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Incursões

Instância de Retemperação.

Incursões

Instância de Retemperação.

O mar avança

José Carlos Pereira, 17.08.10
Regressado de uns dias de férias no Algarve, não resisti a dar nota do avanço do mar sobre as praias, colocando em causa apoios de praia e outras construções menos efémeras. Consequência ou não das alterações climáticas, esta foi uma realidade que me surpreendeu de um ano para o outro.
Frequentador assíduo da praia do Barranco das Belharucas, a seguir a Olhos de Água e no início da praia da Falésia, em Albufeira, constatei que as marés do Inverno passado terão roubado cerca de dez a quinze metros ao areal, o que se nota particularmente aquando da preia-mar. Como se vê nas fotos acima, a água quase chega aos toldos e aos bares. Só com a baixa-mar se pode gozar do imenso areal desta bonita praia.
Por aqui já me cruzei, em anos anteriores, com Cavaco e Sócrates e faço votos para que este avanço marítimo não lhes tenha causado incómodos maiores...

Madrid com Bacon

José Carlos Pereira, 26.02.09
Ir por estes dias a Madrid permite que nos reconciliemos com uma certa forma de viver a cidade. Madrid está nas suas ruas e bares, nas lojas e nas esplanadas. Não há horas de encerramento generalizado das lojas e, noite dentro, é possível ver os passeios cheios de gente. E não são só os turistas. São os madrilenos que vivem a cidade, frequentam-na, defendem-na. Também não se vê prédios a cair, mas sim uma recuperação continuada das fachadas e dos edifícios, pelo menos nas áreas nobres da cidade. É claro que não é alheia a esta forma de viver a cidade, ainda para mais na capital de um país perseguido pelo terrorismo, a permanente presença da polícia nas ruas, que aí está e se insinua na vida das pessoas, transmitindo-lhes tranquilidade.

Por outro lado, ir por estes dias a Madrid torna obrigatória uma visita ao Museu do Prado para ver a exposição de Francis Bacon, comemorativa do centenário do seu nascimento. Instalada na parte nova do museu, uma ampliação muito feliz projectada por Rafael Moneo, a exposição percorre a obra do pintor, falecido em Madrid em 1992, a evolução das suas técnicas e as suas obsessões sobre o homem e a natureza humana. Uma exposição que nos revela as facetas de um artista que marcou o século passado.


Na foto, uma das variações de Francis Bacon sobre o Retrato do Papa Inocêncio X, de Velásquez.

Representação em Faro (novamente segundo a imprensa cor-de-rosa)

José Carlos Pereira, 19.08.08
Na passada sexta-feira, uma delegação nortenha do Incursões, composta pelo signatário e pelo carteiro, mais os respectivos familiares, aproveitou a tradicional ida a banhos no Algarve para visitar Madame Kamikaze (L.P.) na sua bonita casa.

O espaço multifacetado (memórias/livros/exposições) promete mexer com a cidade de Faro e merece uma visita de quem se dirigir àquelas paragens do sul. Aí serão seguramente mais bem acolhidos do que na esplanada da doca de Faro, onde à meia-noite os clientes famintos se habilitam a levar um empurrão de um qualquer empregado para as águas da ria…

Representação em Sanxenxo (segundo a imprensa cor-de-rosa)

José Carlos Pereira, 09.08.08

O Incursões esteve ontem fortemente representado na praia de Areas, junto a Sanxenxo, pelos seus contribuidores MCR, d’Oliveira, carteiro e o próprio signatário destas linhas. Os dois primeiros têm aí residência permanente e receberam os segundos para discutir temas da actualidade local e internacional. Foram vistos em plena praia e, mais tarde, no renomado bar A Postiña, defronte de umas cañas, umas ensaladas e uns pescados para comer e picar. No dizer dos próprios, estava um belo dia e o Incursões assegurou assim a sua primeira missão internacional conjunta.

A foto permite ver as Rias Baixas desde Areas.

