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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

liberdade vigiada 139

d'oliveira, 17.09.21

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Liberdade vigiada 139

África, África...

mcr, 17 de Setembro

 

entre os 13 e os 15 anos, ou seja no segundo ciclo do liceu, vivi em Moçambique, primeiro em Lourenço Marques e os últimos oito meses em Nampula.  Nessa última estadia, percorremos boa parte do “mato” dos então distritos de Moçambique e Cabo Delgado. Eu enjoava que nem um pescada mas apesar disso, não nego que essas pequeníssimas terras a que íamos, capitais de circunscrições e algumas vezes simples “postos” tinham um certo encanto. O meu pai tinha amigos (sobretudo parceiros de bridge) em vários sítios e a chegada dele era uma festa para os restantes jogadores que raras vezes conseguiam “fazer uma mesa”.

Claro que eram as praias o que mais nos interessava e, sobretudo , a das Chocas, no Mossuril, frente à lha de Moçambique onde íamos amiúde. Convém explicar que ir à praia significava uns bons cento e cinquenta quilómetros, que em África não passava de um passeio.

A ilha, ainda sem ponte para o continente, era extraordinária. Lado a lado os testemunhos d uma presença portuguesa de séculos (a fortaleza, os fortes, as igrejas, as casas  dos brancos e depois um bairro “indígena” de palhotas com uma enorme densidade populacional. E  os riquechós que para nós miúdos eram uma novidade.  

Era diante da ilha que os paquetes paravam, em águas profundas mas a escassas dezenas de metros de terra.

A chegado de um paquete, (duas, três vezes por mês) era m acontecimento para a população branca. Parava tudo para ir a bordo, fazer compras, encontrar conhecidos que chegavam ou partiam, às vezes de Porto Amélia, beber um copo (igual aos de terra mas com sabor de ode marítima), enfim, uma distração numa terra que pela sua pequenez  (3000 por 350 m) não oferecia aos habitantes grandes oportunidades fora o trabalho e a má língua).

Havia uma praia mas nada que se comparasse às praias da costa, quase todas coralinas, areia branca, coqueiros até à beia-água, algo que se costuma vez nos exóticos mares do sul.

A praia das Chocas tinha uma série de pequenas casas para veraneio, propriedade da administração d circunscrição e que podiam ser alugadas. . à beira mar, havia “parrots” (um a construção de quatro ou cinco pilares com teto de colmo) para proteger os escassos banhistas do sol tropical e violento.

Logo que alguém chegava, aparecia um ou mais pescadores que se ofereciam para ir buscar peixe e, sobretudo lagostas. As lagostas eram vendidas em latas vazias e só havia duas medidas: meia lata ou lata inteira. Tudo pelo preço da uva mijona. (“Ah, quem não viveu na África colonial não sabe quanto a vida para os colonos era boa”. Desculpem a frase roubada a Tocqueville mas ela é de uma justeza dramática).

Ainda voltei a Moçambique para férias da faculdade por três vezes mas na última, já as sombras da guerra pairavam o longe. Nampula estava transformada em quartel general de muita tropa, havia notícias poucas mas graves de incidentes a norte de Mueda e na zona das duas Mocímboas. Já havia uma base aérea militar de onde desertaram dois amigos meus que faziam o serviço militar. Eram brancos moçambicanos e tomaram o partido da FRELIMO. Um deles chegou a ministro depois da independência.

Todavia, na cidade e nas circunscrições do distrito a vida prosseguia, tranquila, plácida, dizia-se que os makuas não alinhavam com os guerrilheiros e talvez fosse verdade. O mesmo se passava, dizia-se, com as etnias Nianja, Ajaua e outras de Cabo Delgado.  Mas presença de vários destacamentos militares era notória e sabia-se de feridos que vinham do norte. Normalmente eram soldados que pisavam minas mas é provável que houvesse outros feridos por bala.

1965 foi o meu último ano de contacto com Moçambique. A partir daí as notícias que tinha eram de outra proveniência e todas preocupantes fosse de que ponto de vista fosse. A guerra traz sempre um extenso cortejo de vítimas  e por cada soldado português ferido ou morto havia um enorme número de vítimas negras entre eventuais guerrilheiros e população civil apanhada entre dois fogos e vítima de acções das duas partes (é bom que se diga isto porquanto há o hábito de “esquecer” que a guerrilha punia exemplarmente qualquer sinal de colaboração com os brancos (e acentuo a palavra brancos)mesmo se a coisa não passasse da natural obediência a quem percorria armado o território.

Agora, dessas paisagens que me diziam (e dizem) tanto, vem outra e trágicas notícias. A começar pela imagem de um Estado ausente, prepotente que precisa de tropas estrangeiras para fazer o que o exército moçambicano não sabe ou não pode fazer. E não faz nos territórios chegados ao Rovuma nem nas zonas de fixação de dezenas (ou centenas?) de milhares de fugitivos, de deslocados, de gente sem eira nem beira nem ramo de figueira. São sobretudo as ONG, as organizações religiosas (cristãs ou muçulmanas)e alguns heróis individuais quem tenta minorara trágica situação dos recolhidos a miseráveis campos de refugiados. O Estado finge que faz, mas faz realmente pouco. O poder da FRELIMO tem raízes no Sul, vive no Sul e abandonou há muito o Norte. Ou melhor, do Norte só espera os dinheiros do gás que agora secaram pela guerra.

Porém, eu não vinha falar de Moçambique mas de África, da África negra, subsaariana, da África onde não chegam as vacinas e onde o vírua se ceva à fartazana (sobretudo na República Sul Africana que é dos poucos países com infra estruturas sanitárias razoáveis mas que nem por isso se mostram especialmente eficazes.  

Em boa verdade, nem sequer temos notícias credíveis do avanço ou não da pandemia. A África negra é um buraco negro no universo, no nosso pequeno universo planetário. Quantos mortos se registam no Gabão? Ou nos Camarões? Ou no Sudão, nos dois Sudões?

As boas alminhas acusam, como não?, o Ocidente. E é verdade que as dádivas de vacinas são escassas mas também é verdade que as elites nacionais na maior parte destes países não cumprem os mínimos para combater a crise. Nem esta, nem as anteriores, nem a fome, os subdesenvolvimento, também endémico, a corrupção generalizada, o desgoverno, o desprezo pelos camponeses, pelos pobres, pelos “condenados da terra”.

E conviria lembrar que, com o terror da pandemia, as opiniões públicas do resto do mundo (e não só as ocidentais que são apesar de tudo as que mais ajudam) quer primeiro garantir a segunda dose, a terceira quiçá a quarta antes de mandar as vacinas de borla para “os pretos”.

Bem podem os mais generosos avisar que a pandemia tem de ser combatida planetariamente; que deixar bolsas gigantescas de humanos sem meios de fazer frente ao covid é permitir que apareçam  novas variantes; que a solidariedade é um dever.

Nada feito. E não é apenas  o egoísmo que evita as ajudas. É o medo. Um medo difuso que vai demorar muito tempo a desaparecer.

E convenhamos: nisto de combate à pandemia, há coisas que me arrepelam. No Brasil oito milhões e meio de pessoas faltaram à segunda toma. Nos Estados Unidos há minorias fortes pe pertinazes que recusam a vacina. Na União Indiana, ninguém sabe quantas vítimas de facto há. Nem quantas novas infecções. Da China nada se sabe. Ou seja, não é apenas a África que apresenta problemas. Só que aí tudo se complica desde a falta de Estado até à pobreza e ao desamparo gritantes.

E por favor, pelas alminhas, não me venham outra vez com a culpa do colonialismo. Há cinquenta anos acabaram as últimos colónias, que diabo!

E ente elites corruptas, indiferentes ou genocidas e elites que abandonam a pátria e se instalam na Europa (e não falo dos que se arriscam a vir por mar, sem nada a não ser o terror, a miséria de que fogem e a esperança de uma vida ligeiramente melhor -por exemplo comer todos os dias- Falo dos que abandonam os seus países e vem para cá fazer a crítica do Ocidente. Nas universidades, nos meios vagamente culturais, entre os “indignados” que os apadrinham mas também não ajudam especialmente. Se a sua energia tão exuberante na comunicação social e na indignação fosse aproveitada onde realmente é precisa, ou seja, lá, talvez as coisas melhorassem. Ou não!    

na vinheta: paisagem de Luanda!

