. A começar por uma que belisca todos os poderes instalados: acabar com as listas de deputados ao magote e tornar fácil e claro para cada eleitor saber em quem realmente vota. É assim que se faz nos países civilizados e até à data a coisa não tem corrido mal. E os deputados preguiçosos ou subservientes não duram muito.

Será que algum dos leitores conhece já não digo todos os candidatos mas apenas metade dos que se propõem no seu círculo? O lisboeta conhecerá ao menos dez dos candidatos? O do Porto oito, os de Coimbra Braga, Aveiro ou Setúbal, seis? Já nem falo dos substitutos e nem sequer refiro o facto de alguns dos felizes eleitos deslizarem mansamente para outros cargos.

E, muito menos, falo da possibilidade de escolha dos deputados de um partido mas de todos os eventualmente elegíveis no círculo (e já excluo os dos pequenos partidos, por vezes bem mais visíveis do que terceiras e quartas figuras dos partidos tradicionalmente assentados no hemiciclo.

De todo o modo, que é que deu ao Sr. Presidente? É que para falar da Direita que, sem dúvida, conhece e que muito frequentou, poderia, já agora, estender a sua lição ao que se passa na Esquerda, quanto mais não seja ao Partidão que anda na mó de baixo roído pelo BE e pelo envelhecimento natural da sua base eleitoral.

É que assim, só dando pela Direita, poderá parecer, Deus nos livre, Santa Bárbara nos acuda, que S.ª Ex.ª se está a posicionar para a corrida a um novo mandato. Credo!, Jesus, Maria José, va de retro Satanás...

 

* A gravura: ao procurar uma ilustração para mistério deparei-me com Erico Veríssimo, escritor notabilíssimo, um dos grandes, muito grandes, do Brasil.

Leitor(a)  ler "O Tempo e o Vento", uma trilogia extraordinária situada no Sul do Brasil é uma obrigação. E um gosto, um prazer, um divertimento. Veríssimo é um escritor de mão cheia e. quando se chega ao fim desta trilogia, só nos apetece outra de igual tamanho ou maior.  

 

Au bonheur des dames 478

d'oliveira, 04.04.19

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Quanto mais primo

Maior será o arrimo

mcr, 4.04.19

 

Não pensava voltar a este pouco inspirador tema do nepotismo, colheita de 2018. Todavia a triste história de um cavalheiro de seu nome Armindo Alves obrigado a pedir a demissão depois de ser conhecida o seu parentesco próximo com o sr. Carlos Martins, Secretário de Estado do Ambiente. O primeiro cavalheiro era, desde 2016, adjunto do seu importante primo.

Em tempos que já lá vão havia um provérbio meio acanalhado que dizia “quanto mais prima mais se lhe arrima”, referência a relações familiares quase incestuosas.

Agora, graças –eventualmente- ao “me too”, as primas são substituídos pelos primos e as relações passam a ser banalmente laborais.

Antes que algum(a) leitor(a) me saia ao caminho com a torpe acusação de inventar palavras, aviso que “arrimo” significa, entre outras coisas, peça ou lugar em que alguém se encosta” e, mais precisamente arrimo de família usa-se para significar pessoa que fornece a uma família os meios de subsistência (Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa) .

Parece que os dois primos já se tinham cruzado numa autarquia da grande Lisboa, onde o agora ex-adjunto era “técnico municipal”, lugar sem dúvida ideal para daí transitar para adjunto de qualquer Secretário de Estado. Segundo li, a criatura tinha obtido uma licenciatura em Geografia, coisa de extrema utilidade para qualquer política ambiental. De facto, os adjuntos servem, entre outras coisas, para fornecer aos governantes, algumas elementares noções sobre a geografia do local onde, desgraçadamente, ocorrem coisas desagradáveis. Assim a latitude, a longitude, a orografia dão preciosas indicações ao governante para poder afirmar que qualquer catástrofe ocorrida em qualquer ponto do território tem causas naturais que extravasam a competência do responsável ministerial. É a natureza a funcionar. Do mesmo modo, a natureza familiar propende a recrutar a parentela para cargos onde a nomeação não carece de CRESAP ou outras minúcias do mesmo teor. Sobretudo se não houver coincidência de nomes de família como parece ser o caso de Alves e Martins.

O que mais surpreende nesta historieta de faca e alguidar é isto só agora aparecer à crua luz do dia. Anda-se há semanas a discorrer sobre o labirinto de relações familiares de governantes e familiares e, só ontem se verificou esta demissão. E sobre demissões, importa lembrar que o adjunto foi-se mas o “adjuntador” ficou. Como se nada fosse com ele. Como se o desagradável da questão ficasse resolvido com a saída do primo querido mas agora, véspera de eleições, indesejado.

E o senhor Ministro da pasta de nada sabia! E o senhor Primeiro Ministro, idem. Abençoada ignorância que permite que algo mude para que tudo continue na mesma. Dir-me-ão que neste campo, não há ignorância da lei mas apenas da famosa “ética republicana” com que todos os dias algumas luminárias nos bombardeiam.

Eu, “um pobre homem” de Buarcos, sempre pensei que só há uma ética e que esta não se caracteriza por um entusiástico republicanismo ou um adocicado monarquismo. A nossa história pregressa regista casos de ética e, sobretudo de falta dela, em todos os regimes que Portugal teve ou sofreu.

 

APENDICE

O sr. Carlos Martins ter-se-á demitido hoje, segundo se anuncia. A questão que se põe é a seguinte: demitiu-se de livre vontade ou foi devidamente defenestrado.

É que a pergunta não é ociosa. Se a livre vontade imperasse já demorou tempo demais. Ao primeiro sinal, deveria tê-lo feito, porventura antes do primo. Tudo faz suspeitar que foi empurrado sem suavidade para a demissão.

Dir-se-á, no caso de demissão espontânea e voluntária que antes tarde do que nunca. Mas sempre tarde e a más horas.

Provvelmente, uma boa dúzia de crocodilos, impantes de ética e de receio pelo resultado do escândalo, virão bramir que a atitude (tardia, repete-se) do ex-Secretário de Estado revela um “grande sentido de Estado”, fórmula tão oca quanto usada. O sentido de Estado imporia que nunca, em tempo algum, nomeasse um parente. Mas nomeou. E manteve-o mais de dois anos, longe da vista do público. Se isto tem algum sentido não é seguramente de Estado. Convenhamos que a partida de Martins pouco ou nada mexe com a estrutura do Governo. Não definia políticas e, aqui muito entre nós, não é o ambiente que excita especialmente os portugueses na generalidade nem sequer a opinião pública mais activa, se é que a há. Todavia, esta demissão tem, eventualmente, consequências eleitorais. Aumenta a desconfiança dos eleitores mais voláteis do PS e dá oportunidade a uma série de filisteus que virão ao palco chorar baba e ranho e prometer que, com eles, nem primos em quinto grau, pisarão os degraus poluídos de qualquer ministério.

E, já agora: e os outros os nomeados que inçam em vários graus os ministérios? Ficam ou desandam para a toca de onde nunca deveriam ter saído? E os seus “padrinhos” e “madrinhas”? Assobiam para o ar e esperam que o mau tempo amaine?

Ai Portugal

se fosses só três sílabas...

...sul, sol e sal ...