Postal de Tenerife

José Carlos Pereira, 09.08.08


As férias de 2008 começaram com uma viagem à Ilha de Tenerife, a capital das ilhas ocidentais do arquipélago das Canárias, que incluem La Gomera, La Palma e El Hierro. É uma ilha muito interessante, separada em duas pela cordilheira montanhosa do Parque Nacional do Teide, a montanha, de origem vulcânica, mais elevada de toda a Espanha, com 3.718 metros de altitude. Isso faz com que a ilha se divida entre a parte norte verde e húmida e a parte sul seca e árida. As praias do sul são as melhores, de cor cinzenta prateada. A norte, junto à capital Santa Cruz de Tenerife, existe uma praia artificial com areia branca vinda do…Sara Ocidental.

Entre os turistas que procuram a ilha predominam naturalmente os espanhóis da península, mas também marcam forte presença ingleses, alemães, portugueses, holandeses e os novos países do leste. Como um pouco por todo o lado, o comércio das bugigangas e dos recuerdos está nas mãos dos indianos e os chineses estão nas praias a oferecer massagens aos surpreendidos turistas.

Uma ilha que vale a pena visitar, com dois aeroportos a norte e a sul que facilitam a deslocação daqueles que procuram a tranquilidade e o descanso ou dos que preferem, pelo contrário, a animação nocturna e a movida local.
Na foto vê-se o Pico do Teide.

A Coruña

José Carlos Pereira, 05.05.08

A bonita cidade de A Coruña, assim mesmo, com a grafia galega, foi o destino que escolhi no fim-de-semana anterior, aproveitando a boleia do Dia da Liberdade, em Portugal.
Uma cidade cheia de vida, plena de actividade e que se estende entre as praias e o seu importante porto de mar, bem perto do Norte de Portugal. Almoçar na imponente Praza Maria Pita, a mulher que, segundo a lenda, se notabilizou na defesa da cidade na guerra contra os franceses, passear no seu casco histórico, deliciar-se com as fachadas das varandas envidraçadas que são um dos ex-libris da cidade, deleitar-se com o passeio marítimo, do Riazor até à Torre de Hércules, são algumas das muitas formas de deixar o tempo correr naquela cidade da Galiza, para além das tapas, do pescado e das cañas. Os apreciadores dos divertimentos nocturnos também têm muito por onde se entreter (e aqui não posso deixar de me lembrar de um fim de ano aí passado, não é caríssimo carteiro?).
Entre outros pontos de interesse, recomendo uma visita ao Domus, a Casa do Homem, um equipamento localizado junto ao mar e que inicia os mais novos, de forma muito interessante, no mundo do ADN, das células e da natureza humana.
A minha viagem coincidiu com um jogo Deportivo-Barcelona e lá tive de levar o meu ZP a viver a experiência de assistir ao vivo a um jogo da liga espanhola, uma das melhores do mundo. Estádio cheio, vibração total, novos e velhos, homens e senhoras, todos ao rubro. No fim, restaurantes e mesons cheios, tudo a “tapear” e a confraternizar. Um espírito de festa totalmente diferente do que se vive entre nós. Tão perto na distância, mas tão longe no espírito (e nos euros, já agora...).

Na foto, vê-se um monumento de homenagem aos fuzilados na guerra civil, debruçado sobre o mar, na zona das Adormideras. Aí perto está também a Casa das Palavras, um espaço que acolheu os restos mortais dos muçulmanos que morreram na guerra e que lhes presta homenagem.