  

liberdade vigiada 138

d'oliveira, 16.09.21

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Liberdade vigiada 138

Mas sempre trapalhão...

mcr, 16 de Setembro

 

 

Ontem estive à conversa telefónica com a minha velha, velhíssima amiga Jujú “Cachimbinha”. Eu odeio telefones mas a Jujú não me dá alternativa. À Uma gosto muito dela. Depois, ela que conhece a minha ojeriza ao telefone, avisa-me ameaçadora: se tentas baldar-te, telefone à uma, às duas, às três e às quatro da manhã...

Às tantas veio o blog à baila. A Jujú vive numa quinta soberba, na zona de Sintra, compra tudo pelo telefone ou pela internet, tem um motorista (ela nunca guiou) que vi às compras com uma empregada  que sabe exactamente o que a patroa quer, vê televisões de todo o mundo, lê, faz lavoura (!!!, mais diria que jardina mas enfim. Além do jardim ela tem um pequeno campo só com ervas silvestres onde também mandou pôr rosmaninho, lavanda e outros cheiros desses, que fazem a felicidade de um apicultor vizinho que todos os anos oferece boiões de mel. A Jujú entrega-lhe os boiões vazios e brinquedos para os filhos.

Chamamps-lhe “Cachimbinha” porquanto aprendeu a encher o cachimbo de um irmão mais velho, filho de um primeiro casamento da mãe que enviuvou muito nova. O irmão, Alexandre Manuel ou “Xaninho” (Xanel para uma noiva enternecida, que com isso e umas formas redondas a preceito, o levou ao altar) fumava cachimbo. E fumava-o a sério. Tinha uns cinquenta cachimbos, usava cada um só uma vez, até dar a volta completa e voltar ao primeiro) e apreciava tabacos holandeses de alta qualidade. Nos aniversários, nós todos, os amigos do costume, só tínhamos o trabalho de um ou dos meses antes encomendar na Havaneza de Lisboa embalagens diversas para a festa. Xaninho ficava de olho pingão com esta prova de carinho da frátria e fazia a primeira cachimbada sempre acolitado pela irmã dez anos mais nova e preparadora inigualável de cachimbos. Também os limpava com extraordinária eficiência e como ainda era menor entre os menores, tinha a obrigação de prendar o mais velho com caixas de fósforos. Para isso recorria a um tio embarcadiço (era médico de um navio) que lhe trazia fósforos de todo o mumdo!

Claro que se casou com um inveterado do cachimbo que, porém, a deixou viúva com três filhos. A história desta morte é sinistra: o cachimbante tinha negócios em Inglaterra mas adorava Paris. Portanto logo que terminava os contactos em Londres, embarcava no ferry para França. Dava um salto a Paris, enchia-se de choucroute à alsaciana e regressava para os braços da bem amada com mais dois quilos bem pesados. A Ju punha-o a dieta de vegetais, mas a havia sempre uma empregada piedosa que lhe levava um bife com ovo a cavalo ao escritório onde a Jujú não punha o pé.

O marido, numa dessas surtidas de ferry para França entendeu, num dia de temporal tremendo ir para o deck aviar uma cachimbada. O mar encapelado fez com que o ferry batesse noutro barco. Houve um pancadão de feridos e um desaparecido provavelmente caído ao mar durante a colisão. Era o marido da Jujú. Todos lhe dizíamos que morreria de cancro por via do tabaco e ele propunha apostas sobre a sua morte. Eu, do cachimbo, não morro, garanto-vos. E de facto morreu num abalroamento de navios em dia de tempestade na Mancha. Todavia, W afirma, não sem lógica, que se ele não fosse cachimbar para a amurada, não teria morrido! Alguma razão em. Até  Jujú concorda.

Ela dava explicações de inglês e alemão e com isso governava-se lindamente. Aluno imprestável  nessas cadeiras, só tinha essa salvação. A Jujú metia-o na ordem e enfiava-lhe a língua em falta à martelada se tal fosse preciso. A fama dela era absoluta e os preços que praticava escandalosos. “Meter uma língua naqueles cérebros embrutecidos e preguiçosos é um trabalho de Hércules. Quem achar que sou cara que vá procurar outra!”.  

Os resultados dos explicandos dissuadiam qualquer pai aflito com a ignorância filial. Até havia quem metesse cunhas. Fora a jardinagem, as explicações, o cuidar dos filhos, a Jujú era uma temível jogadora de bridge. Jogava bem, desancava o parceiro se este asneava ( já o imortal Reese, grande estre deste jogo abençoada dizia que o melhor do bridge era ir às orelhas do parceiro quando este falhava uma voz ou uma vasa imperdível.)

Ora bem, a Jujú telefonou por via de um texto meu deque gostara mas “tinha imprecisões” –Tu até nem te desenrascas mal. Até podias ser genial mas és quase sempre um trapalhão!”

Aceitei humildemente o epíteto. Até eu, me considero um trapalhão e isso desde os tempo da escola primária.

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“E agora o que preparas para amanhã?” Expliquei que não preparaa nada mas provavelmente iria escrever sobre um médico negaionista que andara vagamente, e mal, pela política, até desaparecer.

“Ora, deixa-te disso. Esse palerma foi apanhado pelas contas da ong. que fundou. Aquilo era um emprego para toda a família. Devia sobrar pouco para os desgraçados dos pretinhos doentes. O homenzinho delirava e quando foi político, e deputado (ao que isto chegou!) só metia as patas de trás pelas da frente. Até se candidatou a presidente da república, o alucinado. A minha vontade era dar-lhe um par de xulipas. “

Convém dizer que a Jujú foi das primeiras portuguesas a fazer judo e depois karaté e outra lutas esquisitas. Era franzina mas tinha pelo na venta. Foi para o judo mas o professor disse-lhe que ela era rapariga e ali só havia rapazes. “Deixe lá que eu dou conta desses mariconsos todos” E tanto insistiu que entrou. E arreava nos outros forte e feio mesmo se também apanhasse quem lhe chegasse a roupa ao pelo. Os judocas deliravam com a coleguinha e ai de quem se atrevesse a olhá-la de soslaio.

Bom, acabemos com a Juju, porque em boa verdade, hoje mesmo comecei a verificar, mais uma vez, que a Jujú tem sempre razão.

Meteu-se-me na cabecinha pensadora organizar os meus posts, isto é todas as croniquetas que, durante esta dúzia de anos tenho cometido. É que, descobri que por vezes me repito, ou pelo menos toco no mesmo assunto, na mesma historieta, vá lá que a segunda versão não põe em causa a primeira mas, a memória já não é o que era e eu não queria repetir-me, desmentir-me, fazer fraca figura (ou mais fraca do que a que já faço).

Portanto, fazer um ficheiro completo, índices remissivos, se possível com indicação do assunto, coisa séria. Não que me queira publicar mas, que diabo, queria, ao menos, poder chegar a qualquer escrito sem andar perdido por aqui.

Entendi começar pelos escritos deste ano e meio de pandemia. Ai jesus, Maria, José!

Primeiro são muitos, cerca de 500. Depois, estão ordenados por títulos e séries diferentes. Há mesmo numeração repetida, coisa em que sou perito desde quase o primeiro dia em que aqui escrevo. Um desastre!

O mês de Março do ano passado já me mostrou como é que as coisas vão ser. Optei por ir pesquisar cada dia e descobri espantado que só assim é que eventualmente conseguirei – e com dobrados trabalhos – apanhar tudo. A primeira tarefa foi fazer uma pasta secundara onde amontoei os primeiros vinte textos. Depois farei um índice por títulos e, como sub-produto, outro por datas. Como sou um trapalhão info-excluído, entendi imprimir uma meia dúzia. Descobri aterrado que essa meia dúzia dava quarenta e tal páginas. Bem sei que a letra saiu grande mas não conseguirei reduzir a coisa a menos de 35.

Ou seja, cada martelada na paciência dos leitores dá, em média 5/6 páginas, pelo menos. O que quer dizer que em 2/3 anos a coisa irá a ¾ ou 5 mil páginas. Nem o colega Marcel Proust, um chato genial e embirrante, todo devotado âs “madeleines” e às duquesas e outros aristocratas fin de siécle, escrevinhou tanto. Mas ele tem desculpa: escreveu peças imortais. Às vezes chatas mas sempre brilhantes.

Mesmo assim o Gide, pela primeira vez que o leu, recusou o seu aval e o pobre Marcel teve de procurar editor alternativo.

