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Incursões

Instância de Retemperação.

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Instância de Retemperação.

Reflexões pós-eleitorais

José Carlos Pereira, 27.01.21

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As eleições presidenciais do passado Domingo deram uma vitória categórica e inequívoca a Marcelo Rebelo de Sousa. O seu desempenho no primeiro mandato foi validado pelos portugueses que acorreram às urnas, que não precisaram de uma campanha exuberante ou polémica para decidirem confiar o seu voto ao Presidente em funções. Atingiu uma percentagem de votos muito significativa e, perante o crescimento da abstenção, conseguiu ainda assim aumentar a sua votação em relação a 2016. Os votos perdidos para uma direita ainda presa ao destino da PàF em 2015, e sedenta de confronto áspero com a área política que apoia o Governo, foram largamente compensados no eleitorado socialista e mesmo mais à esquerda.

Ana Gomes não me surpreendeu. Nem na campanha eleitoral, nem na falta de perfil para a função, nem nos resultados alcançados, nem nos comentários que proferiu na noite das eleições. Ficou muito aquém dos resultados alcançados por outros candidatos da área socialista que também não tiveram o apoio oficial do PS, como Manuel Alegre ou Sampaio da Nóvoa. Uma sua eventual eleição como Presidente da República (PR) seria o regresso aos anos 80 e à interferência permanente do PR na esfera do Governo.

André Ventura teve um resultado importante, mas ficou longe do tsunami que muitos antecipavam. Numa eleição unipessoal como a presidencial é mais fácil canalizar o voto de protesto para quem ousa dizer o indizível, mas não me parece que em eleições legislativas o partido liderado por André Ventura seja capaz de atingir a mesma votação. Creio que o eleitorado em torno do Chega terá atingido nestas eleições a sua amplitude máxima. De todo o modo, políticos e cidadãos em geral devem procurar interpretar as razões por detrás da força deste movimento de extrema-direita.

Este ano teremos pela frente eleições autárquicas e o resultado de Ventura animará muitos dirigentes e apaniguados do Chega, alguns deles ressentidos e preteridos no PSD e no CDS, a tentarem alcançar um lugar na Assembleia da República ou nas autarquias locais. Veremos uma corrida aos "tachos", como tanto gostam de mencionar no Chega, e conheceremos melhor as pessoas que rodeiam e financiam o Chega. Acredito que será aí que a bolha começará a esvaziar.

João Ferreira, apontado como futuro secretário-geral do PCP, e Marisa Matias, que tinha tido uma excelente prestação em 2016, partiam para estas eleições com elevadas expectativas, mas acabaram por registar resultados decepcionantes. João Ferreira obteve menos votos do que Edgar Silva em 2016 e Marisa Matias foi vítima do voto (supostamente) útil em Ana Gomes e também perdeu com os últimos posicionamentos do Bloco de Esquerda.

Tiago Mayan Gonçalves e Vitorino Silva ocuparam os últimos lugares, surpreendentemente não muito longe um do outro. Tiago Mayan captou votos na direita desagradada com Marcelo Rebelo de Sousa e pode ter ajudado a consolidar o seu partido, a Iniciativa Liberal, sobretudo nos grandes centros urbanos. Ainda estamos longe das legislativas para perceber se isso realmente acontece, pois as autárquicas não serão terreno fértil para a Iniciativa Liberal. Vitorino Silva continua o seu projecto pessoal e muitos eleitores vêem nele o escape certo para o voto de protesto contra o sistema. É um voto calculado, mas que também perde impacto quando se trata de legislativas, como se viu em 2019 na prestação do seu partido, o RIR.

Começará em breve um novo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, que será muito centrado na reacção aos efeitos económicos e sociais da pandemia. Todo o país estará focado nesse objectivo e do Presidente da República espera-se que continue a ter uma acção firme e determinada nesse sentido, em cooperação profícua com o Governo e a Assembleia da República.

Voto em branco

José Carlos Pereira, 22.01.21

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Não se espera que as eleições presidenciais do próximo Domingo reservem grandes surpresas, a menos que a abstenção atinja um nível tal que acabe por influenciar os resultados, obrigando a uma segunda volta. Não creio, contudo, que isso venha a acontecer e acredito que Marcelo Rebelo de Sousa será reeleito para o segundo mandato com uma margem bastante confortável.

Uma campanha eleitoral debaixo de uma pandemia tinha necessariamente de condicionar os candidatos e os eleitores e o grosso do debate acabou por ocorrer em torno dos debates e entrevistas na comunicação social. Marcelo Rebelo de Sousa cumpriu serviços mínimos em campanha, sempre com um olho na evolução da pandemia, acabando por merecer maior realce o apoio que recebeu de destacados socialistas do que os provenientes da sua área política.