Cafés e Tertúlias

ex Kamikaze, 05.12.07

Au Bonheur des Dames 95

d'oliveira, 23.10.07

Balada de Outono

Começou o Outono, não sei se vocês deram por isso, mas, desde ontem, o tempo refrescou, caiu uma chuva ligeira, nada de importante, um aviso breve, uma gargalhada do inverno que há-de vir, uma promessa de Outono maduro como o Maio que o Zeca cantava, isto hoje vai ser assim, conversa de bica aberta, quem não se sentir bem que desande, que eu, hoje, estou que nem um cuco: saiu o segundo disco do Adriano, choraminguei na esplanada ao ler as palavras do Zé Niza que até me lembrou um festival de jazz feito em Coimbra, nos anos 60, gente: nos anos sessenta!!! Vocês conseguem perceber isto? Uma cidade fechada, o penico das Beiras, diziam, e pimba, toma lá um festival de jazz feito por meia dúzia de malucos, entre eles o Zé Quitério, esse mesmo em que estão a pensar, grande Zé, para ali perdido a caboucar nos Gerais, o mesmo é dizer na faculdade de Direito, fomos colegas de estudo, se é que se pode chamar estudo àquilo que solenemente fazíamos com o mesmo entusiasmo com que arrancaríamos seis dentes duma assentada e sem anestesia. E connosco o João Amaral, companheiro e amigo do Quitério desde os tempos da pensão Julinha e o Zé Labaredas, de Letras que chegou a Coimbra e apresentou-se: chamo-me José Labaredas e sou do Couço. Ora toma que já bebeste! Um gajo do Couço, aldeia mítica, vila, ou lá o que é, um baluarte da resistência camponesa. E o Zé que se aboletou na república “Prá-kis-tão” vinha rua fora ter connosco à republica “Baco” a do Zé Q., aos gritos “térinho...Térinho!”, Jesus que tempo aquele. Mas eu ia no festival de jazz, com americanos e tudo, naquele tempo onde ainda nem o Cascais Jazz havia! E depois digam-me que aquilo não foi uma década de ouro... Digam se se atrevem. E entretanto o Adriano trinava como saberão os que compram estes discos, esta história viva e cantada de um país inteiro no exílio. Ele e o Zeca, claro aquilo foi um mano a mano durante anos, uma amizade e um companheirismo que pede meças a muito do que hoje por aí se celebra.
Década de ouro, digo, repito e assino por baixo. Década começada com a vitória eleitoral do Carlos Candal, primeiro presidente da Associação Académica eleito numa lista da “oposição” depois de onze anos de negrume salazaroide. Os presidentes desse período eram quase sempre pagos pelo ministério com uma tenças vagamente de assessores com outro nome, enfim funcionários leais e obedientes que se encarregavam de fazer a AAC funcionar como uma câmara de eco das palavras do senhor ministro da educação. Jesus que vomitório! Com o Candal foi um tal arregaçar de mangas que nem dava para acreditar. Subitamente o Palácio dos Grilos enchia-se de gente, as actividades eram tantas e tão variadas que era preciso organizar quase um horário para poder assistir não a todas que era impossível mas pelo menos às mais interessantes. Se eu quisesse pôr aqui, preto no branco, o nome dos colaboradores da AAC escrevia um “who’s who” da política portuguesa de 70 até hoje! E da cultura! E da ciência! (eu sei que isto de separar a cultura da ciência é uma burrice mas que querem, é ainda assim que se funciona e eu não escrevo só para dois ou três iluminados mas para quem quer que se chegue a esta honrada casa de pasto chamada incursões. E recebi já o suficiente número de cartas para poder orgulhar-me de ter leitores “tous azimuts” como dizia um célebre professor meu que adorava o mar mas não sabia nadar). Coimbra, nessa década, era uma canção como se diz numa balada qualquer e é verdade. Ainda éramos poucos estudantes, a consciência de grupo era grande, as famílias estavam longe, os tempos ainda não eram estes em que todos competem com todos, o dinheiro não abundava e as praxes (ai as praxes) estavam a dar o berro. Nem percebo, ou percebo demasiado bem como é que de repente, se vêem por aí , em qualquer terra onde haja ensino dito superior, uma cambada de imbecis, vestidos (normalmente mal) de capa e batina a armarem-se em doutores e praxistas. Mas quem é que disse a estes pobres de espírito que devem burramente chatear os caloiros? Em nome de quê? Da tradição? Mas fora Coimbra, que cresceu desmesuradamente, nunca houve terra onde a tal tradição tivesse qualquer sentido. E agora, um monte de rapazolas e raparigolas imbecis andam como catatuas atrás dum bando de caloiros a dizer larachas ordinárias, a rir pacoviamente das próprias pacovices, e a chatear o indígena. Porra, que regressão!
Tudo isto vinha a propósito do Outono, do segundo disco do Adriano que se chama “e o sol préguntou à lua”, meu Deus, uma canção açoriana que ouvi pela vez primeira (adivinhem) numa casamata em Caxias, cantada pelo Orlando Silveira Bretão (que já lá está, merda de vida, o Bretão ainda tinha tanto para dar) e pelo Germano Rego de Sousa que ainda por cá anda, saravah mano! Um abraço., e por mais alguns dos Açores (o Alçada e o Jorge Ormonde) presos também no decurso da crise de 62, e enviados para Caxias “por recomendação do senhor ministro da educação” ora toma até o palerma da educação mandava estudantes para Caxias.
É Outono, é já o nosso Outono, amigos e companheiros desse tempo, mas nós somos gente nascida nos anos difíceis não é qualquer mescambilha que nos abate, estamos aqui para as curvas, um pouco mais gordos, um pouco mais carecas, algum catarro, rugas, filhos, netos até mas cá estamos. De pé! Para o que der e vier! E sobretudo para lembrados daqueles anos, podermos ainda propor uma maneira diferente de ver e fazer as coisas.
Estou aqui a dar ao dedo e a comer umas castanhas (cozidas, malta, que em casa não se podem assar, por via do fumo e dos vizinhos) à espera de um programa de televisão sobre a guerra, a “nossa” mal-aventurada guerra. Quando há pouco telefonei ao João Vasconcelos Costa, outro dessa leva, a dizer-lhe que ia até Lisboa, ele até se assustou: é que hoje não posso estar contigo, disse-me, vou ver o documentário da guerra. Só se quiseres vir até cá casa...” Calma João, eu só vou amanhã, vê a guerra descansado que vou fazer o mesmo. É o Outono, época de contas e de vinho novo. E de castanhas. E de amigos ausentes e tão presentes