Porém, eu que lavro esta leira de terra maninha apenas para me distrair  não tenho essa desculpa. A desculpa do génio, claro.

Proust tinha o hábito de reescrever. Era como o Eça, um maníaco da forma, do estilo, da elegância. Eu, além de trapalhão sou preguiçoso, já me dá uma trabalheira reler o que escrevi, para corrigir algum erro ortográfico mais evidente e semear um punhado de vírgulas.

Usto de uma pessoa e dedicar à crónica tem vantagens. A coisa sai, e não se pensa mais naquilo. Um romance é outra dimensão: há que cerzir, e `mão, duzentas trezentas páginas, criar um enredo, inventar um par de personagens credíveis, enfim contar uma história com cabeça tronco e membros. Ai o que eu admiro Balzac, Eça, Stendhal e mais meio milheiro de cavalheiros (e senhoras, claro está) que suaram as estopinhas, rebentaram os olhos, perderam noites e dias sentados a uma mesa a olhar aterrados para a página miseravelmente branca, à espera de uma ideia, de uma frase, de um milagre. E sem desfalecer, com uma vontade indómita de vencer, de convencer, de ser o que eles queriam ser!

E eu, práqui (assim mesmo, práqui)às voltas com o fantasma da escrita  à matroca, da escrita que pratico, disto.

Mas vou à mesma, fazer o fdp do índice. Vou gastar remas e resmas mas sempre quero ver o que fiz. E nõ me fio na internet, mesmo se isto organizado lá tiver também lugar. Estou como o meu querido amigo Zé Quitério que só acredita em papel. O resto não é com ele que, provavelmente, nunca usou computador. E que bem que escrevia o grande sacana. Oh, inveja, mãe de todas as canalhadas, deixa-me em paz que eu sou muitas coisas, todas más, péssimas, assim-assim mas invejoso não. Pelo contrário, fico feliz pelos êxitos dos meus amigos. Até penso que esse êxito espalha sobre a minha velha carcaça um ligeiro aroma antigo e suave, como o da pétala dentro do livro há muito fechado.

 

*sobre o título: já aqui referi o caso daquele melómano alucinado que de Beethoven dizia: por vezes inspirado mas sempre ordinarote! Entre o velho grupo de amigos  que se intitula "o 7º de praia com latim e grego por fora" esta frase foi sempre muito usad. A a Juju, a malvadinha, lá a usou mais uma vez. 

         

 

liberdade vigiada 134

d'oliveira, 12.09.21

Liberdade vigiada, 134

O silêncio é de oiro

(ou devia ser...)

mcr, 12 de Agosto

 

 

O senhor José Magalhães, deputado que já perdeu a validade desde há muito, tem por vezes, demasiadas vezes, o condão de lhe fugir o pé para o chinelo. 

Está-lhe na natureza a grosseria e a piada rasca e ordinária. 

Desta feita, entendeu deixar no “twitter” umas frase sobre Bruxelas, “bondage” e sado masoquismo. Toda a gente, excepto ele (posteriormente e a tentar defender-se) viu nessa aberrante imbecilidade um ataque a Paulo Rangel que, obviamente não se dignou responder-lhe.

Todavia, uma outra deputada do PS veio à liça, acusando-o e, pelos vistos, a Direcção Parlamentar do PS deixou transparecer incomodo com a graçola soez.

Esta criatura distinguiu-se sempre pelo uso e abuso de um linguajar desenfreado que ele julga ser barraco mas mais não é do enxundioso. 

Trânsfuga do PC encontrou no PS quem o acolhesse pensando ganhar um tribuno e um legislador. O legislador é o autor de uma proposta liberticida que ainda anda nas bocas do mundo pelo zelo revelado em criar censura sobre alegadas fake news ou algo que de perto ou de longe se lhe assemelhe. 

O tribuno é cansativo e, com a idade, já se lhe conhecem os tiques e os truques de tal modo que quando ele perora há uma corrida aos computadores para ler as últimas dos jornais. Alguém confidenciou-me que aqueles rompantes oratórios poderiam dar para uma soneca mas, infelizmente há público nas bancadas, câmaras de televisão e a criatura berra alto.

 

“Uma seca sobre a seca de certas sessões!”, finalizou Este Magalhães é como os computadores do Sócrates: reluz por fora e por dentro é o que é: Mons parturiens!

 

 

O sr. Jerónimo de Sousa já tem idade suficiente para se lembrar da retirada inglória do exército soviético do Afeganistão. 

Tem idade, de resto, para se lembrar de mais um par largo de situações de que ninguém, mesmo muitos comunistas menos vesgos do que ele, se orgulha. Melhor dizendo: cal, esconde, assobia para o lado.

Todavia, este aprendiz tardio de ideólogo marxista (ou marchista) também, mesmo sem magalhanizar, se deixa cair na tolice. Então, em se apanhando com camaradas, vai daí e pimba! Dispara em todas as direcções. 

Na “festa do Avante” entendeu vitoriar a derrota do imperialismo que se verificou no Afeganistão. Vê-se que o sr. Jerónimo de Sousa não lê sequer os jornais.

Os EUA foram ao Afeganistão para caçar um criminoso rico como Creso que, em nome de uma fé enviesada, entendeu atacar as torres gémeas de Nova Iorque. Morreram nessa estúpida tentativa três mil pessoas. A grande maioria, aquelas horas da manhã, era constituída por pequenos empregados, mulheres da limpesa, ascensoristas, dactilógrafos, também bombeiros e polícias que tentavam salvar pessoas, e na generalidade gente assalariada, povo, classe média, vá lá, nada mais do que isso. Não memória de nenhum capitão de industria, grande empresário, patrão importante na lista dos mortos. 

Os americanos reagiram eventualmente a quente mas quem não faria o mesmo? E pediram a cabeça de Bin Laden aos talibans. Estes começaram por recusar, depois embrenharam-se em discussões, foram adiando até que o inferno lhes caiu em cima. 

E posteriormente, com as bênçãos da Nato e da ONU, os americanos entraram naquela espécie de far-east  sempre atrás do guerrilheiro milionário e dos seus assassinos a soldo. A coisa, que durou vinte anos custou ao contribuinte americano dezenas de milhões de dólares por dia, traduziu-se nalgum progresso na situação das mulheres (só na educação passaram de 5000 para mais de 2 milhões) na tentativa de criação de uma imprensa variada e  em mais quatro ou cinco indicadores de brm estar (mortalidade infantil, mortalidade das mulheres post parto, etc.) 

Em boa verdade, e já Eça de Queirós, avisava num extraordinário texo das Crónicas de Londres, o Afeganistão é ingovernável e inconquistável. Os igles perceberam isso, depoisde muitos potentados indianos o terem verificado, os soviéticos saíram à força continuamente metralhados pelos guerrilheiros, deixando atrás de si, um rasto de violência e de mortos dos dois lados bem superior ao actaulmete verificado. A retirada foi um desastre é verdade, mas foi o resultado de um acordo entre Trump e os talibans. O que não funcionou foi o Governo vagamente legítimo, a tropa treinada e municiada pelos ocidentais e provavelmente as grandes massas populares que não se comoveram com a democracia que lhes ofereciam nem com o Emirato islâmico que lhes prometem. 

Se não erro, o imperialismo consiste ou tem por fim uma desenfreada exploração de uma nação ou grupo de nações que é espoliada e roubada de qualquer maneira. No caso em apreço, a pobreza afegã não dava para roubar mais que umas dezenas de cabras esquálidas ou uns quilos de ópio. Até neste campo o imperialismo americano falhou porquanto a produção da droga teve forte baixa. 

O sr. Sousa, um dos mais antigos representantes da tendência “pró-soviética” (ou “revisionista”, se preferirem) mundial, dos tempos em que a URSS e R P China se enfrentavam em todos os areópagos “socialistas” e as cisões “revolucionárias” eclodiam em todos os partidos obedientes a Moscovo, dando origem aos famosos “grupelhos” tão citados por Álvaro Cunhal, parece ser um adepto fervoroso do fanatismo religioso, nascido nas madrassas do Paquistão e pago pelos direitos sauditas. Provavelmente achará pitoresca a moda das burkas, interessante a proibição de desporto para as mulheres e de música para todos. Não sei se ele sabe que, se eventualmente ainda há naquelas montanhas desoladas algum resquício do antigo partido comunista afegão, os seus militantes serão também limpamente perseguidos por infiéis, misericordiosamente lapidados ou metralhados por  falta de material mais adequado para o assassínio de laicos ou pró-laicos.