Ana Gomes fez uma campanha dentro do seu registo rottweiler - como a própria reivindicou - acantonada na área mais à esquerda do PS. Sem perfil adequado para o exercício da presidência da República, deixou à evidência que seria um sério problema para António Costa se porventura ganhasse as eleições. Desagradada por ver fugir para Marcelo o apoio de históricos socialistas, não arranjou melhor argumento do que invocar o centrão dos interesses para desqualificar personalidades como Ferro Rodrigues, Vieira da Silva, Correia de Campos, Pedro Marques, entre outros deputados e autarcas.

André Ventura continuou o seu caminho de afirmação extremista, promovendo uma campanha em torno dos seus temas de sempre: insulto, exclusão, divisão, promessas bacocas e irrealizáveis. Um candidato que quer ser presidente de uns portugueses contra outros portugueses, que quer dividir e não unir, que quer polarizar a discórdia, merece ter um resultado bem aquém da fasquia que colocou.

João Ferreira (PCP) e Marisa Matias (BE) estão muito vinculados aos seus partidos e respondem também pela acção recente dos colectivos a que pertencem. Tiago Mayan Gonçalves foi a figura verdadeiramente nova que apareceu nestas eleições e contribuirá por certo para consolidar o partido que ajudou a fundar (Iniciativa Liberal). Vitorino Silva tem o projecto pessoal de aparecer, ser falado e reconhecido, sem que da sua acção e da do seu partido (RIR) resultem ganhos efectivos para o país.

Apesar da pandemia, é muito importante que os portugueses acorram às urnas, com a máxima segurança possível, e votem. Votem de forma atenta, esclarecida, informada. Os tempos que aí vêm não serão nada fáceis e o Presidente da República terá um papel muito importante na mobilização de todos, na construção de consensos e no suporte crítico e atento à acção governativa.

Tratando-se de uma eleição uninominal, entendo que o voto deve traduzir a adesão plena ao perfil, ao percurso, aos valores e às ideias políticas do candidato a Presidente da República. Como não encontro esse candidato, votarei (mais uma vez) em branco. Estivesse em causa a eleição de alguém que colocasse em questão os fundamentos do nosso regime democrático e não hesitaria em fazer a minha opção. Assim, sinalizo com o meu voto que nenhum dos candidatos que se apresenta às urnas preenche na plenitude os requisitos que defini para o exercício da função presidencial.

Ana Gomes a dar tiros nos pés

José Carlos Pereira, 08.12.20
A entrevista de Ana Gomes à Rádio Observador é muito reveladora e totalmente transparente para demonstrar à saciedade que o seu perfil...não serve para Presidente da República.

Há afirmações que não se acredita à primeira que venham de alguém com a sua experiência. Parece fazer um campeonato particular para ver se, ao nível das atoardas, consegue bater o nível da campanha de Basílio Horta contra Mário Soares em 1991. As suas entrevistas e publicações no Twitter, se os mais próximos não a conseguirem conter, fará mais contra ela do que qualquer adversário.

Comparando as mais recentes entrevistas de Ana Gomes e de Marisa Matias, a eurodeputada do Bloco leva a palma em ponderação, sensatez e razoabilidade.

O prólogo das presidenciais

José Carlos Pereira, 18.09.20

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As eleições presidenciais do início do próximo ano contam já com várias cartas lançadas, muito embora se continue a aguardar pelos trunfos que vão marcar o desfecho do "jogo": a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa sobre a sua recandidatura e a deliberação dos órgãos nacionais do PS acerca do envolvimento do partido nas eleições.

Não se esperam, a este propósito, quaisquer surpresas: Marcelo concorrerá ao segundo mandato e o PS, com maior ou menor consenso, decidirá não apoiar formalmente nenhum dos candidatos anunciados, como já sucedeu em 2016. Só não me refiro às decisões que PSD e CDS irão tomar sobre as presidenciais porque é inevitável que venham a conceder o seu apoio a Marcelo Rebelo de Sousa.

O actual presidente terá pela frente uma caminhada sem um adversário que verdadeiramente lhe dispute a vitória, cabendo-lhe enfrentar candidatos que, na sua maioria, procuram preencher e ampliar as respectivas trincheiras partidárias, como sucede com Marisa Matias, João Ferreira e André Ventura.