Au Bonheur des Dames 94

d'oliveira, 18.10.07


Carta aberta à malta daquele tempo

Isto de uma pessoa desatar a escrever aos seus amigos e companheiros de há quarenta e tal anos, por muito que se desculpe com a importância do tema, parece um tanto ou quanto balofo, serôdio, tonto, para não dizer coisa pior. Todavia, insisto. O caso é sério, pelo menos para (e eu a dar-lhe...) todos os que viveram os anos de vinho e rosas, de chumbo e nevoeiro, raio de mistura, que ocorreram por Coimbra entre sessenta e setenta.
Uma prevenção: estes anos não terão sido melhores nem piores do que tantos outros. Foram contudo os que nos couberam, a nós, os amigos e colegas do Adriano Correia de Oliveira, pretexto desta escrita. Dele e de mais uns tantos, é claro, mas vamos deixar a coisa só nele, por economia e porque convém, tantos anos depois (o Adriano há-de ter morrido há vinte e cinco, mais ano, menos ano) fazer justiça.
É que, a propósito deste redondo aniversário da morte, desencadearam-se por aí um par de manifestações que parecendo sinceras e homenageantes podem, nalgum caso, encobrir um par de malfeitorias.
E o caso é que uma organização (nem vale a pena citá-la, et pour cause) a que o Adriano deu muito, se é que não deu tudo, que o tratou nos últimos anos da vida como um pestífero, negando-lhe o pão e a salvação, entendeu agora numa pirueta (em mais uma pirueta) dialéctica, repescar os ossos do cadáver, organizar-lhe um funeral atrasado e triunfal, como se as lágrimas de crocodilo de hoje lavassem a porcaria que ainda ontem lhe atiraram para cima.
Convém dizer a esses urubus que ainda há quem se lembre e quem se indigne do que se passou e da abusiva beatificação que agora encenam. O Adriano não é Santinha da Ladeira, nem nós os lorpas do costume dispostos a comer gato por lebre com a desculpa de que se homenageia um amigo.
É por isso que se deve saudar a edição da obra completa do Adriano, mesmo correndo o risco, assaz inócuo, diga-se de passagem, de fazer propaganda a um jornal diário. É por isso que se deve, já, mandar um abraço ao Niza mais velho, o de Medicina, o músico, como se dizia naquele tempo, por ter escrito os textos que acompanham as cantigas do Adriano.
É por isso, companheiros e amigos, daquela Coimbra, a preto e branco, a sair esforçadamente, duma década cinzentona, a re-inventar a liberdade e a alegria, é por isso que entendo ser de saudar esta re-edição da obra do Adriano que aqui no bairro foi um ver se te avias: mais discos houvesse mais teriam sido vendidos num ápice. É verdade que alguns de nós se encarregaram de avisar os restantes. Provavelmente estes avisaram outros nesse boca a boca que funciona melhor do que as inspecções do ministério do interior, perdão, da administração interna, como é que me deu para lhe chamar do interior, isso era no tempo da outra senhora, por alturas da nossa mocidade que bem sentiu nos costados jovens e imprudentes a cachaporra da polícia. Agora felizmente eles batem menos, quase nada, limitam-se a ir aqui e ali, uma fábrica ou um sindicato, só para pedir à malta “maneiras” e uns papelitos para ler enquanto estão de plantão lá na esquadra. Eu disse pedir e não exigir. A nossa polícia democrática obedece a chefes democratas e não anda por aí a assustar o pagode. Nem os seus chefes deixariam. Sabe-se, bem sabido, que estas excelsas criaturas preferem arrostar com mil manifestações ululantes e insultuosas a impedir a “festa da democracia”.
Lá me perdi eu, outra vez, é a velhice, não há volta a dar-lhe, eu só aqui vinha para falar do Adriano e, já agora, do António Portugal, vocês, companheiros e amigos daqueles anos alucinados, sabem de quem falo, o Portugal que tocava guitarra e que musicou poemas do Alegre, outro que também devem ter conhecido, quem é que o não conhecia com aquele vozeirão nas Assembleias Magnas, mas este ainda está vivo portanto não conta na nossa saudade, em vez dele falemos do Bretão, lá da Terceira, um dos que introduziu os cantares açorianos, se calhar até ensinou algum ao Adriano. E poderia prosseguir assim, com tantos outros nomes, que a nossa geração já anda há muito a pagar o tributo à da gadanha, e é por isso que Vos escrevo, companheiros e amigos, aproveitemos esta “gentil maré” para festejar o Adriano e o mesmo é dizer festejarmo-nos a nós todos que fomos amigos dele, que sempre lhe falámos e o estimámos e por isso podemos agora rir e recordá-lo como ele merece.
Com alegria, muita. E orgulho q.b.