Eu bem sei que esta discursata foi para consumo interno, na festa, apenas para fingir que o ano que passa traz uma revoada de êxitos e vitórias, coisa sempre exaltante entre uma bifana e uma cervejola nos comes e bebes da quinta da Atalaia. 

A alegada “derrota” do imperialismo servirá de contraponto para uma mãozinha dada ao PS quando se votar o Orçamento. Porque é disso que se trata: de garantir no meio da triste “debacle” comunista actual, uns pozinhos de poder. A ideia é animar a malta, a malta que faz falta pra os votos nas autarquias próximas onde o “partidão” corre sérios riscos .

Porém, que diabo!, para quê vir atroar os ares com esta do imperialismo? Não tem mesmo mais nada? 

A 26 de Setembro saberemos. 

(nota: eu não defendo que Jerónimo de Sousa vá agora com aquela idade ter aulas de marxismo –leninismo, era o que faltava. Ele até foi “operário” ou, vá lá trabalhador especializado – afinador de máquinas segundo a wikipédia.

No entanto, numa análise detalhada da sua biografia verifica-se que a partir de 75 é deputado. Entre 69 e 71 foi soldado na guerra de África  na Guiné. Ou seja: em boa verdade, foram escassos os anos de operário mesmo se, como se afirma tenha antes de militar no PC  (filiado em 74), tenha sido um resistente cultural numa associação popular. É bonito mas como actividade revolucionária pré 25 de Abril a coisa não vai longe. E a tropa na Guiné não ajuda. Eu não sou dos que entendem que só a deserção era o caminho. Não era para muitas centenas de milhares de jovens que não quiseram, não souberam ou não puderam “dar o salto”. Mas também não sou tão ingénuo que acredite que, num teatro de guerra tão temível,. como o da Guiné, um soldado mobilizado tenha conseguido escapar à violência generalizada que a guerra, e sobretudo aquela guerra, foi. Nem que seja apenas para defender a vida 

Eu, num caso semelhante teria feito tudo para continuar vivo! Mas tive sorte: fui à inspecção antes do eclodir da guerra e fiquei “livre” graças à minha magreza e ao facto do jovem médico miliciano que me inspecionou ter aumentado a minha altura, diminuído ainda mais o meu peso. Havia uma coisa chamada “índice de Pignet” que determinava a robustez dos “mancebos”. Fiquei fora por um triz e nunca me achei tão feliz. Na altura e depois quando os meus amigos mais novos começaram a ser considerados “aptos para todo o serviço” e a marchar para as áricas. Os mais felizes apanhavam Cabo Verde ou S. Tomé ou mesmo Timor. Outros, poucos, conseguiam ir para a Marinha mas 90% iam mesmo para “atirador”. Carne para canhão, ou melhor, nos primeiros tempos, para “canhangulo”.

A minha tropa foi afinal feita nas cadeias e praticamente pelo mesmo tempo. Mas tive sorte, não o nego. De outro modo teria sido obrigado a emigrar. E nesse caso, fosse qual fosse o país de destino a vida poderia ter sido complicada. 

 

(juntei Jerónimo de sousa com a criatura Magalhães mas quer deixar claro que não os considero sequer vagamente semelhantes. Jerónimo é um homem decente e nunca o vi dizer ou fazer algo que se assemelhe ao que diz ou faz o seu ex-camarada de partido. É ocasião para se dizer que o PC se livrou em boa hora de um elemento pelo menos fraco. E, eventualmente, homófobo, como parece ser a opinião de Isabel Moreira, sua colega de bancada)                 

liberdade vigiada 127

d'oliveira, 05.09.21

Liberdade vigiada 127

O inimigo do meu inimigo

mcr, 5 de Setembro

 

 

Assim, à primeira vista, não me lembro de ter inimigos. Sou pessoa de bons fígados e alimentar um ódio tenaz nada me diz. E deve dar uma trabalheira horrenda...

Há, evidentemente, gente de que não gosto. Com quem não tenho relações de qualquer espécie. Ou porque as cortei ou porque nunca as tive- 

De quando em quando, raramente, aparece no meu horizonte alguém que não me apetece conhecer. E é fácil: recuso-me a conhecer a criatura.

Em tempos que já lá vão, havia um grupo de amigos meus qu frequentava um bar perto de minha casa. O bar era simpático, a música não era estridente, os frequentadores eram da nossa idade e os empregados atenciosos (passados quarenta anos, dois ainda por lá andam, sendo que um até é o gerente).

A este grupo chegou uma “rapariga” da nossa idade (entre os 35 e os 40 anos) que era inteligente, boa conversadora e, no campo profissional dela, uma estrela em ascensão. Tinha porém, a meus olhos, um defeito: adorava apresentar pessoas umas às outras. 

Eu bem lhe dizia que não se devem misturar grupos, que nem todos os meus amigos eram para ali chamados, que quando apareciam eu me sentava com eles a outra mesa, enfim, explicava-lhe que nem tout le monde est, tout le monde est gentil, para parafrasear o título de um filme da época.

Todavia ela era uma autêntica cruzada do cruzamento forçado de pessoas. E não resistia. Ao primeiro bicho

careta que despontava à porta, ela, num guincho de puro prazer, convocava o recém chegado e começava a oficiar de “entremeteuse” (fui eu que exasperado num dia demais apresentações a crismei assim explicando-lhe, tintim por tintim,o significado pouco abonatório da expressão. Nem assim desistiu. 

Portanto, quando eu a via desenfreada em sinalefas para desconhecidos, desandava porta fora antes da penosa fase apresentadora. 

Estas balivérnias vem porque hoje, li uma entrevista de Balsemão ao Público onde ele confessava o seu pouco ou nulo apreço por três criaturas, uma morta e duas vivas e ainda a rabiar. A saber, o engenheiro Eurico de Melo que foi ministro um par de vezes, homem da indústria têxtil, muito do norte, afamado jogador de sueca (e nessas sessões de jogatana, ele e uns amigalhaços faziam política à fartazana visando quer o próprio Sá Carneiro, muito o Balsemão e, regra geral a ala mais social-democrata do PPD); depois o dr. Cavaco Silva que provavelmente não joga cartas nem nunca se engana e finalmente o dr. Rebelo de Sousa, inventor de factos políticos, ex-frenético presidente do PPD onde a sua truculenta actividade não deixou traço nem fruto, ex- comentador televisivo e actual Presidente da República. 

Não nego a nenhuma destas individualidades, inteligência, trabalho ou apego à Pátria imortal mãe de heróis, santos e génios caseiros. No entanto, por fas e por nefas, nunca fui à missa deles. 

Costuma dizer-se, tolamente que gostos não se discutem mas esta ojeriza vem de longe, como a fama do licor beirão. E os gostos, claro que se discutem...

Ao engenheiro Melo ainda o vi uma vez, por altura de uma negociação colectiva em que eu apoiava juridicamente um sindicato. Suponho que não trocámos qualquer palavra, a criatura não me fez nenhuma descortesia mas não fui à bola com a cara (e o resto) dele. Dos restantes nada. Nunca os vi de perto, não me apetece vê-los e é mais que provável que nunca me cruze com eles. A idades respectivas e o viver longe dão-me alguma garantia que os nossos caminhos nunca serão secantes. 

Devemos frequentar um jardim onde los senderos se bifurcan continuamente, se é que me recordo do Excelente Jorge Luís Borges, homem que suscitou ampla admiração mas que atraía a pertinaz má vontade de uma boa dúzia de bonzos literários. Em boa verdade, estes passaram, e Borges continua no céu da literatura mais brilhante que mil novas mas isso é outro falar. 

Sempre tive, desde a “ala liberal” pedrada no charco viscoso do final do Estado Novo, simpatia pelos que se opunham muito ou pouco (mas que se opunham) ao bunker salazarento. A partir desta entrevista, verifico que, mesmo radical naquele tempo, algum bom senso teria, tive. Cinquenta anos depois, a simpatia mantém-se mesmo se nada me faça dar um passo para conhecer o homem. Todavia, não daria às de Vila Diogo se a minha antiga e perdida amiga tentasse apresentar-nos.

O que só por bambúrrio ocorreria.