Já a socialista Ana Gomes tem um perfil diferente e poderá acabar por ser o principal challenger de Marcelo. O seu discurso tonitruante anti-corrupção, e quase anti-sistema, como se pode ver na forma como defende o denunciante Rui Pinto face ao sistema judicial, colhe simpatias populares em largos espectros. Na linha do que fizeram nas anteriores presidenciais Henrique Neto e Paulo de Morais, com quem tem afinidades, Ana Gomes assume um discurso populista, de verbo fácil e setas apontadas aos ditos poderosos e corruptos, pouco se importando em reunir meia dúzia de provas no sentido de incriminar este ou aquele suspeito.

A antiga eurodeputada reunirá apoios de várias frentes: de uma esquerda menos militante nos partidos do sistema, como se vê com a adesão de dirigentes do Livre, das franjas socialistas descontentes com António Costa e apreciadores das suas causas, num espectro que vai de Francisco Assis a Vera Jardim, e dos movimentos que se animam com as campanhas populistas das redes sociais.

As críticas que Ana Gomes lançou ao PS no momento da sua apresentação pública são desprovidas de sentido, já que, no meu entender, não cabia ao PS estar a promover uma candidatura presidencial. Aliás, se nos detivermos apenas nos principais candidatos, vemos que desde 1986 têm sido os candidatos a imporem-se aos partidos e não estes a gerarem candidaturas. Foi assim com Mário Soares, Freitas do Amaral, Jorge Sampaio, Cavaco Silva, Manuel Alegre, Sampaio da Nóvoa e Marcelo Rebelo de Sousa. Candidaturas partidárias neste período apenas houve as de Basílio Horta e Ferreira do Amaral, nas recandidaturas de Soares, em 1991, e de Sampaio, em 2001, que não pretendiam mais do que fixar o eleitorado do centro-direita.

O contexto de grave crise económica e social em que vivemos deve concorrer para que o partido que governa esteja sobretudo focado na acção executiva e na recuperação do país. É um facto que as eleições presidenciais são importantes, nomeadamente numa altura em que vemos crescer o espaço extremista, mas caberá aos candidatos do espaço democrático que se apresentem a eleições conter e desmontar os argumentos vazios daqueles que, por muito barulho que façam, nada têm para acrescentar ao que o país precisa.

A oito meses das eleições presidenciais

José Carlos Pereira, 27.05.20

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Para quem pretende desafiar o Presidente da República em funções, nunca foi fácil lidar com a segunda volta das eleições presidenciais. Em 1980, a maioria AD no governo, liderada por Francisco Sá Carneiro, não arranjou melhor solução para enfrentar Ramalho Eanes (que perdera o apoio de PSD, CDS e Mário Soares e conquistara o do PCP) do que o desconhecido Soares Carneiro, perdendo essa fatídica eleição por quase um milhão de votos de diferença.

Em 1991, Cavaco Silva, então primeiro-ministro com maioria absoluta, assobiou para o lado e resignou-se a não apresentar candidato contra Mário Soares, que venceu com o maior resultado registado até ao momento (70,35% dos votos). O segundo lugar foi disputado pelas candidaturas de nicho de direita, com Basílio Horta, e da esquerda comunista, com Carlos Carvalhas, ambos na casa dos 13/14% dos votos, com vantagem para o primeiro, que surpreendeu, aqui e ali, pela excessiva agressividade, que nem assim rendeu votos.

Dez anos depois, o PSD foi buscar o antigo ministro Joaquim Ferreira do Amaral para marcar posição face à recandidatura de Jorge Sampaio, fazendo o pleno do centro-direita. Contudo, o melhor que conseguiu foi uma votação a mais de 900 mil votos de distância de Sampaio.

Em 2011, a proliferação de candidatos favoreceu a recandidatura de Cavaco Silva, tendo Manuel Alegre, com o apoio do PS, alcançado o segundo lugar, mas aquém dos 20% de votos efectivos.

Nos próximos meses, a questão vai colocar-se de novo perante a recandidatura (e a vitória) mais do que certa de Marcelo Rebelo de Sousa. O PS, que governa em minoria, seguirá provavelmente a mesma táctica de Cavaco Silva em 1991 e não promoverá qualquer candidato contra o presidente em funções. Não faltam razões para isso, desde o bom relacionamento alcançado com Marcelo até ao momento, a falta de um candidato evidente nas hostes socialistas e a necessidade de manter o foco político nas tarefas da governação. António Costa percebeu, de resto, que muitos dos seus eleitores não hesitam em dar o seu voto ao actual Presidente da República.

