Aqui não há inocentes!
mcr, (17-10-24) 20-2-25
Antes que algum leitor indignado feche a página, gostaria de dizer que este título deve ser lido cum granu salis, aliás com um fartote de grãos de sal.
De facto na situação da região médio oriental há milhões de inocentes que são exactamente os sem voz, os que morrem os que sobrevivem em situação de miséria permanente. Inocentes são todas as crianças e não apenas as que morrem mas as que enchem os hospitais, as que ficam órfãs, mal feridas enfim as vítimas do costume.
E aqui não há fronteiras possíveis, Um menino morto em Gaza ou em Israel, na Cisjordânia ou no Líbano é sempre um morto a mais.
agora que o recado está dado, resta saber por onde começar. Não vle a pena regressar a 1948, data em que as Nações Unidas por fortíssima maioria permitiram a fundação do Estado Judaico construído pelos sobreviventes da Shoa. E sobretudo pela má consciência mundial que, salvo raros casos, assistiu impotente e calada a uma longa teoria de massacres que vinha do fundo das idades. Ser judeus nunca foi algo de saudável como nunca foi saudável pertencer a uma qualquer minoria social, racial ou religiosa.
Também de pouco valeria debruçarmo-nos sobre as sucessivas guerras árabes de libertação que tiveram como alvo o novel Estado. Os invasores tinam pelo seu lado o número mas faltava às suas incultas tropas vontade de combater, razões para combater, chefias minimamente preparadas. Aquilo era carne para canhão e todas as tentativas de egípcios, jordanos, sírios, libaneses iraquianos e tustti quanti redundaram em tremendos fracassos, em novos refugiados, permitiram a Israel constituir fronteiras mais seguras (e sempre mais território!...) e tornaram a vida de milhões de camponeses ainda mais precária.
Não vale a pena aqui vir com o apoio das plutocracias que foi real mas que facilmente poderia ser contrabalançado pelos riquíssimas nações petrolíferas árabes. Digamos que os regimes árabes da região se ilustravam pela tirania, pela ausência de escrúpulos, de direitos humanos de respeito pelas mulheres e pelas suas minorias sem falar no peso opressivo do que de mais reaccionário a Charia produzia. queira-se ou não, Israel era o único país moderno e democrático no meio de Estados constantemente sacudidos por golpes de Estado, revoluções, perseguições e consequentes misérias humanas, sociais e económicas.
Gaza foi durante decénios palco de ocupações diversas que mantiveram a população em campos de refugiados (que já vão na quarta geração!...). O mesmo se passou no Líbano, n Jorfânia (é bom lembrar o massacre do Setembro negro, os massacres de Sabra e Shatila em que gente ligada aos regimes em vigor tratou de matar quantos refugiados encontraram, Também não deixa de ser verdade que estes imensos ghettos de refugiados permitiram o aparecimento de grupos armados e terroristas. convém também, neste capítulo, recordar que grupos terroristas não foram um exclusivo árabe (basta referir os grupos Stern ou o Irgun criados antes da independência no seio de comunidades judias residentes na Palestina. É verdade que dirigiam boa parte da sua actividade contra os ingleses que eram os detentores do mandato conferido pela sociedade das Nações após a derrota do Império Otomano . E, por seu turno alguns árabes chefiados pelo poderoso mufti de Jerusalém apoiaram entusiasticamente os fascismos europeus, nomeadamente os nazis).
Em boa verdade, depois de Arafat e dos seus directos correspondentes israelitas, nunca mais houve dirigentes capazes de manter a ideia dos dois Estados e da paz.
Convenhamos que a teoria dos Estados com uma Palestina dividida em dois territórios sem ligação pouco mais é do que uma intenção piedosa.
É , todavia, e para já, esta a ideia mais próxima de um qualquer acordo mas é bom que se atente na sua dificílima aplicação. O único exemplo histórico de um país dividido em duas regiões não contíguas foi o Paquistão post independência e está à vista o resultado.
Se em Israel Netanyahu conseguiu alcandorar-se ao poder (através de eleições sobre as quais não recai suspeita) na Palestina o regime exangue da Fatah foi combatido com sucesso (em Gaza) pelo movimento radical Hamas que começou de facto a controlar a zona e a construir um dispositivo de ataque ao sionismo com vista a erradicá-lo violenta e totalmente da região.
No Líbano, o Hezbolah instalou-se com base na comunidade chiita e com o apoio do Irão e da Síria transformando o governo do país nim mero pião das nicas, sem força, sem poder nem apoio. O proto-estado do Hezbolah tem exactamente o mesmo fito do correspondente Hamas
Digamo-lo sem receio: a ideia de um cerco a Israel e a sua extinção nunca morreu. É verdade que este último foi conseguindo reatar relações com os países árabes moderados e de maioria sunita. Não é impossível que o ataque de Outubro tenha sido levado a cabo para impedir o tratado de paz com a Arábia saudita.