 

(por vezes os "inimigos" dos meus "inimigos" podem ser meus amigos)

    

   

liberdade vigiada 121

d'oliveira, 30.08.21

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Liberdade vigiada, 121

“Tudo vai pelo melhor...”

mcr, 30 de Agosto

 

Permita-se-me dar, como título, a primeira parte de uma citação do dr. Pangloss, mestre de Cândido, segundo Voltaire.  

A frase inteira, verdadeiro manifesto do citado mestre filósofo, eminente introdutor da metafiso-teologo-cosmolonogologia, continuava assim  “no melhor dos mundos”.

Eu, leitor antigo e devoto de Voltaire, tendo-me justamente iniciado ainda rapazola com o “Cândido”, apesar de ser optimista esforçado, sempre tive a ideia que neste mundo nem tudo são rosas e que uma pitada de pessimismo permite evitar desilusões e, eventualmente, ter uma visão mais certeira da realidade.

Vem tudo isto a propósito do congresso do PS realizado, caso não saibam ou não tenham dado por isso, este fim de semana.

Congresso partidários em Agosto dão sempre azo a desatenção. Está-se em plena “silly season”, as pessoas estão mais interessadas na temperatura da água do mar, nos romances estivais narrados pela imprensa cor de rosa, ou noutro tema candente. Os meandros de um congresso, as subtis manobras de bastidores, a análise das votações, do sobe e desce de certas figuras no xadrez partidário são matéria obscura, ingrata, movediça que requer demasiado esforço sobretudo nos tempos de calor.

Quando  o congresso é de um partido no poder, a tarefa é ainda mais difícil porquanto das duas uma: ou há a previsão de grandes modificações ou não. No caso vertente, nada, rigorosamente nada de previa a esse nível. Nem era de prever, a um mês das eleições autárquicas. Os partidos terão muitos defeitos mas não se dão ao luxo de manobras suicidárias na iminência de prélios eleitorais.

Quando isso acontece, trata-se de agremiações amadoras, pequenas, descartáveis que não pesam no panorama político. Tais formações podem dar-se ao luxo da polémica, sobretudo da polémica bizantina que, de todo o modo, apenas interessa aos seus reduzidos militantes que não tem preocupações de gestão política seja do que for, sindicatos, juntas de freguesia, câmaras municipais, lugares no parlamento. Como não tem isso, também não tem a gesto de empresas públicas, agências estatais e assimilados.

Portanto, não se esperavam deste magno ajuntamento novidades de maior, sequer novidades, aliás. O que aconteceu, malgrado a tentativa de televisões e jornais de enfatizar diferenças, rivalidades, novidades.

A menos que se considere novidade a filiação da dr.ª Temido, que assim se protege de algumas brotoejas políticas dada a sua condução dos assuntos de saúde, a sua visão ultra-centralista do SNS, o seu estado de negação perante a evidência da existência crescente de privados no sistema de saúde. A senhora Temido poderá ter alguma vez afirmado que estava farta, que queria voltar a ser “a Marta” (lembremos José Mário Branco e a sua Marta que só irá com “o maganão... dentro de um caixão”) mas a verdade é que com esta entrada radiosa na família socialista deixa a ideia que está pronta  para “mais uma voltinha, mais uma viagem” até porque “menina não paga” se é que me lembro desta lenga-lenga.

Havia um tabu, diz-se. Que era o da sucessão de Costa. E apontavam-se presuntivos herdeiros desde o famoso inimigo dos banqueiros alemães (cujas perninhas até tremeriam...!!!), Pedro Nuno a duas senhoras (Mariana Vieira da Silva, Ana Catarina Mendes) que, pelos vistos o tempo é das mulheres mesmo se elas apenas representam um terço dos militantes (ou um pouco menos, nem sei).

Em suma os comentadores, os jornalistas, alguns círculos de ociosos tentaram encontrar um pouco mais de azul , um pouco mais de sol no monótono acontecimento. Em vão.

A época é de cerrar fileiras e lá temos um quarteirão de amigos do sr. Adrião (uma espécie de opositor de Sua Majestade que o país ignora e os militantes idem, aspas, aspas) votados na lista única do generoso líder que assim se vê coroado por noventa e muitos por cento, número norte coreano  agora muito em voga por cá.

Que o sr. Adrião não é um Tino de Rans já se sabia. Faltam-lhe espontaneidade, berço, convicções. De resto, só existe nestes momentos congressionais...

Mas pior, bem pior do que esta morna reunião,  este mormaço político.

António Barreto, no último sábado (Público, p.3) apontava ao PS uma série de faltas, desde programáticas até ideológicas, um fatalismo pouco criativo  que não tem substância cultural, orgulho ou compaixão). Em boa verdade, e dado o estado vegetativo da oposição, nem precisa. Basta-lhe o poder para mobilizar as energias de uns centos de militantes mais em vista, a falta notória de credibilidade política  da Direita, e a complacência (por fraqueza manifesta) da Esquerda a que se encosta. Chega a ser penoso, ouvir o sr. Jerónimo de sousa, regatear na praça pública apoios que finalmente concederá depois de umas migalhas  que ele transformará obviamente em vitórias do “povo”. O secretário geral do PC sabe que o seu partido está desde há muito em perda. Em perda lenta mas segura. E nisso apenas difere de antigos e quase inexistentes congéneres europeus por a queda desses ter sido muito mais abrupta. A massa militante do PC envelhece como o país (mais de 50% dos militantes está acima dos 65 anos!)

Aliás o mesmo fenómeno se passa com o PS. Entre os 26 e os 40 anos são 13300. Em contrapartida, acima  dos 65, passam ligeiramente dos 22.000. E 50& anda entre os 41 e os 64 anos. Desconheço os números dos outros partidos mas basta-me este para me apoquentar um pouco. Aliás, o número total de militantes não chega aos 75.000 o que diz muito da penetração do partido entre os portugueses. E note-se que estes números (Público,28 de Agosto, p.8) são números de um partido que está no poder desde 2015...E que por isso pode distribuir benesses a quem tenha o cartão e, eventualmente, as quotas em dia.

Tudo visto e respigado, fica-se com a sensação que no PS há um certo estado de espírito “lorquiano” no pior sentido da palavra. Refiro-me claro, a um frase de “Bernarda Alba”, uma peça que pode não ter a a poesia e a  força de “Assim que passem cinco anos”.

Quando tudo se desmorona à sua volta a velha matriarca Bernarda grita num paroxismo de raiva “en esta casa no pasa nada!” exactamente o contrário do drama terrível que atinge aquela família.

Enfim foi um fim de semana de Agosto, sem festas nem romarias, sem festivais de Verão (mas com uma vitória, outra!, da task force :  já teremos atingido 85% de população vacinada. Um prodígio de logística e de trabalho insano e de dedicação extraordinária de centenas ou milhares de enfermeiros e outras profissionais anónimos de saúde.

(não quero ser cruel mas fiquei com a ideia que a transferência de Ronaldo teve mais ouvintes e mais interessados do que o vago monólogo socialista.

Sinal dos tempos!

E do país...)

 

 

 

liberdade vigiada 119

d'oliveira, 28.08.21

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Liberdade vigiada 119

“este parte, aquele parte...”

mcr, 28 de Agosto

 

 

Sirvo-me do poema de Rosalia, musicado pelo Zé Niza, e cantado pela primeira vez por Maria João Delgado, na altura minha mulher, excelente actriz, boa voz, animosa, corajosa, lindíssima e inteligente. Estávamos a tentar montar um espectáculo teatral sobre “Castelao e a sua época” com encenação de Ricardo Salvat em 1969.

Claro que a Censura, a polícia, a crise de 69 e a fama cada vez mais “sinistra” do CITAC (Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra), tudo se conjugou para que a peça nunca chegasse ao palco, mesmo se partes dela tivessem sido mostradas durante as noites de brasa das guerras estudantis.

Depois, o Adriano (também do CITAC) pegou na cantiga e tornou-a conhecida por toda a parte.  A dupla Adriano/Niza (também do CITAC, claro) deixou um rasto luminoso na música portuguesa. Um rasto de heroísmo, dedicação, qualidade que ainda se mantém.

 

Se eu peguei neste primeiro verso é, infelizmente, po outra causa. Morreu o Rui Oliveira, um amigo mais velho, desde meados de 64 mesmo se nós só nos tivéssemos dado com mais intimidade, depois do 25 A.