Abrir-se-á, assim, espaço para candidaturas que representem os espaços políticos à esquerda do PS e também na extrema-direita, como já se foi anunciando. É provável que mesmo na área do PS possa surgir Ana Gomes ou outro candidato mais ousado e também a direita mais conservadora, descontente com Marcelo, pode ser tentada a marcar posição. Mas nenhum desses candidatos travará a eleição confortável de Marcelo Rebelo de Sousa, que reunirá certamente o apoio do PSD e do CDS e não contará com a animosidade do PS.

O passeio de Marcelo e o fim de Cavaco

José Carlos Pereira, 25.01.16

images.jpgAs eleições de ontem consagraram, sem surpresa, Marcelo Rebelo de Sousa como o novo Presidente da República, atingindo logo à primeira volta um resultado que veio dar razão à estratégia de campanha que levou a cabo ao longo dos últimos meses.
Marcelo quis distanciar-se dos partidos que o apoiaram “por interesse e não por amor”, e apostou numa campanha frugal, sem os grandes meios que nos habituámos a ver nestas ocasiões. E os portugueses corresponderam com um voto massivo na sua candidatura. Apesar de uma abstenção substancialmente mais elevada do que a registada nas últimas legislativas, o que era de esperar, Marcelo conseguiu ainda assim quase 325.000 votos a mais do que PSD e CDS registaram em Outubro passado. E teve mais 180.000 votos do que Cavaco Silva na sua reeleição em 2011.
Sampaio da Nóvoa perdeu, mas teve uma prestação e um resultado honrosos. Sendo um estreante nestas lides, e não contando com o apoio declarado e mobilizador do PS, Nóvoa teve um resultado francamente melhor do que Manuel Alegre em 2011, alcançando mais 228.000 votos. Com todas as debilidades próprias de quem nunca tinha intervindo a este nível político, resta a dúvida se um apoio explícito e empenhado do PS poderia ter sido o bastante para obrigar à disputa de uma segunda volta.
O resultado quase humilhante de Maria de Belém (menos de 197.000 votos), que foi presidente do PS na liderança de António José Seguro, foi uma machadada nesse propósito (algo distante) de provocar uma segunda volta. Como escrevi anteriormente, Maria de Belém foi empurrada para vestir um fato que não era o seu e teve uma campanha em plano decrescente. Creio que, mais do que Maria de Belém, devem ser interpelados no seio do PS os dirigentes que deram corpo a esta candidatura, que mostrou desde o início grandes fragilidades e passou boa parte do tempo com as setas apontadas a Sampaio da Nóvoa.
Bloco de Esquerda e PCP tiveram resultados muito diferentes nestas presidenciais. Enquanto Marisa Matias consolidou os resultados e a penetração eleitoral do BE nas últimas legislativas, mesmo recuando quase 82.000 votos, já Edgar Silva foi um desastre para os comunistas. Com surpresa minha, face às expectativas iniciais que nele depositava pelo seu elogiado trabalho social na Madeira, o candidato apoiado pelo PCP não foi capaz de acertar o discurso e a pose para esta corrida eleitoral – perdeu 118.000 votos em comparação com Francisco Lopes em 2011 e, pior, ficou 263.000 votos aquém do resultado da CDU nas últimas legislativas. Estes resultados, bem diferentes, podem vir a ter consequências no suporte ao Governo do PS, já que o PCP será tentado a corrigir o seu posicionamento para estancar maiores perdas de eleitorado.
Dos restantes candidatos não rezou grande história, com excepção de Vitorino Silva, erigido em herói por alguns meios de comunicação e descontentes com o sistema. Foram estes descontentes, aliás, que usaram Vitorino Silva como um escape para as suas críticas, garantindo-lhe uma votação superior a 152.000 votos, próxima das de Edgar Silva e Maria de Belém (foi o segundo candidato mais votado em Penafiel, a sua terra, e o terceiro nos municípios vizinhos de Paredes e Marco de Canaveses). Um resultado que deve ser percebido pelos partidos e agentes políticos, mas que não traz nada de muito novo, pois já em 2011 o madeirense José Manuel Coelho conseguira uma votação superior até à de Vitorino Silva.
E agora, que presidente será Marcelo? O conciliador e agregador que se apresentou na campanha eleitoral e que actuará livre de quaisquer espartilhos político-partidários? Ou o político ziguezagueante – o “catavento” de Passos Coelho – que ao longo de 40 anos fez e desfez alianças, avançou e recuou, jurou fidelidades e atraiçoou ao virar da primeira esquina?
O tempo se encarregará de avaliar o Marcelo Presidente. Contudo, de uma coisa estou convicto: para pior não vamos. O fim político de Cavaco Silva é mesmo a grande notícia destas eleições!