homem ao mar 100
Liberdade vigiada 89
O planeta esgota-se?
mcr, 28 de Julho
Hoje, as televisões abrem em tom dramático (e o caso merece, pelo menos, reflexão): esgotámos a capacidade do planeta para o ano corrente. A partir de amanhã estamos a viver de empréstimos sobre o futuro.
Desconheço como é quês se chega a esta conclusão, qual o valor dela mas olhando em volta não posso deixar de reparar que algo não corre da melhor maneira.
A começar pela degradação do clima: não é “normal” haver nos Estados Unidos e Canadá, e fundamentalmente na parte norte dos EUA tanto calor, tantos incêndios.
Também parece anormal que, na Bélgica e na Alemanha, Julho seja mês de chuvas tão intensas e violentas. No Verão os rios levam muito menos água, mas neste transbordaram como no pior dos invernos. E por aí fora...
Aliado a isto temos um excessivo consumo de recursos que, pelos vistos esgotou a capacidade anual de os produzir ao fim do sétimo mês do ano.
E finalmente, a pergunta cuja resposta vale milhões: que fazer?
As respostas não são muitas mas têm um ponto comum: não servem, ou servem para pouco. O terceiro mundo, que ainda por aí anda, e cresce, pode ter índices que fazem pensar que as coisas melhoraram. E melhoraram, claro. Mas o “fosso” entre esse terceiro mundo e o primeiro (desconhece-se se há mesmo um segundo) aumentou gigantescamente. A fome não foi erradicada. As grandes doenças persistem e campeiam à rédea solta. A esperança de vida é escandalosamente baixa face ao que o mundo ocidental regista.
A poluição dos oceanos é inquietante. O lixo invade tudo. Quanto mais rico és, mais lixo produzes.
Todas as tentativas para reciclar morrem pelo facto de poucos se disporem a fazer o pequeno esforço de separar o lixo doméstico.
E é nisto que entra o folhetim de hoje. Sexta feira passada, em Lisboa fiz um par de compras, livros e alguma roupa. O primeiro livreiro, que me conhece há anos, começou por me perguntar se eu trazia um saco. Claro que não trazia. Pesaroso explicou-me que agora estava proibido de dar sacos. “Não importa, respondi, eu pago”. - Olhe que lhe posso emprestar um saco, retorquiu. -Não, senhor, eu pago. E lá me levou dez cêntimos pelo saco de que se despediu quase em lágrimas.
Numa loja, boa e cara comprei duas peças de roupa. Mesmo em saldo não eram nenhuma ucharia. O saco, bom, de papel espesso e com logótipo, custou-me, outra vez, dez cêntimos. Estive para perguntar à caixeirinha que me atendeu se achava que eu podia levar as peças de roupa debaixo do braço, mas desisti.
Eu entendo perfeitamente que há que combater o plástico. Quanto mais não seja obrigando o consumidor a pagar que é na bolsa onde dói mais. Penso, porém, que em vez de sacos de plástico poluentes e eternos se poderia levar a mercadoria em invólucros de papel. Papel de florestas auto-sustentáveis, facilmente reciclável. Mas não, mesmo na loja cara, que precisa de clientes como de pão para a boca, e que nunca usou o “horroroso” saco de plástico, o cliente tem de pagar deixe na loja a quantia que deixar. Curiosamente, num outro alfarrabista, eu não resisto a esta pulsão livreira, foi-me oferecido um saco de pano, com ar decente, que se pode usar indefinidamente (ou quase). E lá vim, triunfante, com um saco com o logótipo do livreiro, nome, direcção e e-mail, (incluindo telefone e e-mail) estampados. E, depois de gastar mais de cem euros, dei comigo a pensar que tinha poupado dez cêntimos! Lá dizia a Dona Antónia (Ferreirinha?) que de tostão a tostão se poupa um milhão...
Ao que sei os nossos ecologistas, incluindo aquela coisa chamada “os verdes”, pequeno mas útil satélite do PC,rejubilaram com o pagamento dos sacos de plástico. Não se percebe porque é que não se proibiram. Ou melhor: percebe-se. Os sacos de plástico, pelo menos aqueles em que se embrulha meio quilo de morangos ou quatro laranjas, o peixe e a carne não embalados, não são taxados. Só os sacos grandes para transporte do conjunto das compras!
A solução, sempre genial como todas as que proponho, seria voltar a produzir seiras e cestos de vime. Era assim que nos anos quarenta se ia às compras. Quem tinha criada (naquele tempo infame, havia criadas e não empregadas domésticas. Eram duros tempos de poupança, inclusive de palavras uma de cinco letras por duas com cinco vezes mais!) fazia-a transportar a seira cheia e pesada. Quem não tinha carregava, claro.
Assim se contribuía para salvar o artesanato nacional, animar o interior onde ele ainda subsiste. E uma seira ou um cesto duram que duram. E não poluem!
Todavia, os nossos ambientalistas são demasiado jovens, não conheceram as agruras da vida na primeira metade do século passado, nem essas utilidades boas e baratas com que íamos passando o tempo enquanto não aparecia o saco de plástico.
Agora, e sempre nesta onda mansa, discute-se o fim dos combustíveis fósseis. Em 2035, dizem, não haverá carros a gasolina ou gasóleo. Será tudo eléctrico.
É possível que já não assista a esse fenómeno que já vou numa bonita (?) idade. De todo o modo, mesmo que ainda viva, duvido que alguém de bom senso me permita conduzir.
Gostaria, no entanto, de lembrar que essa felicíssima transição vai custar caro. Há ganhos indiscutíveis e gerais mas cada um de nós pagará um preço. Um planeta mais limpo e mais saudável (se entretanto ainda houver planeta) custa dinheiro. A começar pelo carro- Um carro eléctrico poderá, a la longue, fazer-nos economizar uns euros (não muitos, mas sempre alguns) mas é bem mais caro que o seu congénere a combustíveis fósseis. Claro que no primeiro mundo (lá estou eu a dar-lhe...) a coisa poderá ser exequível para uma boa fatia da população – mas nunca toda – mas no resto (e o resto representa cinco ou dez vezes mais pessoas) a coisa não parece assim tão fácil.
Será que no actual discurso dos amorosos amigos da Terra, dos animais ,das flores campestres e da “água fria da ribeira”, há indícios disto? Será que o palavroso e veloz, velocíssimo ministro do ambiente sabe disto. E se sabe, já o disse publicamente? Eu não o ouvi mas é verdade que cada vez oiço menos ministros, secretários de Estado, directores gerais et alia. Por uma simples vontade de me despoluir sonoramente...