O Rui Oliveira era engenheiro civil e arribou ao Porto, depois de algumas desventuras políticas no tempo de estudante. Como era de Esquerda e, também ou sobretudo, um excelente profissional entrou na empresa “soares, Magalhçaes e Delgado” onde pelo menos o primeiro e o terceiro sócio tinham já um percurso de resistência conhecido e reconhecido. Jorge Delgado passara mesmo pelo Tribunal plenário, apanhara os costumeiros dois anos de prisão mais medidas de segurança. Como já era conhecido como engenheiro cumpriu a pena numa espécie de campo prisional em Trás os Montes onde estava a ser construída uma cadeia civil. Delgado penou portanto a sua condenação em Izeda, uma aldeia de Mogadouro. Tinha a seu cargo, pelos vistos, a tarefa de garantir tecnicamente a obra. A mulher aa filha passaram ali, também, o tempo de prisão do Jorge que mais tarde, como calcularão pelo nome se tornaria meu sogro.

O Rui Oliveira terá entrada na empresa mais tarde mas rapidamente conquistou um nome como engenheiro e outro, mais perigoso, como militante oposiocionista.

Todavia, e curiosamente, não o conheci nessas vestes mas apenas como amador de Jazz.

De facto, na Associação Académica criou-se nos anos 60 uma secção de jazz e nela um quinteto  onde pontificavam o Niza, sempre ele!, Daniel Proença de Carvalho, José Cid, Rui Ressurreição e Joaquim Caixeiro.

Este grupo, a quem devo os meus primeiros momentos de jazz ao vivo, realizava umas Jam-sessions ma AAC e a elas comparecia um jovem casal (de todo o modo bem mais velho do que nós) que descobrimos vir do Porto.

Era o Rui Oliveira e a primeira mulher, uma artista plástica talentosa e de que perdi o nome.

Já advogado no Porto, voltei a encontrar o Rui desta vez animador de uma cooperativa cultural da oposicrática e aí reatei relações, desta feita, mais fortes sobretudo porque ele sabia de um par de prisões minhas ,a última das quais recentíssima.

Com o 25 A, acabámos por nos juntar no MES, uma aventura esotérica, absolutamente condenada ao fracasso, dada não só a concorrência desenfreada na margem esquerda da política do momento mas também , e muito, pela confusão programática e estratégica em que, cedo o2movimento” caiu. Ao fim de cerca de uma no lá saímos, mais velhos, mais desiludidos, mais cansados e talvez mais experientes.

Depois, lá fomos intervindo, individualmente em diversas iniciativas, seguindo de perto a tentativa de Jorge Sampaio e amigos mas, no caso do Rui, pelo menos, sem cair no PS.

E ao longo de todos estes anos lá nos encontrávamos , algumas vezes profissionalmente. De facto a “soares Magalhães e Delgado” foi a empresa que a Delegação Regional de Cultura do Porto  encontrou para uma série de obras  na sede e sobretudo no restauro da “casa Queimada” dos Távoras onde se instalou primeiramente o efémero Museu Nacional de Literatura e depois a delegação do IPPAR. E era o Rui o nosso interlocutor, ou melhor o meu interlocutor a partir do momento em que integrei a pequena equipa da DRN.

Ainda trocámos um par de discos de jazz e obviamente nos encontramos sempre que ao ANCA (Auditório Nacional Carlos Alberto) vinha uma formação de jazz. E vieram algumas  graças a uma colaboraçãoo excelente com o consulado americano enquanto este durou no Porto.

Agora, pensando bem, já não nos víamos há quatro ou cinco anos.

Ontem, o Zé Dias, uma espécie de notário implacável do antigo MES (e meu colega e companheiro de aventuras em Coimbra (chegámos mesmo -em 1970-) a pertencer aos mesmos corpos directivos da AAC) mandou-me a notícia da morte do Rui. Não o poderei acompanhar à sepultura pois estou longe mas nem por isso quero deixar aqui esta nota.

Esta geração, ou estas, a dele e a minha, estão a desaparecer com naturalidade e rapidez. É a lei da vida. Ou da morte, tanto faz.

Dele, com toda a justiça, pode dizer-se que foi um resistente e um cidadão exemplar. É mais do que muitos, a maioria, a imensa maioria que ainda permanece. Didn't he ramble?
Didn't he roam?
Didn't he wander
So far from home?
Didn't he teach us?
Didn't we learn?
Didn't he reach out
Beyond all return?
Didn't he ramble?
And didn't he stray?
Didn't he wander
So far away
?

Até sempre, Rui, caro amigo e camarada. 

*na vinheta: um funeral em New Orleans

o excerto em inglês é de uma tradicional canção também usada em enterros na mesma cidade.

liberdade vigiada 113

d'oliveira, 22.08.21

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Liberdade vigiada 113

Encarar a verdade

mcr, 22 de Agosto

 

 

Os jornais noticiam a tomada de Mocímboa da Praia (cidade do  litoral a norte de Moçambique) por tropas ruandesas ( na totalidade mil homens destacados para o país). Pelos vistos, a operação durou escassos dias e foi coroada de êxito.

Fica por perceber para que serve o exército moçambicano. Se é que serve para mais alguma coisa do ser a guarda pretoriana do regime da Frelimo...

Um exército que arrasta os pés para cumprir o acordo de inserção de ex-tropas da Renamo nos seus quadros permitiria pensar que não precisa de mais efectivos.

Ora um bando de rebeldes  sem preparação militar deu-se ao luxo de ocupar a uma cidade costeira importante durante vários meses sem reacção de qualquer espécie.

Isto significa que milhares ou dezenas de milhares de cidadãos do norte de Moçambique (por enquanto apenas na província de Cabo Delgado) estão à mercê de ,eia dúzia de “bandidos armados” que põem e dispõem a seu bel-prazer da vida e segurança dos moçambicanos.

Moçambique entra, assim, de pleno direito, no clube dos países falhados, dos países incapazes de assegurar os mais elementares direitos dos seus cidadãos!

A afirmação não é minha mas de outros, bastantes, comentadores, entre os quais Miguel de Sousa Tavares mo último “Expresso”.

E junta-lhe mis alguns Estados desde a Somália à Líbia ou à Guiné Bissau.

Custa-me estar de acordo, pelo menos no que toca a Moçambique, uma terra onde vivi três anos. Conheci (conheço) alguns dos seus dirigentes ou ex-dirigentes, fui amigo de alguns e digo fui porque nunca mais os vi e quarenta/cinquenta anos depois é tempo demasiado para me reclamar de qualquer laço de amizade ou camaradagem.  

De todo o modo, desde que as incursões islamistas radicais começaram, sempre me surpreendeu (e meço as minhas palavras) a facilidade do seu progresso, a falta de resistência das forças militares e/ou policiais.

Agora, com a chegada de tropas estrangeiras, verifica-se que os insurrectos são batidos sem especial dificuldade e que as populações poderiam, e deveriam, ter sido protegidas.

Não o foram. Alguém é responsável. Dado o peculiar sistema político moçambicano, é ao Governo e ao partido que o suporta, que devem ser pedidas responsabilidades.

Tentar explicar o desastre iminente n Norte com outras razões é apenas tentar enganar o povo moçambicano e a comunidade internacional. O resto é pura paisagem...

 

 

liberdade vigiada 112

d'oliveira, 21.08.21

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liberdade vigiada 112

conversa inacabada

mcr, 21 de Agosto

 

Pelos vistos, o Afeganistão ainda é notícia. Por cá, o sr. Jerónimo de Sousa que, visivelmente, não é um historiador e provavelmente padece de perda forte de memória, entendeu afirmar que os americanos e a NATO tinham registado uma derrota histórica naquela parte do mundo.

Há menos de 30 anos, teria o actual Secretário Geral do PCP, quarenta e tal anos, o Exército Soviético, acossado por guerrilhas afegãs, começou uma pouco gloriosa retirada do Afeganistão. Foram mais de 100.000 soldados acompanhados por cerca de 300.000 afegãos um exército que também se liquefazia a casa dia que passava.

A intervenção soviética no Afeganistão durou dez anos e no que respeita a episódios bizarros foi ainda mais pródiga do que a americana. Foram tropas especiais soviéticas que liquidaram um primeiro ministro, aliás, comunista, para o substituir por outro igualmente militante mas pertencente a uma facção rival. O PC afegão teve ao longo da sua conturbada existência duas facções que se digladiavam a ferro e fogo. Convém recordar que a “influência” soviética no Afeganistão vinha desde os tempos de Dataline (1947) e que nunca deixou de intervir directa ou indirectamente no país.