Tudo isto torna a vontade da guerra inextinguível .
Seria bom recordar que neste jogo de mau xadrez há a sombra do conflito sunita-chiita ou até dos árabes com o Irão (que não é árabe... mas tão só muçulmano e com vocação imperial e radical) .
também convém não esquecer que voluntária ou involuntariamente (forçadamente, até...) a população gazaoui festejou delirantemente o massacre de Outubro.
Pior : os habitantes de Gaza, forçados ou não, permitiram que o Hamas os transformasse em escudos humanos, não ignoraram o labirinto de túneis sob o seu escasso chão, sabiam da preparação das brigadas do Hamas bem como das cumplicidades estabelecidas com todos os dirigentes civis e religiosos da comunidade. Hospitais, escolas, edifícios públicos, mesmo os ligados à ONU estavam sobre instalações militares e paramilitares.
Também é verdade que o Hamas sabia pertinentemente que um seu ataque desencadearia uma reacção incomparavelmente violenta da parte de Israel-
Não é por acaso que a expressão olho por olho, dente por dente (mão por mão, pé por pé) está inscrita na Bíblia (Êxodo XXI-24). Terá sido o próprio Deus de Israel a fornecer esta regra a Moisés para ser consignada na lei fundamental.
O Hamas sabia (ou deveria saber .... ) que o Israel actual comandado pela direita religiosa e pelos conservadores retorquiria com muitos olhos por olho e muitos dentes por dente. Como se verifica.
O Hamas nem sequer se apercebeu que Gaza depende em tudo de Israel, deste a água à electricidade, dos bens alimentares ao trabalho (Gaza fornecia vários milhares de trabalhadores a Israel)
Por outro lado, o Hamas também sabe que no Egipto não tem amigos bem pelo contrário, e que nunca esta país abriria a fronteira a refugiados fossem eles idosos, mulheres ou crianças. O Hamas acredita, ou finge acreditar, na teoria dos "mártires" do Islão e da sua felicidade além morte.
Um dos dirigentes do grupo disse enfaticamente a um jornalista ocidental que "nós amamos a morte enquanto os judeus (e vocês) amam a vida". Além de não ser verdade é delirante como argumento.
Portanto, e sem esquecer a desproporção da retaliação israelita num território com uma população inerme que apenas serve de escudo humano e descartável à milícia fanática, tudo isto era previsível, tudo isto foi longamente avisado antes de qualquer conflito.
A menos que o ataque de Outubro fosse pensado para acender uma guerra regional que oporia p Irão e os seus aliados a Israel contando com algum apoio ou ,pelo menos, a neutralidade dos restantes países árabes ( e partindo do princípio de que o apoio ocidental não se manifestaria ou que estaria demasiado ocupado com a invasão russa da Ucrânia...) todos os cálculos da direcção do Hamas eram destituídos de fundamento, de razão, de oportunidade e nem sequer havia a percepção de que o regime de Netanyahu estava periclitante em Israel. Ou então pensaram que os protestos dos democratas se manteriam mesmo depois de um sangrento ataque o mais violento depois do Holocausto!
Este texto escrito em meados de Outubro do ano passado ficou no tinteiro, sabe-se lá porque razões-
Decidi publicá-lo quatro meses depois porque fora o frágil acordo que tem permitido trocar reféns israelitas por prisioneiros árabes (um modo de Israel se livrar de uns ,ilhares de presos que lhe enchiam as cadeias...) caem sobre a região outras ameaças, desta feita com autoria confirmada de Trump.
Obviamente, a criatura inculta e presunçosa que governa os EUA nunca estudou nada sobre o Médio Oriente nem sequer ouviu os seus mais próximos aliados árabes. Também não percebe, ou então (e pior) finge desconhecer que deportar uma inteira população é um crime contra a humanidade. Claro que seria difícil ou impossível ir por Trump e julgá-lo mas, apesar de tudo eu ainda acredito que na América haverá uma maioria de americanos sensatos que se oporão à concretização de tal infame rojecto. Aliás creio que, em Israel, também uma maioria de cidadãos dirá a Netanyahu que não deve apoiar tal solução.
E, neste capítulo, a Europa poderá tomar um par de medidas que, no que toca a Israel, o dissuada de tomar este perigoso e medonho caminho. Se a Europa ou a maioria dos países europeus isolar Israel não vejo que este país possa ficar indiferente a tal ameaça. Sem a Europa, Israel fica tão só como Cuba sem a vantagem de ser uma ilha.,..
Entretanto, depois de uma ameaça mais estúpida que parva, o Hamas optou por recuar na disposição de não libertar reféns. Parece mesmo que aumentará o numero de entrega de vivos acrescido de alguns cadáveres (entre eles uma mãe jovem e dois filhos de tenta idade). Esperemos que os chorosos e radicais defensores europeus de Gaza também critiquem estes três assassínios...)