estes dias que passam 800
Um cheirinho a autoritarismo e a passado
mcr, 15-5-2
deixei de fumar há uns bons 25 anos. Foi uma decisão pensada mesmo que, fumador inveterado, nada sentisse quanto os efeitos do tabaco.
Apenas isto, subitamente pensei que deveria parar, e parar imediatamente, sem apelo nem agravo. Por uma questão de bom senso a que não faltava uma ponta (ou várias) de orgulho.
Como única ajuda, arranjei uns selos aparecidos na altura de que o médico que consultei para pedir a receita obrigatória, disse que talvez valesse a pena tentar.
O tom pouco convicto de médico depois de saber que eu jogava na primeira divisão fumadora a quatro maços por dia, exasperou-me e deu-me mais força para enfrentar o desmame do tabaco. Comecei por usar o selo e, de duas em duas horas puxava do cigarro e dava-lhe uma aspiradela. Uma e só uma. Guardava a pirisca esperando que me desgostasse para a próxima mas nem isso ocorreu. O meu dia nessa época dava para três quatro cigarros avidamente acesos e chupados!
Ao fim de mês e meio, num dia em que almoçava com a minha mãe em Cascais, fui pelo cigarrinho e e descobri que me esquecera do maço. “Não faz mal, fica para a hora do lanche. À hora do lanche desafiei-me e deixei para depois do jantar. E quando chegou a hora, decidi ir para a cama a secas.
Nunca mais puxei de um cigarro mas durante um ano andei sempre com um maço no bolso. Devo dizer que este desmame à bruta (os selos eram para três inteiros meses...) provocou-me semanas, que digo!, meses de algum sofrimento. Tanto mais que sonhava apavorado que estava a fumar!
Nunca mais fumei, deitei o maço fora e até hoje. Parece que o meu pulmão estará em grande forma como se nunca tivesse acendido um paivante.
Não sou um anti-fumador convertido à verdade, mesmo que me custe sentir o fumo de alguém que, eventualmente fume perto de mim.
Quando saiu a lei que ainda nos rege sobre o uso do tabaco fui entrevistado e disse que, em certos pontos, me parecia demasiado severa.
Agora, uma senhora secretária de Estado veio à janela da televisão e anunciou um terramoto anti-tabágico.
Lembrei-me logo da “lei seca” nos Estados Unidos, verdadeiro motor da implantaçãoo e crescimento desmedido da Mafia ou, melhor de várias máfias, do crime organizado das perseguições aos bares clandestinos, da corrupçãoo que cresceu no seio das polícias por via dos pacotes de dólares dos gangsters, enfim lembrei-me de tudo. Que a medida não resultou nem fez diminuir seriamente o número de bebedores todos sabemos. Que após o fim da lei seca as mafias se reconverteram nas drogas, idem, aspas. Que os crimes causados por alcoólicos não diminuíram é uma evidência, sobretudo num pais onde as armas mais sofisticadas se compram quase em todas as esquinas.
Temo bem que esta lei por ora anunciada, este higienismo a outrance, este pacote severo que lembra o passado (e eu conheci e vivi trinta anos nesse passado de medo, denuncia, “bufaria”, pide desenfreada) autocrático, afascistado do país.
Há na nova hipótese de lei coisas que bradam aos seus mesmo se não chegam às orelhinhas da Secretária do Estado ou do Ministro da Saude que de resto só se ouve a si próprio e gasta o seu tempo a perorar sobre as maravilhas actuais do seu ministério.
A coisa lembrou-me um romance que foi um enorme êxito, “A 25ª hora” até em português foi traduzido!
Suponho que é aí (ou será noutro romance também lido mas de que não recordo o nome) que aparece a história de um grupo de adolescentes convidados a uma qualquer dura tarefa nos tempos da Roménia comunista. A descrição do futuro que o camarada controleiro faz do trablho que eles irão desenvolver parece um radioso conto de fadas futurista que, inclusive, trará aquela região “um céu mais azul”.
Eu desconfio, sempre desconfiei das boas intenções que justificam sempre leis restritivas da liberdade individual e que, ainda por cima, nem sequer tomam em linha de conta a realidade nacional.
A proibição de venda de tabaco em cafés vai sobretudo cair sobre todo o interior, sobre o litoral menos habitado onde também há povoações que só tem um café/tasca para todo o serviço.
A televisão já mostrou um velho alentejano que terá de calcorrear mais de vinte quilómetros para encontrar uma tabacaria.
Também não percebo porque razão se há de vender tbaco nos aeroportos se no resto do país há tantas restrições, desse a proibição das máquinas, à proibição de venda em papelarias, quiosques e tudo o resto...
Na melhor hipótese é mais um frete que este Governo sempre obsequioso, sempre de pata pedinchona estendida ao eventual estrangeiro que trará para cá o cacauzinho que não aquece as algibeiras portugas, A proibição nas bombas e serviços assimilados das autoestradas convive com a exuberância de álcoois de venda livre. Afinal um condutor bêbado (e rodos os dias se apanham dúzias deles) não consegue prejudicar tanto a nossa rica saúde como o cigarro.
Claro que vai haver prevaricadores em todas as esquinas e, a menos que se recrutem à fartazana, polícias, bufos e restante pessoal, a coisa vai ser uma lei seca à portuguesa. Na falta de sítios onde comprar os cigarrimhos não faltarão locai clandestinos, vendedores clandestinos, enfim mais uma pequena mafia que crescerá como crescem todas as outras. Por exemplo, as da droga que enchem o país de lés a lés, desde os portões das escolas até locais pouco frequentados onde a qualquer hora se pode ver um mariola a picar-se, outro a fornecer, vários acampados (basta ver o que se passou no Porto...) miúdos a roubar primeiro os pais, depois os familiares e no fim toda a gente. Até morrerem de overdose!...
Entretanto, o álcool vende-se livremente, a garotada universitária faz questão de desfilar no cortejo da queima bêbada como um cacho, o que resto já se tornou uma tradição.
A vida, dita nocturna, a movida à portuguesa, exemplifica como o álcool circula. Se for preciso há sempre um adulto para ir buscar lá dentro uma rodada de cerveja. Isto quando os proprietários se mostram difíceis, o mesmo é dizer que ou se coloca um polícia a casa canto do balcão ou a venda entusiástica continua.
Os restantes dispositivos legais anunciados não destoam deste higienismo, melhor dizendo desta pobre imitação de uma autocracia higienista.
O actual ministro perde-se em palavreado mesmo se, como hoje, as notícias falam em consultas adiadas por três ou mais anos. Como de costume é o Interior qu apanha com os atrasos. Esta hipótese de lei parece um fuga para a frente.
Pelos vistos a Secretária de Estado, que será um médica experiente, não se pode gabar de algo que neste caso, é política pura e dura. Provavelmente daria uma excelente missionaria nalgum perdido país africano onde, de resto, poderá ainda subsistir o saudável hábito de comer os religiosos que os procuram confortar espiritualmente quando eles, sofrem de fome, de pobreza, de doenças e de agressões militares.
Os portugueses tem problemas piores do que o tabagismo mesmo se este não seja grave, como o alcoolismo! Como as drogas pesadas! Como a falta de médico de família, de urgências abertas, de cuidados continuados (terão fechado quase noventa camas recentemente...)
Não lhe desejando que figure no menu de um bando de canibais sempre lhe recomendaria o regresso ao hospital onde exercia uma medicina de qualidade. E recordar-lhe que há uma coisa chamada “princípio de Peter”. Ao ministro já se não recomenda nada. Nõ vale a pena!...