Conviria, pois, a alguém que assistiu na primeira fila a este sórdido episódio militar, que envolveu continuamente tropas especiais russas e serviços secretos igualmente russos, que substituiu manu militari dirigentes “democraticamente” eleitos, sem falar nos executados, à boa e velha maneira, conviria, dizia eu, alguma contenção. E algum respeito pela verdade dos factos. Claro que o senhor Sousa pode sempre dizer, e no íntimo pensará assim, que a retirada ominosa se deveu a Gorbatchev que, como se sabe, não passa de um traidor e de um coveiro da heroica URSS que ruiu sem grande estrondo em poucos e acelerados meses, quase sem uma voz que se levantasse em sua defesa.

E recordar que nada fazia prever que a URSS se interessasse por este desgraçado país que, ainda por cima, tinha governos, como se disse, notoriamente influenciados por si, amigáveis.

Pelos vistos, esta história pregressa não ocorreu ao sr Jerónimo de Sousa. Perda forte de memória ou apenas falta evidente à verdade?   

 

Ainda sobre este mesmo assunto, ouve-se agora, em várias partes europeias, um melancólico “kaddish” sobre as mulheres afegãs que estarão (e estão, seguramente) em risco de ver ser imposta a burka, negada a educação superior, e cerceados os seus direitos.

Convinha explicar que, mesmo se isto é verdade (e não duvido que seja) é mínima a percentagem de mulheres que, de facto, estavam, “ocidentalizadas” (uso o termo á falta de melhor) e que serão eventualmente perseguidas. A enorme maioria da mulheres afegãs, vivendo fora dos centros urbanos importantes, nunca despiu a burka ou teve hipóteses de aceder aos pequenos privilégios das suas congéneres mais educadas.

E lembraria, também, que, em plena Europa, e em redor da principais cidades ocidentais, há dezenas ou centenas de milhar de mulheres muçulmanas que ainda usam os mais variados véus islâmicos, incluindo-se nessa multidão muitas europeias de origem cristã que se vincularam ao Islão. Até em Portugal, onde a presença de muçulmanos é insignificante se vêm “nicabs” e outros artefactos do mesmo teor. E note-se que, por cá, oficialmente é o Islão moderado que predomina...

 

E, finalmente, continuo na minha: um país que se desmorona em oito dias, cujo exército se rende sem um tiro, parece provar à evidência que legitima a insurreição taliban. Ou que repele qualquer contaminação de valores ditos ocidentais, civilizados, democráticos.

E, pelos vistos, demorou algum tempo até os americanos que eram quem morria e quem pagava a ocupação, percebessem que ninguém os queria ali. Nem mesmo as almas caridosas que, por essa Europa fora, choram as “irmãs” afegãs, depois de antes, poucos dias antes criticarem com aspereza a presença americana, a “ocupação” imperialista, colonialista e capitalista.

Em que ficamos?

 

liberdade vigiada 100

d'oliveira, 08.08.21

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Liberdade vigiada 100

Verão sereno

Mcr, 8 de Agosto

 

Em Portugal, durante o Verão, tudo para, ou quase. Falo de política, evidentemente e não do que, eventualmente, se passará no mundo, neste momento discreto, do jet set.

Tirando a extraordinária convalescença  (ou mesmo doença, vá-se lá saber) do senhor Espírito Santo, coitado, parece que além de arruinado (mesmo se de Mercedes e motorista com a sempiterna gravata azul claro) estará doente. Tem perturbações de memória e medo, muito medo, do covid. Supõe-se que estará vacinado com todas doses requeridas pois viajou para a Sardenha mas, mesmo assim, não achou útil ou sequer interessante, aparecer no Tribunal onde está a ser julgado. Deve ser aborrecido ter de se sentar no banco dos réus mesmo se, de certeza que lhe arranjariam uma cadeirinha confortável dada a sua idade. Diz-se que também foi alegada a sua prodigiosa perda de memória  devido a uma qualquer demência senil, Alzheimer ou coisa parecida. De todo o modo não pôs os delicados pés na sala de audiência nem sentou o sim senhor na já referida cadeira. Ou banco. Também é verdade que em questão de bancos ele preferirá o seu, o que aleivosamente lhe tiraram depois de anos de gestão cuidadosa e sempre defendendo o interesse dos depositantes que, volta que não volta,  uivam pelos seus depósitos desaparecidos. É provável que, a juntar às outras maleitas, o senhor Espírito Santo esteja também surdo que nem um portão de quinta pelo que não consegue ouvir as amabilidades dos ingratos depositantes que o não poupam nem à extremosa mãezinha dele, por via de uns desentendimentos quanto ao destino das poupanças dos primeiros.  

De todo o modo eis que um atrevido turista português, sempre armado de telemóvel, o foi pilhar a passear-se tranquilamente na Sardenha, eventualmente na costa Esmeralda, discreta e luxuosa zona turística cujos preços são a mais eficaz barreira ao turismo de massas.

Claro que o honrado ancião pode ter ficado num alojamento local, mesmo se esse tipo de hotelaria seja raro naquela zona. Como as pensões e os hotéis de menos de quatro estrelas. Alguém afirmou que estaria numa “vila” de um amigo rico e generoso. Como se sabe, isto de amigos ricos e generosos é  algo que entrou fundo em certa sociedade portuguesa.

Eu que sou um provincial nunca disfrutei desse género de amizades, excepção feita de um casamento aristocrático-oligárquico a que compareci como convidado dos noivos que tinham sido meus colegas num ciclo de estudos do Curso Superior de Direito Comparado. Aí sim, dormi num quarto que era maior que muitos T3 que por aí se vendem, no 8em e com vista desafogada para o Parc Monceau. Enfim, estava hospedado pelo avô da nubente num “hotel particulier” digno da melhor tradição da” velha” riqueza parisiense.

Também é verdade que não sou banqueiro, muito menos político e chefe de Governo, de resto nunca tive qualquer cargo político electivo ou não, um desastre e uma vergonha para um filho família cujos ancestros exportaram vinho do Porto!

Portanto, a Sardenha! Para criatura doente, fraca, incapaz de ir a tribunal, com a memória num farrapo, convenhamos que é obra! Todavia, nem isto, que noutra altura serviria para três ou quatro dias de editoriais, comentários, cartas de leitores, furibundas “defesas da hornra” etc., nem isto, dizia, deu para alegrar os jornais. Ou a televisão!

Vê-se que em Portugal a indignação morre à míngua, que a velhice de um patriarca com nome de pombinha sagrada, ainda é respeitada. O ex-banqueiro a passear-se na Sardenha, terra que dantes era a terceira maior produtora de bandidos italianos, sobretudo especialistas em raptos, indústria que durante séculos ofereceu algum refrigério aos pastores de Aspromonte  (na Calábria) e aos pobres pastores de cabras da Sardenha. O segundo posto da indústria raptora italiana é a Sicília, claro.

Pois, ou os costumes mudaram , e muito, ou é verdade que o senhor Espírito Santo está sem cheta. Ninguém se dignou raptá-lo! Isto se ainda houver quem se dedique a esse ofício ...

Em Berlin, no ano glorioso de 1970, tive no “Goethe Institut”, um amigo sardo. Conheci-o logo na primeira aula, quando ouvi alguém exclamar à passagem da professora “ Che culo!”. Tinha de ser pessoa de bem e era. Foi ele quem me iniciou na leitura de San Antonio onde aprendi mais francês do que em qualquer outro autor (incluindo Prévert!). O raio do sardo também me ensinou umas receitas de spaghetti e tinha por alvo estabelecer-se com um hotel restaurante. Para tal trabalhava e viajava para aprender línguas (a Alemanha era já o seu quarto ponto de aprendizagem; o quinto foi a Rússia!, sabe-se lá porquê, terá adivinhado a queda do Império vermelho com quase vinte anos de antecipação?) Perdi-lhe o rasto, burramente pelo que não posso agora informar-me devidamente do novo curso do crime na sua região natal.

Ao que li, ultimamente, os advogados do ex-banqueiro, injustamente perseguido pelo MP, pelo juiz Alexandre e pelos depositantes ingratos, terão requerido (ao citado juiz Alexandre)a devolução de uma caução de alguns milhões de euros para , alegadamente, pagarem não sei quê e assim o seu constituinte se safar de um qualquer outro julgamento... Nem isto fez acordar os dorminhocos veraneantes . Arre!

