“Sinais ao mercado”. A quem serve?
“É preciso dar sinais ao mercado” é uma das palavras de ordem da política contemporânea.
Está certo. Os Estados com reduzida capacidade de intervenção económica, menos poderosos que muitas das empresas internacionais, que juraram serem fiéis à livre circulação dos capitais, que pertencem à Organização Mundial do Comércio, que sonharam viver à sombra dos credores internacionais, que incorporaram nas suas estruturas os “senhores do dinheiro”, esses Estados precisam de agradar a quem os sustenta.
É certo que desde 2008 se têm mostrado bem comportados, ao aproveitarem o dinheiro dos contribuintes e dos utilizadores dos serviços públicos para salvarem banqueiros e especuladores, hipotecando a sobrevivência futura. Mas o respeito pelos que mandam nunca é de mais.
Contudo, dou comigo muitas vezes a pensar no que é “dar sinais ao mercado”. Apesar de uma longa vida familiar tenho a experiência de não conseguir transmitir à minha esposa, lúcida e inteligente, os sinais que pretendo: apago ostensivamente as luzes inutilmente acesas, mostro que tapei a pasta de dentes, fecho a porta que gera uma corrente de ar. Faço isso há anos, mas terei que continuar a fazer porque os sinais não produzem resultados. Será que os mercados são mais racionais que o companheiro de uma vida?
Pergunta inútil porque todos sabemos que Deus é omnisciente.
Mesmo assim pergunto: qual é a reacção que o Deus Mercado pode ter aos sinais que o Estado lhe transmite?
Quando se não cumpre o contrato existente entre o Estado e os seus funcionários, quando se viola o compromisso de longo prazo que são as reformas, que sinal se transmite? Que o Estado está a cortar nas despesas ou que o Estado não é pessoa de bem porque não cumpre os contratos? Quando se aumentam os impostos, sobretudo sobre a classe média, que sinal se transmite? Que o Estado está a aumentar as suas possibilidades de pagamento futuro ou que está a liquidar paulatinamente a classe média, agravando a instabilidade social futura? Quando o Estado corta na Educação, na Investigação Científica, na Saúde e na Cultura que sinal se transmite? Que o Estado está a racionalizar as despesas ou que o Estado está a diminuir a sanidade social e a capacidade produtiva futuras, a afundar a competitividade?
Pergunta mais uma vez inútil porque hoje o tempo é de curto prazo. Um tempo balizado pelas eleições, pulsando ao sabor das cotações na bolsa e das taxas de juro, dos bónus de produtividade, da durabilidade da informação privilegiada, da ilusão de se enganar o futuro.
Mesmo assim pergunto: é esse mundo sem estratégia, sem homens comuns, sem futuro colectivamente construído que nós queremos?