Na fotografia, Luísa Feijó, Adriano e o cronista a comerem um croquete (1964, Figueira da Foz, digressão do CITAC com a peça “A nossa cidade” de Thornton Wilder, encenação de Jacinto Ramos)
A

missanga a pataco 29

d'oliveira, 15.10.07

A morte de uma "velhissíma velha" resistente


Morreu há dias, no fragor de um silêncio quase geral, Julieta Gandra.
Dela pouco sei. Apenas o que ouvia dizer, nesses tempos de chumbo e cólera, ao meu irmão e aos seus mais ou menos clandestinos amigos.
Médica, militante do pouco estimado partido comunista de Angola, (demasiado irrequieto naos olhos do seu congénere português, que preferiria colonizá-lo política e ideologicamente), esta mulher dava consultas gratuitas no muceque depois de pela manhã ter ganho modestamente a vida no seu consultório no asfalto.
Presa conjuntamente com a grande maioria dos seus escassos camaradas, foi transferida para Portugal onde lhe foi fixada residência. Os negros do grupo (Manuel dos Santos? João Baptista?) tiveram ainda pior sorte porquanto passaram longas temporadas no Tarrafal antes de lhes ser também fixada residencia na "metrópole" onde se empregaram como trabalhadores não qualificados nas obras do metro de Lisboa.
Ao que parece o "Público" não conseguiu pôr uma notícia sobre ela por haver demasiada publicidade e simultaneamente não haver um especialista em necrológicas deste tipo de pessoas!!!...
Eu, já disse, não a conheci. Mas a mão amiga da Zé Albarran que mantém, fácil e luminosa a indignação, conseguiu mandar-me esta fotografia. Não era para o "incursões" mas eu pilhei-a, desviei-a do destino e publico-a aqui. Porque os mortos morrem e pronto, mas merecem que alguém pague por eles a moeda ao barqueiro. Aqui está.

a fotografia é de um V. Nogueira que também não conheço. O título é uma adaptação de um famoso poema de José Craveirinha, poeta moçambicano, português e universal e prémio Camões.