 

* na vinheta: uma vista da costa esmeralda. Barcos de pesca? De piratas? Responda quem souber.

O título do folhetim remete para "Verão violento" um maravilhoso filme de Zurlini com a maravilhosa eleonaora rossi Drago, ai meu Deus!...

liberdade vigiada 99

d'oliveira, 07.08.21

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Liberdade vigiada 98

Ora aí está um ditador

mcr, Agosto de 2021

 

Vi, na televisão com estes que a terra há de comer (se não foram comidos antes pela degenerescência macular que me obriga mensalmente a levar com uma injecção em cada olho) o General De Gaulle comentar um ataque de que era vítima recorrente. Alguém, alguns, afirmava que ele queria ser o ditador da França. De Gaulle que tinha bastante humor perguntava na televisão (exercício em que era mestre) coo é que aos setenta e muitos anos lhe viria à cabeça tornar-se ditador. E não o era, não o tentou, saiu duas vezes do poder tranquilamente e foi, é, a figura maior do século XX francês.

Também vi, na televisão, o vice almirante Gouveia e Melo referir-se à vacinação do grupo etário 12-15 anos (não sou médico, não ou especialista de nada, mas enquanto cidadão preocupado inclino-me a considerar essa vacinação proveitosa. Aliás, tenho bon exemplos em vários grandes países europeus, mormente a França e a Alemanha) Se a memória não me falha o que o o Vice Almirante disse foi isto: Seria bom que as autoridades competentes definissem rapidamente se sim ou não se avança com o processo para que o plano possa ser rapidamente posto em execução antes do começo das aulas.

OO mesmo e até com mais firmeza foi dito pelo Pesidente da república, esboçado clarissimamente pelo Governo pela voz do Primeiro Ministro e secundado por vários, bastantes, quase todos os dirigentes políticos. Da parte da classe médica, é verdade que as opiniões se dividem mas, nos últimos tempos parece ser maior o número dos que a defendem do que o fos que a recusam. A última personalidade que ouvi, dr.ª Naria do Céu Mchado, pediatra e figura incontornável da Saúde nos últimos trinta/quarenta anos, avançou, ontem, a ideia de se dar pelo menos a primeira dose. E como disse, em vários países da Europa começaram já a inocular as crianças desse grupo.

 

Perante isto, a jornalista Ana Sá Lopes, num editorial virulento, vem denunciar o marinheiro afirmando que ele “tenta pressionar a DGS”. E junta mais uns comentários do estilo “O vice almirante está apaixonado por si próprio” (sic) mesmo se antes afirma que ele “é altamente competente” se bem que “ao contrário de que “algumas pessoas parecem acreditar” ele apenas trata da logística da vacinação (“uma coisa que devemos ào SNS e não ao vice almirante”. ) o editorial prossegue num tom semi-jocoso semi acusador usando frases soltas de uma entrevista (e todos nós, mesmo não tendo a inteligência acutilante de ASL, sabemos bem como isso dá lugar as mais tristes trapalhadas) desde ele ter dito e bem (se é que o disse assim) que em combate tenta ser o mais sanguinário possível coisa que pelos vistos arrepia o meigo coração e demais vísceras da jornalista para quem, eventualmente, o combate é um jogo da apanhada.

Depois, salta destas afirmações e da declaração inicial sobre a vacinação para perguntar se o país tem outra vez um “Conselho da Revolução”. E, de seguida, refere o facto do militar usar farda mesmo se estará farta de saber que ele usa o camuflado para não se evidenciar num grupo onde abundam militares dos três ramos das forças armadas. Ora o camuflado é o único uniforme comum, mas isso deve interessar pouco a famosa autora de “vanessa” um tema onde, e digo-o sem ironia, ela se sentia perfeitamente à vontade.

Eu percebo que, o  vice almirante ganhou a pulso uma guerra que de início parecia perdida e confusa. E ganhou-a a um par de janotas que sempre cavalgaram os altos postos da função Pública sem que, da sua acção, se tivesse até agora, verificado efeitos de monta , bem pelo contrário. É verdade que o homem é competente. É verdade que é de poucas palavras. É verdade que é assediado diariamente por jornalistas que, fartos da DGS e da sua máxima representante que deve ter uma licenciatura em tergiversação e um mestrado em dizer muitas palavras sem delas se extraírem quaisquer dados úteis, procuram alguém que a secas lhes diga como é que estão as coisas.

E estão bem. Hoje, exactamente no dia em que ASL assina o seu verrinoso e tonto editorial soube-se que 70% dos portugueses já tem pelo menos a primeira dose. Ou seja, houve uma antecipação de dois dias, o que não é desprezível, excepto, claro para as Vanessas deste mundo e as suas sósias nos vários campos de actividade, jornalismo incluído. 

Eu, que não sou exactamente um admirador da coisa militar (mesmo se reconheça algumas virtudes em muitos dos que vestem a farda e a honram) tenho algum respeito e admiração pelo almirante, aliás vice almirante. O homem que não é o SNS mas apenas (e já basta) o coordenador da equipa da logística da vacinação tem mostrado saber fazer o seu trabalho, impor disciplina, explicar claramente ao que vem e o que quer.

Eu, no lugar dele, longe vá o agoiro, também quereria ter uma ideia precisa do que vai acontecer quanto a miudagem dos 12 aos 15 anos. É que a terem de ser vacinados há que preparar tudo. E depressa! E bem. Para poder chegar a dia da abertura das escolas sem sustos, sem temores, calmamente. Isto, por muito que pese a ASL não é o jogo do chinquilho. Há dezenas de milhares de pais e centenas de milhares de familiares que precisam de ser atempadamente informados, prevenidose ganhos para esse esforço da vacinação.

E digo isto, mesmo não tendo filhos em idade de serem vacinados. A minha gente já está toda vacinada, apenas a pequenada está livre da picadela por serem demasiado pequenos.

A DGS será muito respeitável mas já zigzaguiou várias vezes e já disse, desdisse, voltau a dizer e errou um par de vezes. É claro que perante algo de que já quase não havia memória, os erros são quase inevitáveis. É verdade que os responsáveis políticos (mesmo os que foram votados, coisa de que o vice almirante não pode gabar-se por ter outro tipo de carreira) já quiseram tudo e o seu contrário. Jornalistas, opinantes, bloggers, o maluquinho que grita na rua por Natal, Natal, todos já falaram do covid. Muitas vezes sabendo pouco ou nada. Mas se apenas falássemos do que realmente sabemos que silêncio sepulcral cairia sobre este mundo. ASL. A este propósito, poderia referir o nome por que a tropa é conhecida em França “la grande muette” para mandar um par de zagalotes ao almirante. Isto, claro, no caso de saber francês, língua muito em desuso na nossa comunicação social.

Estamos em Agosto. A praia “está a dar” pouco. As notícias nacionais estõ a banhos, ausentes em parte incerta, percebe-se a jornalista aflita com um editorial por escrever. As metafóricas e queirozianas botas do rapaz da tipografia chiam no corredor à espera do seu metafórico papel. Vai daí, à falta do bey de Tunes, eis que um almirante, vindo do mundo dos submarinos. Alto e fardado  está mesmo a jeito para ouvir duas e levar três. E fica bem, oh se fica, enfrentar de peito às balas, digo aos torpedos, um militar, seja de que ramo for. O que é preciso é que seja conhecido. E Gouveia e Melo é-o, sem dúvida. Mais do que a autora da Vanessa mas isso compõe-se com duas zaragatoas jornalísticas...

Todavia, convém sossegar a jornalista. Não, o Conselho da Revolução não voltou. Nem o fantasma de Otelo, ou o de Carmona, sequer o de D Nuno Álvares Pereira, agora santificado.  E mesmo bem mais novo que De Gaulle, homem da arma de Cavalaria, o marinheiro Gouveia e Melo não parece entusiasmado com a carreira de ditador nem sequer de conselheiro da revolução ou de membro dos “Soldados Unidos Vencerão”, ou militante tardio do Projecto Global

Ana Sá Lopes deu um tiro de pólvora seca no mimoso pé. Azares de quem tem de escrever um editorial à orna brisa de Agosto.

A vinheta recorda um excelente disco, de um excelente grupo e incidentalmente é uma homenagem ao almirante (aliás vice) que ganha claramente a guerra da paz e da saúde.